Autor Data 1 de Abril de 2012 Secção Policiário [1078] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2012 Prova nº 3 (Parte I) Publicação Público |
A MORTE DO GENERAL Paulo Em
1940 o general Ivo Pais vivia com os sobrinhos órfãos, estudantes em Coimbra,
ajudado por Eva, a empregada que os criara, e Luís, o motorista que o militar
reformado recentemente contratara. Os
jovens colocavam-se de forma diversa face à guerra, em desavença que já
levara a conflito físico. Viviam juntos mas mal se falavam. Caio era um
defensor do apoio do país aos nazis. Cid achava que se deveria apoiar o lado
inglês, contando com o avô, que por via dessa posição sofria perseguição
política, tendo já sido ameaçado de morte. A
casa do general ficava numa quinta, cercada por um muro baixo de pedra. Do
lado esquerdo o terreno para a horta. Do lado direito a garagem e a
arrecadação. Nas traseiras o terreno para relva e árvores, que no domingo
trágico esperava a plantação de grama, após ter sido arado no sábado, o que
permitiu aferir os rastos deixados por quem cometera o crime. Caio estava na
arrecadação com o seu passatempo de radioamador. Disse que ouvira o tiro
cerca das onze e meia. Vira um desconhecido correr de arma na mão nas
traseiras da casa. Correra atrás do homem, que saltou o muro. Quando lá
chegou ele tinha sumido no pinhal que se abria a perder de vista. Voltara
para a casa, notara a janela do escritório aberta e vira o tio com a cabeça
em sangue. Saltara o peitoril e alertara o irmão. Não mexera em nada, pois
pelo aspecto da cara do tio percebera que morrera.
Não deixara ninguém entrar no escritório até chegarem as autoridades, a quem
ele ligara do telefone da casa. Cid,
que ouvia mal, saíra a passear, como era hábito, cerca das dez horas. Voltara
por volta das onze e um quarto. Estava no quarto a ouvir rádio. Disse que
provavelmente ouvira o tiro mas não recordava o ruído, misturado com o
programa que ouvia sempre. Soube o que se passara pelo irmão. Não se
aproximara do escritório nem da janela, por ordem do irmão, até as
autoridades chegarem. Eva
saíra antes das dez. Tinha ido à missa. Na hora em que fora disparado o tiro
regressava a casa. Solteira, tinha um filho, que diziam ser do general, com
quem vivia perto da quinta do patrão. O filho, conhecido por posições
antifascistas, discutira no sábado com o general que o ameaçara com a prisão. Luís
estava de folga. Acabara o serviço no sábado à noite quando fora buscar os
irmãos ao comboio. Era mais do que um motorista. Fora contratado pelo general
não só para o conduzir mas para guarda-costas. Por vezes andava com a arma do
general. Vivia só e não tinha álibi. O
general estava no escritório – onde não suportava ser importunado – no chão
coberto de fofos tapetes, a cerca de dois metros da janela, na direcção da porta, única do compartimento, que dava
acesso ao resto da casa. À direita havia uma secretária com um cadeirão,
perto da janela, e na parede atrás, um quadro com uma cena rural. Ainda do
lado direito um sofá, ao lado do corpo, mais junto da porta que ficava em
frente à janela. À esquerda uma mesa baixa e estantes cobrindo a parede. No
chão, pegadas de Caio marcadas com terra. Uma
poça de sangue isolada afagava a face do general. O projéctil
entrara na base da nuca, causando morte imediata, deixando uma ferida de
forma estrelada e alguns cabelos queimados, e saíra entre os olhos, subindo
suavemente. A cápsula do projéctil estava no
quintal, junto à janela. A bala mortal estava à frente da secretária.
Pertencia à arma encontrada do lado de fora do muro, oculta num buraco da
parede, mal tapado com uma pedra. A arma era do general e tinha quatro projécteis no carregador e um na câmara. Tinha as
impressões digitais de Luís que afirmara não se lembrar quantas balas tinha o
carregador, sabendo no entanto que não estava cheio por questões de segurança. As
pegadas não mostravam indícios de salto da casa para o quintal, sendo
visíveis as marcas de Caio ao entrar pela janela. Havia uma série de Caio
desde a zona lateral, rente à casa, até à janela, com a marca do tacão a
evidenciar-se. Junto à janela viravam para o muro das traseiras e voltavam à
janela mantendo as mesmas características. Outra série de pegadas com todo o
pé homogeneamente visível vinha do muro à janela e regressava. As botas que
fizeram essas marcas foram encontradas no pinhal, juntamente com umas luvas,
a cerca de 300 metros do muro. Mais tarde, quem matou, confessou que as
usara. O
testamento fazia herdeiros os sobrinhos e Eva, mas antes da morte já todos
sabiam o que os esperava. Perante
estes factos, pede-se que façam um relatório que permita identificar quem
cometeu o crime. |
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© DANIEL FALCÃO |
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