Autor

Ferman

 

Data

Outubro de 1983

 

Competição

Iº Campeonatos de Zona de Decifradores de Problemas Policiários e

IIº Campeonatos Regionais de Decifradores de Problemas Policiários e

IIIº Campeonatos Distritais de Decifradores de Problemas Policiários

1ª Jornada

 

Publicação (em Secção)

Clube Xis [15]

 

 

GOLPE DE VISTA

Ferman

 

Ao findo do salão descortinou-se uma silhueta.

– “Quem está aí? Não vejo bem daqui. Aproxime-se mais…” – O vulto aproximou-se. O surpreso velho pressentiu o perigo ao divisar a ponta da adaga levantando-se na sua direcção… Ainda tentou oferecer alguma resistência… Esperneou enquanto a sua debilidade física o permitiu… O outro desferiu-lhe um golpe letal… A vítima tentou “agarrar” o seu agressor, num reflexo instintivo… Ao mesmo tempo que se estatelava sem vida por sobre as lages do salão, ouviu-se o estalar de vidros… Blasfemando, o vulto tacteou ao acaso a área onde caíra o morto; agaixou-se e, desajeitadamente, apalpou por todas as direcções… Por fim encontrou o corpo inerte e pouco depois o que desejava… Retirou-se apressadamente, não sem ter entretanto tropeçado em diversos adereços que ornamentavam a casa… A custo encontrou a janela entreaberta… …Ficou só a morte.

 

João Leão analisava os resultados das investigações efectuadas sobre aquele crime ocorrido dois dias antes: o assassínio verificara-se cerca das 16.00 horas. A arma utilizada fora a adaga que agora se encontrava à sua frente, sobre a secretária. Uma armação de óculos e os respectivos cacos de lentes divergentes, bem como alguns objectos (livros, duas estatuetas gregas, um pequeno candeeiro, algumas outras bugigangas) encostados ou mesmo caídos por vários móveis do salão eram indícios escassos para servirem como pistas. Tudo indicava que o assassino não revistara a casa, embora tivesse oportunidade para tal. Nada de impressões digitais. Um caso de vingança?!…

Suspeitos? A velha governanta, sra. Matilde – única companhia efectiva do sr. comendador Francisco de Sá (o morto) – acabou por encontrar 3 nomes que poderiam ter levado a vias-de-facto ameaças recentes dirigidas ao seu patrão. O porquê?! A tremenda falta de vista de que, ao longe, o velho Sá padecia. Parece que nem mesmo uns sofisticados óculos ajudariam muito!… Tal falha já tinha originado diversos dissabores a qualquer dos convocados sugeridos pela sra. Matilde.

Móbil absurdo este, para se justificar um crime!… Mas, nunca fiando nas susceptibilidades feridas!…

 

A própria sra. Matilde foi a primeira a depôr, uma vez que o sr. Pedro Marialva – amigo do falecido – ainda não chegara a P.J.. Eram 9h. da manhã:

– “Fui nessa tarde visitar as minhas primas, como habitualmente. São três horas em que o sr. Comendador aproveita para descansar, todas as tardes. Voltei eram 5 horas… e… e essa faca aí era do senhor… Como veio cá parar?”.

O segundo a depôr, Francelino Péricles, conhecido da vítima:

– “Estive lá seriam umas 4 horas. Bati, bati e ninguém atendeu. Como precisava de pedir ao sr. Sá um favor urgente, decidi voltar mais tarde. Nessa altura encontrei todo aquele borburinho, e soube a notícia. Quanto às ameaças, enfim, foi um pequeno mal-entendido… que esqueci logo…”

Chegou por fim o Pedro Marialva.

– “Desculpe-me o atraso sr. Polícia, mas fui ao “Bel-vista” levantar uma receita. Esta miopia…! Bom; nessa tarde fui visitar o meu amigo sr. Comendador, talvez fossem três e meia. Falámos durante uns quinze minutos. Ele então disse-me que esperava umas visitas importantes e nessa altura resolvi ir-me embora para não incomodar. Isso das ameaças foi uma coisa impensada, sem importância.”

Só faltava um depoimento. Precisamente o do irmão “brasileiro”, Remoaldo de Sá:

– “Que desgraça! Veja só sr. Inspector; vim passar oito dias ao meu Portugal para matar saudades da família. Estive uma vez com o mano Chico (ele até me confundiu com o leiteiro!…), e devo confessar que essa visita não foi muito cordeal!… Como tinha de embarcar ontem, aproveitando o feriado, vim despedir-me do mano e tentar inclusive convidá-lo a ir morar connosco para a “outra banda”… Agora vou ter de ficar para organizar o funeral, … e ter de… Oh, que fatalidade!… Anteontem fui lá a casa seriam umas dezasseis e trinta. Como ninguém respondesse entrei por uma janela entreaberta e dei com aquele horrível espectáculo!… Tratei logo de avisar as autoridades competentes. E agora, como vai ser?!”.

– “Deixe por nossa conta, caro sr. Remoaldo. Aliás, o meu golpe de vista…”

 

1 – Quem matou o Comendador?

2 – Justifique a sua primeira resposta.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO