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   Autor Data 10 de Novembro de 2013 Secção Policiário [1162] Competição Campeonato Nacional e Taça de
  Portugal – 2013 Prova nº 10 (Parte II) Publicação Público  | 
  
   A TIA LAURINDA E O ALBERGUE ESPANHOL Búfalos Associados Alberto
  amava Bárbara, mas esta preferia Celso, que no entanto gostava de Denise, a
  qual estava apaixonada por Ernesto, que tinha uma inclinação por Filomena,
  que adorava Gastão, o qual tinha atracão por Heliodora, que não via senão
  Alberto. A Tia Laurinda, que também fazia parte do grupo embora não se lhe
  conhecesse qualquer paixão, chamava com humor aos seus oito colegas da
  Faculdade de Letras, parafraseando Arthur Schnitzler,
  a "Dança de Roda". Findos os cursos, o grupo promoveu uma viagem a
  Paris, cidade que a todos fascinava. O objetivo era respirar civilização,
  lavar as ideias, escapar durante algum tempo à mordaça da Censura salazarista
  e esquecer a "rudeza d'uma austera, apagada e vil tristeza" de que
  já falava Camões. Um
  amigo emprestou uma carrinha de nove lugares e o pai de Bárbara, que tinha
  uma alta posição na hierarquia militar, conseguiu as autorizações especiais
  para que os rapazes pudessem passar a fronteira, pois a guerra colonial já ia
  avançada. E lá seguiram todos para a "cidade luz", animados e
  felizes. Paris
  foi para todos um deslumbramento, o que não impediu que o grupo se
  esfrangalhasse, dividido por interesses diversos. Celso e Denise passavam a
  vida na Cinémathèque, encharcando-se em Eisenstein, Buñuel, Renoir e Rossellini. Bárbara e Alberto andaram sempre na moda, nos
  perfumes e nos joalheiros, chegando mesmo ela a comprar um caríssimo colar de
  pérolas com o dinheiro que o "papá" lhe dera para prenda de
  aniversário. Gastão e Heliodora passaram o tempo nos museus e nos cafés à
  cata de celebridades. Juraram mesmo ter estado no Café de Flore sentados ao
  lado de Sartre e de Juliette Gréco. Laurinda,
  Filomena e Ernesto preferiram calcorrear todo o Paris, rua por rua,
  respirando o ar da civilização e da liberdade. Foi
  no regresso a Portugal que as coisas se complicaram. Ao dirigirem-se à
  fronteira de Vilar Formoso, souberam pela rádio espanhola ter havido nesse
  dia um grande assalto ao Banco de Portugal na Figueira da Foz e que as
  fronteiras estavam fechadas nos dois sentidos, pelo que tiveram de ficar
  nessa noite em Salamanca. Eram cerca das cinco horas da tarde quando, depois
  de instalados num modesto “hostal” perto da Plaza Mayor, foram todos dar uma volta pela cidade, à
  exceção de Alberto, que preferiu ficar no quarto a descansar. Quando pelas
  21.30h se voltaram a encontrar no átrio do “hostal”
  para o jantar, Bárbara ficou em pânico. Subira ao quarto e o valioso colar
  que comprara em Paris e que tinha a certeza de ter visto antes de sair,
  desaparecera. Chamada
  de imediato a polícia espanhola, procedeu-se a um rápido inquérito que teve
  como conclusões: 1
  – Entre as 17 e as 21.30 horas o “hostal” esteve
  completamente desocupado, apenas com a exceção do rececionista e do hóspede
  do quarto 11, Alberto. Mais ninguém entrara nem saíra, disse o rececionista. 2
  – Segundo o rececionista, todas as chaves, menos a do 11, estiveram no
  chaveiro durante o período em causa. 3
  – Lembrou-se de que se ausentara da receção por volta das 19.50h, pois teve
  de se deslocar à casa de banho para uma urgência fisiológica. 4
  – Mais disse que ao regressar, pelas 20.05h, teve a impressão de que a chave
  do quarto 15 (o da Bárbara) não estava pendurada da forma habitual.  5
  – As cinco raparigas andaram sempre juntas a passear pela cidade, pelo que
  tinham um álibi inatacável. Só voltaram pelas 21.30h. 6
  – Alberto afirmou que no período de tempo em que lhe disseram que o
  rececionista esteve ausente do posto, tinha a certeza de ter estado ao
  telefone com amigos em Lisboa para saber pormenores do assalto ao Banco da
  Figueira e que não saíra do quarto.  7
  – Contactados os amigos do Alberto em Lisboa, confirmaram o telefonema. Foram
  claros ao afirmar que quando finalmente desligaram a longa conversa, já tinha
  começado há mais de 5 minutos o telejornal das 20 da RTP. E confirmou-se que
  o telefonema foi feito do quarto 11. 8
  – Gastão apresentou como álibi ter andado em lojas um tanto longe do “hostal”, até à hora de fecho, à procura de uma marca de
  anis que lhe haviam encomendado, e ainda a visitar um museu. 9
  – Celso disse ter andado até as livrarias fecharem, à procura de obras de
  Unamuno na “Calle de los Libreros”,
  o que foi confirmado. Comprou “Por tierras de
  Portugal y España”. 10
  – Ernesto, que apareceu muito embriagado, declarou ter andado a curtir
  desgostos de amor, bebendo nos bares em redor da Universidade. A
  polícia estava confusa, mas Laurinda tinha já a certeza de que um dos quatro
  jovens tinha mentido. Qual? A
  – Alberto? B
  – Gastão? C
  – Celso? D
  – Ernesto?   | 
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   © DANIEL FALCÃO  | 
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