Autor

Ferman

 

Data

Dezembro de 1983

 

Secção

Clube Xis [17]

 

Competição

Iº Campeonatos de Zona de Decifradores de Problemas Policiários e

IIº Campeonatos Regionais de Decifradores de Problemas Policiários e

IIIº Campeonatos Distritais de Decifradores de Problemas Policiários

3ª Jornada

 

Publicação

Clube Xis

 

 

A CAIXINHA DAS SURPRESAS

Ferman

 

Às 10 horas parti. Não seria aquela chuva miudinha que começara a cair, a abalar essa minha decisão de passar o Dia de Finados apreciando a magnificiência da Natureza, na Praia de Odeceixe! Fazendo de “fronteira atlântica” entre o Algarve e o Alentejo, este local – onde o oceano se bate constantemente ante a fria resistência dos rochedos – tocara-me desde a primeira vez em que o vi.

Por sorte, a meio da viagem o céu começou a apresentar-se gradualmente mais limpo, e as condições de tempo melhoraram.

No outro dia dirigi-me à redacção do jornal, fresco que nem uma alface. A chuva, que continuara a cair por estas bandas, não me deprimiu nem um pouco a boa-disposição.

Mal pús um pé nas instalações do semanário, informaram-me que o inspector Serôdio da Brigada dos Casos Sérios me pedira para ir até à Rua do Mete-Sustos, Nº13, pois havia qualquer coisa interessante.

Um pouco resmungão, lá fui.

O Serôdio nem teve a delicadeza de me preparar para o que me reservara. Com um seco “Só agora?!? Siga-me!” levou-me para a sala de interrogações.

– Meus senhores, sejam práticos e breves. Sabem porque estão aqui. O que têm a dizer?

Aristóteles Alçapão – De manhã fui lamentar a perda das minhas duas esposas. Depois almocei na casa do amigo Tubérculo. A criadagem foi dispensada até à noite porque convidei este meu amigo para jantar comigo e esperava o meu filho mais novo. Num rebate de memórias saudosas, levei o Felismino ao sítio onde guardo as mais importantes recordações. Descobri então a caixinha arrombada e alarmei-me. A sorte é ter todos os meus bens no Seguro!…

Franganote Alçapão – Ontem levantei-me bem cedo. Como não iria ter ninguém em casa, decidi-me por visitar uns amigos meus que moram um pouco acima de Aljezur, numa terreola chamada Maria Vinagre. Contudo, o, mau-tempo impediu-me de avançar mais do que até à vila. Fiquei por lá. Às sete e picos regressei desiludido e encharcado. Então, o meu pai deu-me a surpreendente notícia do ocorrido. Essas futilidades pertenciam a minha madrasta…

Antonieta Aparecida – O pessoal foi dispensado até às sete horas. Fui passar os Finados com os meus familiares, voltando à tardinha, como todos os outros. Quando o Sr. deu pela falta dos berloques, pós receámos que suspeitassem da gente! Ora, somos pessoal de confiança!!!

Felismino Tubérculo – Após termos feito uma romagem ao cemitério, eu e o Sr. Alçapão almoçámos em minha casa. Aí passámos o resto do dia, até que fomos jantar à sua casa. Quando me quis mostrar uns botões de punho, pelos quais nutria especial devoção (coisas de viúvos…) deu pela ausência de umas jóias, numa caixinha caída.

Canapé Alçapão – Cheguei ontem à noite de uma viagem ao estrangeiro. Infelizmente, não vim a tempo!… Esse hipócrita aí, que me chama bastardo a todo o momento, deve saber qual foi o fim que deu aos pertences da minha adorada mãe!!! O Sr. inspector deve prendê-lo quanto antes!

Serôdio, extremamente atento às bátegas que caiam lá fora, alheou-se totalmente da acesa discussão que se seguiu.

Subitamente, deu alguns passos na direcção dos inquiridos e exclamou:

– É tudo! Podem retirar-se!

As cinco pessoas saíram, entreolhando-se, desconfiadas.

O inspector virou-se para mim, lamentando:

– Meu ilustre! Não sei porquê, mas desconfio que os testes dos peritos só me trarão mais dores de cabeça. Quanto às declarações, bof!… Ando mesmo a precisar de férias…

Este desabafo surpreendeu-me. Aproveitei então para lhe contar o meu retemperador passeio da véspera…

Nem me deixou acabar; saiu disparado, ficando eu para ali com cara de espanto.

Que choque recebera aquela mente febril?

 

– Acha que foi roubo?

– Justifique a sua afirmação.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO