Autor

Detective Misterioso

 

Data

30 de Novembro de 1990

 

Secção

O Detective - Zona A-Team [112]

 

Publicação

Jornal de Almada

 

 

ALGURES NUMA ALDEIA DA BEIRA ALTA…

Detective Misterioso

 

A Santa venerada na capela era o orgulho do povo daquela aldeia Beirã.

Todos os que entravam no Templo não se cansavam de admirar a bela imagem que, apesar de moldada em gesso, resplandecia beleza! O seu rosto irradiava um sorriso enternecedor e, só de o ver, as pessoas sentiam um bem-estar e grande felicidade dentro de si. As suas vestes, também moldadas, eram de um lindo azul-celeste e o manto, cravado de muita pedraria, cujo brilho penetrava no olhar de quem nele fixasse a vista, maior beleza dava à sua configuração.

Imagem muito antiga, levava o povo a dizer que todas aquelas pedras deveriam valer uma fortuna!!

Até que um dia foi o pandemónio e a estupefacção na aldeia… Todas as pedras do manto da Santa tinham desaparecido. A indignação foi tanta que alguns diziam à «boca cheia», se apanhassem o ladrão, fariam justiça pelas próprias mãos.

Ora aconteceu que, em gozo de férias numa aldeia vizinha, se encontrava o Agente Prata e, a pedido dos seus familiares que o albergavam no seu mês de merecido lazer, concordou dar um jeito no assunto…

Assim, ele aí vai a pé com o seu familiar Serrano, para lhe indicar o caminho (o Agente Prata não tem carro, utilizando sempre os transportes públicos ou os carros dos amigos), até à aldeia onde o caso se passou.

Aí chegado, e depois de se identificar, foi conduzido ao Templo pelo encarregado da sua conservação e abertura ao povo nos dias de culto.

Pelo caminho, o Raúl Silva (assim se chamava o homenzinho), foi dizendo ao Agente Prata que, naquela manhã, quando entrou na capela para proceder à sua limpeza, algo de estranho notou. Havia qualquer coisa que não estava certo com o ambiente habitual, até que verificou faltar o faiscar da pedraria do manto da Santa.

Pressentindo o pior, correu para a imagem, tendo constatado que a pedraria tinha desaparecido e no seu lugar só se viam as cavidades onde as pedras anteriormente tinham estado fixas! Na véspera, quando ao anoitecer, tinha estado na capela e nada faltava, disso tinha a certeza.

Chegados à capela, o Agente Prata verificou que a porta não apresentava vestígios de arrombamento. Percorreu toda a área à volta do templo, averiguou a existência, na terra amolecida, de várias pegadas sobrepostas e em vários sentidos, notando-se, no entanto, junto a uma janela que dava para o interior, algumas pegadas bem visíveis, de botas cardadas, no sentido da entrada e vice-versa. A referida janela também mostrava sinais de ter sido forçada.

No interior do Templo e junto à figura da Santa, o investigador, com a ajuda de uma pequena lupa, verificou que as entradas dos orifícios onde as pedras tinham estado embutidas, apresentavam riscos e falhas de gesso e no interior dos mesmos, partículas prateadas estranhas ao material da imagem. As pegadas de botas cardadas, eram visíveis em vários sentidos no interior da capela, e mais nada de digno de registo foi visto pelo agente da autoridade, que guardou só para si todas as suas descobertas.

Dos nomes fornecidos pelo Raúl Silva, de alguns suspeitos, baseando-se nas pessoas que diziam constantemente que a pedraria da Santa faria muitas pessoas felizes, o investigador ouviu:

Marquinhas, uma rapariga de 30 anos, vestindo na altura roupa de trabalho de campo e calçando botas de borracha, declarou nada saber do roubo nem de quem o teria praticado. Não negou ter, por mais de uma vez, mencionado o possível valor das pedras que ornamentavam o manto da Santa.

Alberto Costa, homem por quem os 60 anos há muito tinham passado, tez curtida pelo sol no seu labutar diário na árdua faina do campo, vestindo roupa de trabalho e calçando botas cardadas, nas quais eram bem notados pedaços de terra húmida, declarou:

– «Chamam-me o «Rei Herodes» por eu nunca ir à Missa, porque já me habituei a esse tratamento deixei de ligar a isso. No entanto, o facto de não ir à Missa não me levaria a roubar os valores da imagem, tanto mais que sei respeitar qualquer casa de Oração.»

Também não negou a referência feita ao valor das pedras.

Manuel António, 35 anos, trabalhador da construção civil, usando roupa domingueira, disse: «Na verdade tenho-me referido frequentemente à felicidade que aquela pedraria faria a uma casa de família, mas não fui eu que roubei as pedras preciosas. Já há muito tempo que não passo junto à capela, por isso as pegadas não são minhas.»

António Galvão, trinta e poucos anos, mal vestido, quase descalço, pouco amigo de trabalhar, não sendo bem visto na aldeia, devido aos frequentes roubos que fazia, nos galinheiros e não só… prestou as seguintes declarações: «Na verdade, disse por mais de uma vez que, com todas aquelas pedras na minha mão, não necessitaria de voltar a «trabalhar»… mas nunca me passou pela cabeça roubá-las! Mas olhe aí «Sr. Doutor», eu ontem, quando o sol se estava a pôr, vi o «Rei Herodes» andar perto da capela!»

Neste momento, o Agente Prata pensou como tinha sido fácil descobrir o ladrão das pedras da Santa. Sorriu e voltou a pensar como adorava que os seus grandes amigos e colegas de profissão, Inspector Rodriguinho e o seu ajudante Lumafero, estivessem ali com ele para juntos gozarem aquele momento hilariante… Sim, é que a pedraria roubada não tinha valor algum, visto todas as pedras serem falsas!

E já imaginando o valente copo de «tintinaite», do bom vinho do «Dão». que beberia logo que chegasse à sua aldeia (por empréstimo), lá foi ele de regresso à casa dos seus parentes… Antes, porém, deixou três perguntas:

 

1 – Como soube ele que as pedras eram falsas?

2 – Quem foi o autor do roubo?

3 – Como se teria passado o caso?

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO