Autor

Nick Bianco

 

Data

16 de Agosto de 1979

 

Secção

Mistério... Policiário [230]

 

Competição

Torneio “4 Estações 79” | Mini C - Verão 79

Problema nº 7

 

Publicação

Mundo de Aventuras [306]

 

 

CRIME PERFEITO… OU QUASE…

Nick Bianco

 

Recostado na sua cadeira, Januário da Silva saboreava gostosamente uma «Sagres». Nunca apreciara tanto o seu sabor como hoje em que, mesmo de noite se fazia sentir intenso calor. Inesperadamente….

«TrrrimmTrriimmTrriimm…» – o telefone tocava insistentemente, a solicitar urgência em ser atendido.

«–Está lá?... Sim… Podes contar comigo… Certo… Discrição, claro… Sigo já…»

Levantou-se pesadamente e, ao sair, bateu com a porta. No exterior, uma placa de metal, brilhava à luz do luar. Nela lia-se:

JANUÁRIO DA SILVA

Detective Particular

Januário da Silva detivera-se a contemplar os dizeres e um sorriso aflorou-lhe aos lábios… este era o seu primeiro caso como detective particular…

Chegado ao local do crime, a sumptuosa residência onde a vítima habitava, já lá se encontrava a Polícia Judiciária. Por acaso, tinha sido destacado um conhecido seu de longa data: o inspector Andrade. Companheiros nos bancos dos liceus, também na Escola da Polícia se formaram juntos, tendo trabalhado irmãmente até o detective Januário se ter decidido a instalar por conta própria. Fazia precisamente hoje, dia 16, uma semana que tal facto se dera. Após os habituais abraços decidiram, também, agora que se encontravam afastados um do outro, trabalhar «como dantes»

Um jovem que se identificou como André da Ega interrompeu-os e ofereceu-se amavelmente para os levar junto da vítima, esvaída em sangue. Tratava-se do dr. Pompílio Saavedra, médico, de ascendência espanhola, bastante conhecido nos meios locais, quer pela sua simpatia e pela sua dedicação à Medicina, quer… pelo seu recente «escândalo»

Nesse compartimento que fora o escritório do dr. Saavedra também se encontrava Vitélio Marques, avisado do sucedido pelo seu colega André da Ega.

Após as habituais formalidades legais, todos recolheram a casa, tendo o corpo transitado para a morgue, onde seria feita a autópsia. Quanto à arma que originara a morte ao dr. Saavedra, não havia o mínimo vestígio em toda a sala.

No dia seguinte, já o inspector Andrade possuía, juntamente com o detective Januário, o relatório do médico legista. Este último, sublinhara a vermelho algumas passagens:

«…morte instantânea…»; «…a bala, de 6,35 mm, entrou pelo peito e cravou-se no coração…»; «…a morte deu se aproximadamente às 20 horas…»; «…o relógio, partido na queda, indicava 20.05…».

Como havia fortes suspeitas de o dr. Saavedra ter sido assassinado, foram desenvolvidas averiguações sobre as relações da vítima, tendo chegado às seguintes conclusões:

a) Vitélio Marques, recém-formado em Medicina, estava há um ano como primeiro assistente do distinto médico. Xadrezista apaixonado, também era fervoroso adepto da astronomia… Foi, ao que parece, avisado pelo colega André da Ega do sucedido.

b) André da Ega, aluno finalista da Faculdade de Medicina, encontrava-se apenas como segundo assistente da vítima. Nas horas vagas, era amante da escultura e esforçava-se por dar forma a pedras… Descobriu o corpo do médico, e após ter verificado que se encontrava morto, telefonou à Polícia e avisou o colega.

c) Natércia Lemos, ex-esposa da vítima, divorciou-se neste mesmo mês de Setembro. Avisada pela Polícia da morte, não a lamentou… Perdera a acção de divórcio movida pelo marido, e vivia com o amante, numa desconfortável posição financeira…

d)Mário Albuquerque, o quarto e último suspeito era primo em 1.o grau da vítima e, ultimamente, visitava-a com frequência. Financeiramente, a sua posição não era famosa… Para salvar a sua fábrica da falência, precisava urgentemente de um «grande empréstimo»

e) O dr. Saavedra, após ter encerrado o escritório ficou a jogar xadrez com o seu assistente, «vício» a que o recém-dr. Marques o habituara. Após o almoço, a vítima foi ao cinema, e regressado a casa foi colocar em ordem a sua colecção de medalhas, a qual, juntamente com a numismática constituíam o seu «ponto fraco»… Verificou-se contudo que ambas as colecções desapareceram, mas algumas moedas encontravam-se espalhadas pelo chão do escritório.

 

Convocados os suspeitos para serem submetidos a interrogatório, estes «desfilaram», um a um, perante o inspector Andrade e o seu bom amigo detective Januário. O primeiro interrogado foi o Mário Albuquerque:

– Sim, na realidade precisava urgentemente de dinheiro… Visitava-o para esse efeito mas ele nunca mo emprestava. Discutíamos por vezes, mas nunca pensei em matá-lo. No entanto não lamento a sua morte. Era egoísta e avaro. Veja o meu caso e o da D. Natércia: nem um tostão nos deu!... – desabafou. – Entre as 18.30 e as 21.30?... Bem, estive a ver televisão e fui jantar ao «Afonso V». Podem confirmar à-vontade…

Seguidamente, foi chamado a depor Vitélio Marques, 1.o assistente do morto. Visivelmente consternado disse:

– Eu estimava-o muito!... Como puderam fazer aquilo?... Para mim era um segundo pai… ensinava-me pacientemente tudo o que sabia… Quando me lembro dos tempos que passámos juntos!... Devo ter saído do escritório às 14 horas. Passei a tarde com uns amigos e, como ando muito interessado pela topografia da lua, e também porque ela hoje está «cheia», aproveitei e estive desde as 19 horas até às 20.15 a esboçar um mapa, com a ajuda do meu telescópio… Depois, fui jantar com o André ao «Imperial», pois tínhamos combinado que o faríamos hoje. Após o repasto, separámo-nos e ele disse-me que ia estudar. Por mim, fui estudar a vigésima partida de xadrez entre Karpov e Korchnoi… até que o André me foi chamar…

Também a ex-esposa da vítima, Natércia Lemos, foi interrogada:

– Eu não gostava dele. Tinha-se tornado desconfiado e só mantinha relações amigáveis com os assistentes. Praticamente ignorava-me. Por isso, tive aquela «aventura». O maldito não soube compreender-me e tentou divorciar-se… A essa hora andava a passear e a ver as montras, após o que fui para casa fazer o jantar. Não o matei, mas gostaria de saber quem o fez para lhe dar os meus parabéns…

Finalmente, entrou o último dos suspeitos, André da Ega, segundo assistente do médico assassinado:

– Nós éramos muito amigos. Os três, éramos um só… não percebo como não gostavam dele… um homem tão bondoso… Só lá estava há três meses, mas ficámos logo muito amigos. Todos os tempos livres eram passados juntos, desfazendo dúvidas, distraindo-nos… enfim… o que lá vai, lá vai… Descobri o corpo, deviam ser umas 22.30. Tinha ido ao escritório para lhe fazer umas perguntas acerca dos sintomas da gastrenterocolite. Como ele não respondeu ao meu chamado e a porta estava aberta, entrei para esperar um pouco, pois tinha urgência em ver as minhas dúvidas resolvidas. Foi então que deparei com o corpo. Verifiquei imediatamente que estava morto e telefonei para a Polícia Judiciária. Corri a casa do Marques, que fica aqui perto e contei-lhe o que descobri. Ele veio comigo e confirmou o óbito. Lembrei-me de lhe telefonar – e apontou para o detective Januário – pois nas investigações que inevitavelmente se seguiriam, passaria mais despercebido que a Polícia, e nós queremos estar a par dos resultados. Também não me interessa estar envolvido num escândalo… Passei a tarde a tentar fazer uma escultura e por volta das 18 horas fui estudar. Como tinha prometido jantar com o Marques às 20.15, passei por casa dele e fomos ao «Imperial»

 

Após as declarações de todos os suspeitos, os nossos dois amigos encarregados do caso trocaram olhares e sorriram um para o outro. O detective Januário levantou-se e dirigiu-se para a sala onde se encontravam os suspeitos.

– Não necessitamos mais da vossa colaboração, pelo que podem retirar-se. Mas você – e o detective Januário apontou um dos suspeitos – fica aqui connosco. Tem de nos explicar uma coisa…

Entretanto, o inspector Andrade pegou no «dossier» relativo a este caso e arquivou-o numa grande pasta. Na capa dessa pasta encontrava-se escrito:

«1978— CASOS RESOLVIDOS»

 

1 – Qual dos suspeitos ficou detido na Polícia Judiciária?

2 – Justifique as suas afirmações.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO