Autor Data 1 de Julho de 2016 Secção Publicação Novo Audiência |
QUEM “OKUPOU” O PALCO? Inspetor Boavida Um conhecido e muito
contestado empresário teatral português vive um verdadeiro pesadelo. As
cartas ameaçadoras que o trazem desassossegado caem quase de hora a hora
sobre a sua secretária, trazidas ora pelo ponto, pelo diretor de cena, pelo
sonoplasta ou pelo maquinista de cena. O primeiro trouxe-lhe as cartas
assinadas pela Comédia, o segundo foi o portador das missivas do Drama, o
terceiro foi o mensageiro dos escritos da Tragédia e o quarto foi o emissário
da Farsa. Em todas as cartas se manifesta um muito veemente protesto contra o
repertório atualmente levado a cena no teatro gerido pelo empresário,
exigindo-lhe grandes e urgentes mudanças na filosofia da programação, sob
pena de serem tomadas medidas drásticas. Muito preocupado, o empresário não
sabe o que fazer. De súbito, a Revista entra
aflitíssima pela porta do escritório do empresário aos gritos: «Vasco! Vasco!
Estamos completamente perdidos. Os membros da orquestra e do corpo de baile
foram sequestrados. As plumas que embelezam os fatos das coristas e as
purpurinas que dão brilho às chefes de quadro levaram sumiço, os telões dos
dois finais foram danificados… E o palco foi ocupado por um grupo de gente
estranha, vestida de trajes de tempos muito remotos, formando uma personagem
única que tem por missão contar parte de um enredo. Dois outros tipos
mataram-se mutuamente numa batalha e apenas um deles foi sepultado. Por via
disso, a irmã destes revoltou-se e exige o mesmo tratamento para os dois, nem
que isso custe a própria vida. O tio da rapariga não tolera o seu
procedimento. O confronto entre ambos adensa-se e a jovem entrega-se à
morte». Pouco tempo depois, alguns
técnicos entram a correr no escritório do empresário. Diz o ponto: «O que
faço, Sr. Vasco? Eu não tenho o texto daquela peça, por isso não posso ajudar
os atores caso eles precisem». Acrescenta o diretor de cena: «E eu não tenho
o guião do espetáculo, não sei quem entra e sai de cena, que mutações são
necessárias e em que deixas são feitas». Afirma o sonoplasta: «A banda sonora
que preparei não se adapta de forma nenhuma a esta temática. Não sei mesmo o
que fazer». Remata o maquinista de cena: «Eu também não posso fazer nada, a
não ser baixar o pano ou deixar seguir o espetáculo». O empresário questiona-se:
«Mas afinal quem ocupou o palco?» |
|
© DANIEL FALCÃO |
||
|
|