Autor Data 28 de Agosto de 1960 Secção Na Pista do Culpado [57] Competição Problema nº 6 Publicação Ordem Nova |
ERA ESPERTO… MAS MORREU Jofer O suor escorria-lhe pelas
faces e os seus olhos tinham um aspecto sonolento.
Havia duas horas que andava ali, para cá e para lá, e nada. Nada conseguira,
ainda, descobrir. Na mesa, todos os elementos de que dispunha para resolver o
caso: o relatório dos peritos fotográficos, o relatório do médico legista, os
depoimentos dos suspeitos, uns apontamentos que ele próprio conseguira no
local da ocorrência e um quase minúsculo bilhete escrito pela vítima pouco
antes de exalar o último suspiro. Já os lera dezenas de
vezes, naquelas duas horas de sofrimento, passadas naquele pequeno aposento,
apenas iluminado por uma pequena lâmpada de pouca intensidade. Era o seu
gabinete de trabalho. Sabia de cor o que os papeis
diziam. Não precisava mais de os ler, mas, somente, assimilar o que eles
continham e chegar a uma conclusão. Fez um último esforço de
concentração. A sua respiração, todos os órgãos, pareceu deter-se. Apenas o
barulho dos seus passos ecoava na sala, assemelhando-se ao bater ritmado de
um martelo. Agora já nem esse barulho
se ouvia. Tinha parado no meio do compartimento. De repente julgou escutar
as declarações de Helder Manuel: «Não, eu não matei
o meu tio. Ele era muito meu amigo e nós dávamo-nos muito bem. Seria incapaz
de lhe fazer qualquer mal». Sentiu a cabeça estalar e levou as mãos aos
ouvidos. Por momentos fez-se silêncio. Depois, novas palavras: «Não tinha
possibilidade de cometer o crime, pois estive a ler um livro toda a tarde no
meu quarto, até que o meu primo me foi avisar do sucedido». Pareceu-lhe que o som vinha
da direita. Era Joaquim Fernando que lhe falava. Voltou-se mas não viu
ninguém; continuava só. Começou de novo a caminhar.
Levou a mão à testa. Estava quente. Tirou o lenço do bolso e limpou a cara.
Aproximou-se da secretária e olhou uma vez mais aqueles papeis.
Devia estar ali a chave do mistério. Mas onde? Como um autómato, releu uma
vez mais os depoimentos dos suspeitos. «Não, eu não matei o meu tio. Ele
era…» Dissera Helder Manuel «… Pois estive a ler um
livro no meu quarto…» Foram algumas das palavras de Joaquim Fernando.
Finalmente, Jorge Renato apenas declarara «Não matei pois seria incapaz de o
fazer». Nada mais lhe puderam arrancar pois o pobre desmaiou, após ter
pronunciado aquelas palavras. Mas aqueles papéis deviam
encerrar qualquer facto primordial para a resolução do caso. E aquele bilhete
escrito pelo velho antes de morrer. Parecia um contra-senso:
«Mato-me porque um grande desgosto me obrigou a isso». O médico provara que Helder Marques fora assassinado. Porque escreveria ele
aquele bilhete, possivelmente poucos segundos antes de morrer? Sim, porque
não restavam dúvidas de que fora ele que escrevera a frase. Tê-lo-ia o
assassino obrigado a redigir aquelas palavras? Com certeza que não, pois o
velho não o faria. Que interesse poderia ele ter ao escrever o bilhete, se,
depois, de qualquer forma, o criminoso o liquidaria? Para que teria ele
escrito as tais palavras? ... O suor escorria-lhe de novo
pelas faces, e o seu raciocínio atingira o auge. Ou agora ou nunca. A testa
apresentava três rugas bem pronunciadas. Os olhos pareciam saltar-lhe das
órbitas e tinha as faces profundamente coradas. De repente, um grito cortou
o silêncio da sala. Fora um grito de triunfo que ele lançara com todas as
suas forças. Como por encanto a tensão evaporou-se. As rugas desapareceram,
as faces tomaram a coloração normal, os olhos voltaram a apresentar o tamanho
natural. A cabeça, que estivera a pontos de rebentar, ficou mais leve. Pegou,
de novo no lenço e limpou, outra vez, as faces. Tomou um cachimbo e
acendeu-o; arrancou-lhe algumas fumaças. Há três horas durava aquela luta,
que o esgotara completamente, mas Carlos Silva vencera. PERGUNTA-SE: – Indique o assassino do
velho Marques, acrescentando à sua resposta as razões que o levaram a essa
conclusão. Elabore um relatório
completo. |
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© DANIEL FALCÃO |
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