Autor

O Formiga

 

Data

25 de Setembro de 1980

 

Secção

Mistério... Policiário [284]

 

Competição

Torneio “4 Estações 80” | Mini C – Verão

Problema nº 6

 

Publicação

Mundo de Aventuras [363]

 

 

O DEGRAU CARUNCHOSO…

O Formiga

 

O Sol abriu os olhos e acordou. Cedo… O seu amigo relógio, que dormia ainda, despertou também, como sempre, ruidosamente… Tó Patudo tentou alcançá-lo com a mão e fazê-lo calar. Ele, contudo, esquivou-se. Tó Patudo tentou de novo. Debalde… Já furioso, sentou-se na cama e deu-lhe uma surra.

O relógio calou-se.

 

O inspector Tomé e Tó Patudo apertaram as mãos. O primeiro levantou então o nariz para o céu azul. O segundo fez o mesmo. Depois, simultaneamente, as duas cabeças manifestaram o seu apreço. Por fim, os dois homens desapertaram as mãos, que tinham ficado esquecidas.

– Estas feriazinhas de fim-de-semana, no campo, vão pôr-me novo – exclamou o inspector Tomé.

– Eu também já andava a ficar com bolor – disse o sub-inspector Tó Patudo, sacudindo uma manga do casaco.

 

O carro abandonou a estrada e entrou, ronronando, pelo portão aberto. Este, tímido, não respondeu. O automóvel seguiu, então pelo caminho bem cuidado, que não lhe magoava as rodas. Trinta metros mais abaixo, à esquerda, apareceu o pátio quadrado. Tinha um dos lados paralelo e pegado ao caminho, que seguia ainda o seu percurso até mais abaixo. O lado contrário do quadrado (o fundo do pátio, portanto) era ocupado, em todo o comprimento, pela habitação onde viviam as pessoas. Possuía duas portas no rés-do-chão e duas janelas, largas, no 1º andar. Todas observavam, atentas, a chegada dos visitantes…

O lado direito do pátio (tomando por ponto de referência o caminho) era ocupado, também em todo o comprimento, por uma construção onde se situavam a habitação dos animais e uma arrecadação. Assim, a casa das pessoas e a construção que acabamos de referir (e que se uniam num dos vértices do pátio quadrado), formavam um ângulo recto.

Por seu lado, a porta do imóvel que os animais ocupavam abria para o pátio. A da arrecadação, que não queria conversa com ela, dava antes para o caminho… O poço, por sua vez, elevava as suas paredes redondas a 1 m. do solo, bem no meio do pátio. Desta forma podia conversar à vontade, com a porta que lhe ficava sensivelmente em frente.

As pernas do Ti Januário velhote de estatura mediana, tinham-no, entretanto, trazido até perto dos visitantes. Com ele chegaram a Lina, a Tina e a Cina, suas filhas e moças casadoiras. A primeira crescera mais 20 cm. que o progenitor. A segunda igualava este em altura. A terceira era o degrau mais baixo da escada. Para chegar ao mais alto precisava de saltar 40 cm. Enfim, coisas do destino… ou talvez não.

– E que tal se matássemos a sede? – lembrou o Ti Januário, sem se preocupar com a vida da pobre.

– A minha há-de ser afogada com o «americanoso» que você cá tem – respondeu o inspector, indicando, ao mesmo tempo o método que iria empregar.

O grupo dirigiu-se, então, para a cozinha que se situava no rés-do-chão. Só o carro ficou, pois não tinha sede…

A cozinha tinha-se esmerado para receber os visitantes. Para começar, brindou-os com uma sombra refrescante… Depois, com um belo banco branco, de madeira. Por fim mandou vir o vinho, ordem que o Ti Januário repetiu: – Tina, traz do «americano» tinto… engarrafado.

Mas a sua indumentária não era menos festiva: sobre a mesa, um lindo pano, que cheirava a lavado; um fogão a lenha, sem lenha, mas escrupulosamente limpo; uma lareira, com a lenha que pertencia ao fogão; por fim um rato de tamanho médio, que passou a correr pelo chão… e era somente o batedor do grupo, pelo menos segundo palavras do dono da casa.

– Este vinho é de estalo – disse, então, Tó Patudo, que aproveitou para fazer o ruído correspondente. – É de beber e chorar por mais – terminou, pegando no lenço. A Lina, porém, foi a correr buscar os guardanapos.

 

O Sol de sábado dormia a sesta por trás de uma nuvem… O inspector, por seu lado, tinha ido mostrar a vila ao automóvel. Quanto às raparigas tinham ficado a dar banho aos pratos… O mesmo não acontecera com o Januário, que tinha saído às 14,5 horas. Tó Patudo, por sua vez, saíra também: tinha ido passear o almoço pela quinta.

Cerca das 14.45 horas, porém, passava frente à porta da arrecadação. No céu, um avião, de asas abertas, passava silenciosamente, para não acordar o Sol… O silêncio foi, no entanto, cortado pela voz do Januário. Este falava para alguém que com ele se encontrava na arrecadação:

– Pois é, minha menina, a Lina bem… – mas a voz foi assassinada por um tiro.

O sub-inspector estacou, surpreso. Mas imediatamente correu para a porta do compartimento, que estava encostada. Antes de a abrir ainda ouviu, nítido, o ruído metálico causado por algo que caira. Lá dentro… o corpo de Januário. Uma bala penetrara-lhe na cabeça.

O morto estava de costas para o pátio e caido de barriga para baixo, o que devia ser muito incómodo para ela… A cabeça estava perto da parede direita e muito quieta. A bala assassina., como Tó Patudo observou, seguira uma trajectória ascendente. A morte fora Instantânea.

A arrecadação tinha uma única porta. Sobre ela, bem lá no alto, morava uma pequena janela redonda, de vidro. Não podia ser aberta por estar incorporada na madeira. A parede em frente à entrada, por sua vez, servia de separação com a casa dos animais. Não possuía qualquer abertura, pois eles não gostavam de ser espiados. A parede do lado direito, que distava sete metros da sua opositora, não tinha também, qualquer janela ou porta. A que se situava à esquerda da entrada não seguira o exemplo da anterior: possuía, uma bela janela sem vidros, a 1 m. do solo. Para suprir a falta deles, fora apetrechada com grossas barras de ferro, que formavam quadrados. Tinham eles 15 cm. de lado.

Encostadas à parede fronteira à entrada viam-se ferramentas agrícolas. Na do lado direito estavam mais algumas, que se encontravam zangadas com as outras… Ao lado repousava uma arca, que continha ar. Na parede do lado esquerdo via-se somente uma mesa, já idosa. Perto dela, caida no chão, estava uma lata. Não podia ter sido derrubada pelo velho, cujos pés estavam longe; mas não podia, também, ter caido por ela própria (como se sabe, as latas não têm pernas)… Fora, porém, o ruído causado pela sua queda sue Tó Patudo ouvira ao entrar. Por fim, um pouco afastada da lata, via-se, ainda, a cápsula do projéctil assassino.

 

– Onde estavam vocês na altura do crime? – inquiriu, severo, o olho esquerdo do inspector.

– Eu estava na cozinha a deitar os pratos nos seus lugares – respondeu a Cina. Isso, aliás, era lógico, pois eles já tinham tomado banho… Não era comigo, portanto, que o meu pai falava quando foi morto.

– Com alguém era – ripostou o inspector. – Ele não costumava conversar com as paredes. E estas em sinal de assentimento, mantiveram-se silenciosas.

– Quando ouvi o tiro estava a limpar o chão do quarto de banho de serviço, que fica no rés-do-chão – disse, por sua vez, a Tina.

– Eu tinha subido ao meu quarto, no 1º andar – respondeu a Lina. – Quando ouvi o tiro estava à janela que dá para o pátio, pois tinha ido ver um avião que ia a passar.

– O vosso pai não tinha nenhuma arma cá por casa? – perguntou, ainda o inspector.

– Por acaso tinha uma velha pistola, que costumava guardar numa das gavetas dessa mesa – respondeu a Tina. E para lá se dirigiu. Abriu ambas e notou que ela se tinha ausentado… Como não podia tê-lo feito pelos seus pés (por não os ter), alguém a levara da arrecadação.

 

O sub-inspector chegou tarde e cansado. Para mais, o tapete de entrada passou-lhe uma rasteira. Em equilíbrio mais que precário, Tó Patudo conseguiu, no entanto, chegar ao quarto e cerrar as persianas. Depois deitou-se, apesar dos protestos da cama, e cerrou as suas…

A meio da noite, porém, acordou. Uma expressão sobressaltada bailava-lhe nos olhos inteligentes. O sub-inspector sentou-se na cama. Depois, cada vez mais inquieto, levantou-se mesmo, calçando os chinelos. E imediatamente saiu do quarto, possuído de agitação febril.

Minutos depois voltou ao leito, já mais calmo. O quarto de banho é que não cheirava propriamente a rosas…

 

Procura-se, por isso:

1 – Pessoa capaz de ajudar o sub-inspector a resolver o caso, pois este tem outros problemas (mais precisamente intestinais) com que se preocupar.

2 – Pessoa capaz de fornecer o seu auxílio por espírito humanitário ou por «amor à causa», pois as alviçaras são bem modestas.

 

…que podemos sintetizar assim:

1 – No caso de crime, quem o praticou?

2 – Exponha, devida e convenientemente o seu raciocínio.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO