Autor

Constantino

 

Data

Maio de 1979

 

Secção

Enigma Policiário [38]

 

Publicação

Passatempo [60]

 

 

Solução de:

CONFORME A SEMENTEIRA

Constantino

 

I

Se o problema tivesse sido publicado (ou rectificado) com inclusão do longo parágrafo em falta, a solução apontaria para a oportunidade de o polícia levar os dois Silvas à esquadra, ambos tinham muito a explicar. A frase final, correcta, seria: «vocês vão comigo, têm muito a explicar».

a) Ao Silva do Ford podia-se-lhe apontar:

– Se o quarto fosse dele (como afirmou) não necessitava de bater, teria a chave em seu poder ou pedi-la-ia na recepção; se o quarto não era dele e fosse visitar o seu proprietário (neste caso o não Sr. Silva) não se justificaria a expressão «nunca o vi mais gordo».

b) Por sua vez o Silva joalheiro, ou caixeiro viajante de…, teria que explicar o ilógico da sua conduta, mesmo considerando que nem todas as pessoas caminham no mesmo sentido do relógio da lógica.

– Quando uma pessoa que transporta jóias se sabe seguida por um desconhecido, o mais coerente é informar a polícia;

– Ainda que afirmasse terem-lhe roubado só estojos vazios, é lógico que tivesse dado conhecimento à polícia ou à gerência;

– Uma pessoa que se sabe seguida não deixa a porta aberta ao afastar-se para um andar diferente, ainda que não pense demorar-se;

depois de uma tentativa de roubo nem espera que o ladrão volte;

– Como é que o agressor soube que fora o Silva a roubar? O pseudo ladrão não ficava concerteza à espera e a circunstância de ser por ele seguido não o aponta como ladrão lógico.

outros pormenores se poderiam apontar.

E duas impossibilidades prováveis:

– De um 5º andar, tendo em atenção que a visão é intercetada pela capota do carro, agravado com a circunstância de se tratar de uma pessoa alta cujo rosto está próximo do tecto do carro, não se afigura possível distinguir uma pessoa que não estaria interessada em mostrar-se (a menos que o carro fosse descapotável, mas Ford… só nos anos 30, salvo erro).

– Pouco aceitável que tendo um quarto no mesmo andar fosse aguardar a saída no carro;

– Desconhecemos, é certo, o tempo que mediou entre a saída do joalheiro (a ter-se dado) e a entrada do homem do Ford, mas é pouco provável que aquele pudesse ter dado a volta pelas traseiras e subir a pé 5 andares, chegando antes do Silva do Ford; de qualquer modo, mesmo que houvesse um outro elevador é duvidosa a possibilidade de o poder utilizar, mesmo porque só pessoas muito conhecidas poderão ter acesso aos hoteis pelas traseiras.

 

II

Olhando o problema como se publicou (com o que está escrito) a solução coincide em parte com a trama que se idealizou e que se pretendia usar. Nesta caso a solução do agente só podia advir de causas suas conhecidas, ignorando a trajectória do Silva do Ford, e fatalmente levaria o sr. Silva joalheiro para explicar as falhas do seu longo discurso, falhas referenciadas na alínea b) do Grupo I.

 

III

Houve na realidade tentativa de roubo?

Pelo que conhecemos, e conhecemos a actuação dos personagens, dir-se-ia que os Silva são amigos e rivais. Ambos caixeiros viajantes pela certa, mesmos nomes, estatura, mesmos fatos castanhos, até os quartos têm números idênticos: 669 – 666. Tudo aquilo cheira a rivalidade, negócio de saias como se adivinha… Talvez a criada dos quartos, lembre-se que ambos se registaram sós e não estaria em causa a mulher do outro. O resto é imaginação…

Um pormenor ainda: se o Silva do Ford tinha um encontro no seu quarto (669) onde bateu para avisar, então o Silva das jóias ainda se afunda mais, pois o seu quarto, o 666, em sentido oposto, não daria para a rua e não podia ver o Ford.

© DANIEL FALCÃO