Autor Data 16 de Dezembro de 2020 Secção Policiário [50] Competição Torneio Sábado Policiário 2020 Prova nº 10 – Parte I Publicação Sábado [868] |
Solução de: O INSPETOR FIDALGO E O CRIME EM DIRETO Inspetor Fidalgo A
base para resolução deste problema é a interpretação correta das imagens
gravadas pela câmara web. O
ponto central é que, quem quer que seja o interveniente no filme, com cerca
de 1,90 metros de altura, de quem nada se vê acima dos ombros, está a agir
premeditadamente com o sentido de atirar com as culpas para cima do outro, ou
não dissimularia a sua presença, escondendo a identidade. Não
há dúvidas que sabia estar a ser filmado e quais os limites da filmagem. Caso
contrário, não precisava de ir fazer a parte da casa de banho, avançava logo
para a moça e batia-lhe forte, inclusivamente fora do alcance da câmara. A
existência do ferro, arma do crime, indica que houve premeditação no ato. Parece
óbvio que houve cumplicidade com o captor das imagens, só assim se
compreendendo todo o aparato para este gravar quando não está e não gravar
quando está, que sendo possível, não é normal; o incorreto reportar da
informação, porque a imagem não desaparece simplesmente, a sua correspondente
apareceria offline;
o atraso com que entrega as imagens à polícia; ou até o enquadramento da
imagem na câmara web que parece ter
sido “orientado” por ele, como sugestão à vítima, para que assim aparecesse e
o momento certo da entrada em cena do criminoso, que queria, como já vimos,
ser visto. Depois, o seu comportamento é estranho na medida em que, como
refere, ouviu na rádio que era a namorada de um multimilionário e em vez de
tentar novo contacto com a moça, como seria mais óbvio, prefere ir ao
computador procurar as imagens e levá-las à polícia. Temos
dois candidatos a autores do crime, Jorge e Vasco. Quem atuou para o filme,
fê-lo no sentido de atirar as culpas para o outro, como já vimos. Se
fosse o Vasco, este pensaria e premeditaria toda a cena. Comunicava com o
cúmplice para saber se o enquadramento estava certo e, uma vez lá dentro –
seria visita habitual – ia para a casa de banho, mas representando para a
câmara como Jorge. Ora, sendo este um modelo de educação e nível, nunca o
imitaria deixando a porta aberta, urinando sem antes lavar muito bem as mãos
(uma regra básica de higiene que todos os homens deviam cumprir para defesa
própria e respeito higiénico para com o seu próprio corpo) e limpando as mãos
ao próprio fato depois de lavar as mãos no fim! Assim, era mais a imitação de
um sem-abrigo do que de um modelo! Se
fosse o Jorge, este faria os mesmos preliminares com o cúmplice, entraria com
a cara tapada ou com o capacete, fazendo-se passar por Vasco e ao ir para a
casa de banho procurava mostrar para a câmara, que não era o Jorge supereducado e cometia voluntariamente todos os erros! Exagerava,
como é usual quando a ideia é dissipar suspeitas ou encontrar álibis, porque
queria deixar bem vincado que ele nunca seria tão pouco limpo! A
conclusão é óbvia, o nosso criminoso é o Jorge! Estas
suspeitas são reforçadas por atitudes incongruentes por ele tomadas. Ele vai
fazer uma surpresa à namorada, combina tudo com o Vasco, daí não haver lugar
para uma tentativa de contacto com ela. Ela não sabe que ele lá vai, não
estava à sua espera. Então para quê telefonar-lhe? Para lhe dizer que queria
fazer uma surpresa mas não conseguia? Mas repare-se que ele afirma que fez a
chamada assim que chegou ao Pico. Se não tinha já nenhuma esperança de lá
chegar, para quê fazer a chamada? Qualquer pessoa de lá lhe diria para
aguardar umas horas que a situação podia aliviar, como aconteceu, de resto.
Por outro lado, uma pessoa tão rica como ele, não teria um acesso à Internet
para lhe comunicar, até com imagem, o seu gesto? Depois,
após tanta preparação e trabalho, ao ser aberto o espaço aéreo, vem-se embora
para o continente, quando está a escassos minutos do seu destino? Mesmo que fosse
verdade que só lhe autorizassem o regresso a Lisboa, como afirma, mais uns
tempos de espera não lhe fariam diferença. O tempo estava a melhorar. Uma vez
ali, com a surpresa ainda possível, desiste de imediato e regressa. Também
o regresso é curioso. Depois daquela trabalheira toda, nem se preocupou por
não conseguir contactá-la e relatar-lhe as suas andanças daquele dia! Diz que
tentou, mais nada. Mas não seria lógico, em último recurso, contactar com o
Vasco para lhe pedir que fosse relatar à Graça e saber dela? Não o fez!
Quando nem sequer vai ao encontro da sua amada, por qualquer meio, ao saber
da sua morte, tudo fica claro! O
Fidalgo estava na posse da gravação das imagens que o moço lhe levou e é
óbvio que aquela prova jamais seria exibida, mesmo que informalmente, a um
suspeito, por mais importante ou rico que fosse. Pelas 20 horas o Inspetor vê
o filme e pela meia-noite o suspeito é ouvido e afirma já ter visto o filme!
Ele terá visto mesmo o filme, mas antes do moço o ir levar às autoridades, alterado
pelo menos na hora (operação simples) que assinala 10h15, o que representaria
9h15 nos Açores e o absolveria de imediato porque o avião aterrou no Pico às
9h13! O
poder financeiro do Jorge mandava mais alto e assim comprou a cumplicidade. Mas
o planeamento do crime terá sido feito para a situação de não haver mau
tempo, o voo ir diretamente para o Faial, sendo depois alterado. Também assim
o Vasco fica fora da suspeita porque o avião aterraria no Faial pela mesma
hora, 9h13. O aeroporto fica a mais de 9 quilómetros da cidade da Horta. Ora,
conforme Jorge afirma, antes de alugar o carro no Pico (antes das 9h35),
telefonou ao Vasco a dar-lhe as novidades e ele ficou muito nervoso.
Demorando o contrato do aluguer no Pico cerca de 10 minutos, o telefonema
teria sido pelas 9h25. Isso só poderia querer dizer que ele já matara a Graça
e agora não sabia o que fazer. Nestas condições, por essa hora estaria o
Jorge a iniciar o caminho para a Horta, partindo do princípio que tinha
planeado ter uma viatura à sua espera, mas podendo até ir acompanhado, o que
o Vasco não sabia. Igualmente, sendo a filmagem (alterada a hora ou não)
registada no computador às 10h15 do continente, 9h15 dos Açores, o Jorge
ainda estaria no aeroporto da ilha do Faial. Portanto, se fosse o Vasco o
criminoso tentando atirar as culpas para o Jorge,
punha-o a matar enquanto ele não tinha a mínima hipótese de estar no local do
crime! O
Jorge preparou tudo para se vingar da namorada e do Vasco. Combinou com este
fazer uma surpresa à Graça. Para isso terá pedido ao Vasco para trazer o
aparelho, o capacete e o fato, logo após ficar “de baixa”’ e certamente terá
incentivado a que este desse umas voltas de asa-delta e fosse a casa da
namorada, de quando em vez, com o fato e
possivelmente com o capacete, para que ela se habituasse a vê-lo chegar assim
e não estranhasse quando fosse ele a entrar. No
dia combinado, o temporal podia complicar, mas o Jorge torneou a questão,
pedindo ao Vasco que o viesse buscar de barco a um local menos visível e daí
ter alugado o carro. Ele estava enfraquecido da imobilidade de um mês, não
conhecia o mar como o Vasco e além do mais despertaria suspeitas se alugasse
um barco. Essa foi a chamada que ele assentiu ter feito. A travessia do canal
é quase sempre possível e relativamente fácil para quem conhece, ao contrário
da aérea. Vasco veio buscá-lo e levou-o ao destino, onde tinha o fato e o
capacete que o Jorge vestiu. Como havia mau tempo, o aparelho de asa-delta
ficou fora da surpresa. Certamente
Jorge terá dito a Vasco para aguardar por ele no barco porque a surpresa era
muito breve, já que teria alguma coisa de urgente para ir fazer em qualquer
parte, enfim, coisas excêntricas de rico e, se calhar até a arma usada,
provavelmente um ferro parecido com um pé de cabra, lhe foi fornecida por
ele, como parte da alguma brincadeira… Depois
de fazer o “trabalho”, Jorge regressou ao barco, sem o fato nem o capacete,
que foram encontrados na Horta, mas com o ferro que ainda iria ter uso e
iniciaram a travessia, que só terminou para ele. Os dias seguintes iriam,
certamente, dar respostas e confirmações. O corpo do Vasco, o barco, talvez o
ferro… |
© DANIEL FALCÃO |
|
|
|