Autor

Inspector Jagodes

 

Data

7 de Fevereiro de 2016

 

Secção

Policiário [1279]

 

Competição

Campeonato Nacional e Taça de Portugal – 2016

Prova nº 1 (Parte I)

 

Publicação

Público

 

 

O ASSALTO

Inspector Jagodes

 

De mãos nos bolsos das calças, andar gingão, assobiando as melodias da moda, o João ia percorrendo as centenas de metros que mediavam entre o Café Estrela e casa onde morava a sua tia Eulália e a prima Catarina, debaixo da chuva diluviana que se abateu no seguimento de trovoada que andava no ar.

Já se aproximava da casa quando ouviu um estrondo, semelhante ao do bater de uma pesada porta, logo seguido do ruído insistente de um tropel pelas escadas abaixo. Logo depois, um vulto dobrou a esquina da porta da rua, na sua direcção, mas logo inverteu o sentido da marcha, correndo rua acima. Pareceu-lhe reconhecer o Toneca, um tipo que achava ser fixe e que andava embeiçado pela sua prima Catarina, de quem se considerava namorado.

- Olha, olha, mais uma zanga. Este gajo ainda não percebeu que a prima é uma fera…

Deteve-se um pouco a vê-lo desaparecer no cimo da rua, numa correria louca, para ele, sem qualquer sentido. Mas enfim, cada qual foge do que quer, mas o mais certo era no dia seguinte lá estar com falinhas mansas e melosas para a priminha. Arrufos…

Subiu as escadas, continuando a treinar as melodias com o assobio, quando se apercebeu de gemidos que vinham de um recanto do corredor do primeiro andar. Subiu mais apressadamente, a dois e dois, os restantes degraus e deparou com a prima deitada no chão, sangrando do nariz ou dos lábios, respirando ofegantemente…

- A tia… A tia…

Correu para dentro de casa e viu a senhora idosa deitada no chão, a carteira aberta a seu lado, revolvida, armários com gavetas abertas. Tinha passado por ali um autêntico tufão, obra de quem andava à procura de bens.

A senhora já não respirava, embora não houvesse sinais de violência física. Certamente o coração não resistiu a tamanha confusão, como veio a ser provado mais tarde na autópsia.

O João perguntou à prima se estava bem e perante o seu sinal positivo, disse-lhe para chamar o 112, não mexer em nada, nem deixar ninguém mexer e logo se pôs a caminho, descendo as escadas e seguindo o rumo que o vulto tomara, até ao salão de jogos do Pelintra, onde quase tinha a certeza de encontrar o Toneca. O sol já brilhava e o calor fazia-se sentir.

Lá estava ele, como sempre a jogar a dinheiro, quase sempre com paradas bem altas, muito superiores ao que seria a sua disponibilidade monetária, sem que houvesse uma explicação plausível. Para ele, eram sempre uns “dinheiritos que ganhou”, não revelava era onde.

João acercou-se do balcão e perguntou dissimuladamente ao Pixote há quanto tempo durava aquele jogo.

- Há cerca de dez minutos. O Toneca só chegou nessa altura, mas o jogo já vinha de trás e foi retomado. O gajo disse que teve de ir lá acima porque estava mal disposto…

- Lá acima, onde?

- Aqui ao primeiro andar onde tem um quarto alugado...

O João aproximou-se do Toneca e disse-lhe que o acompanhasse de imediato porque a Catarina fora assaltada.

De um salto, Toneca largou tudo e, pegando no casaco, correu para a porta, descendo a rua em grande velocidade. Da porta dos bilhares, João seguiu-o com o olhar, até o ver entrar no prédio onde morava a sua namorada.

A polícia já tinha chegado e o Toneca foi detido para interrogatório, ao qual respondeu dizendo que não tinha conhecimento de nada, até o João lhe ter dito que Catarina fora assaltada.

Por sugestão de João, a polícia vistoriou a impecável e cara roupa de Toneca, procurando nos bolsos do casaco qualquer indício comprometedor e foi ao quarto dele, por cima da casa dos bilhares, mas nada encontrou de significativo.

 O João, com os seus dotes detectivescos, começava a perceber que talvez as suas suspeitas iniciais não fossem correctas, ou havia mais alguma coisa que lhe escapava.

 

Pergunta-se: Terá sido o Toneca a cometer os crimes?

Em caso afirmativo ou negativo, justifique todas as suas conclusões.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO