Autor Data 16 de Fevereiro de 2003 Secção Policiário [605] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2002/2003 Prova nº 5 Publicação Público |
UMA AVENTURA DE SHERLOCKÃO Rip Kirby Na grande clareira
encontravam-se reunidos, em assembleia geral ordinária, todos os animais que
habitavam a floresta. De acordo com o que
consegui entender, no meio da grande vozearia que ali reinava, aquela
assembleia havia sido convocada a pedido do clã dos cervídeos por ter sido
raptado na véspera um filhote de um casal deste clã que reclamava justiça. A solução não parecia
fácil. O grupo dos poderosos, de que faziam parte o leão, a pantera, o
jacaré, a águia, etc., etc., eram de opinião que não valia a pena perderem
tempo com coisa tão insignificante. A águia dizia até com certo desdém:
“Mesmo assim, quem quereria um miserável filhote de gamo?” No grupo dos mais fracos
dizia-se que uma vida é sempre uma vida e que tudo devia ser feito para a
salvar. Por fim, depois de muitos
grunhidos, urros, balidos, zurros, latidos, miados guinchos, etc., chegaram a
acordo e Sherlockão foi encarregado de encontrar o
desaparecido e apresentar um relatório no dia seguinte, para o que ficava desde
já convocada nova assembleia. Entretanto, eu fui
destacado para fazer a reportagem de um outro evento, pelo que não me foi
possível assistir a esta assembleia. E teria ficado sem saber o seu
resultado, se não fosse a possibilidade, que me foi dada por uma arara azul
que secretariara a assembleia, de consultar a acta
dessa magna reunião. Foi pelo que ficou exarado
na referida acta que eu tive conhecimento do
relatório do Sherlockão e de outros pormenores que
passarei a referir. Dizia o relatório do Sherlockão: «Havia sido encontrado o
cadáver de um filhote de gamo já bastante crescido a cerca de 3 quilómetros
da clareira num terreno arenoso junto a um rio. Não haviam árvores por perto
e no chão, bastante húmido, não existiam pegadas. Observara o corpo e verificara,
ao tocar-lhe, que todas as suas costelas deviam estar fracturadas
bem como alguns outros ossos. Num dos lados do dorso
viam-se dois buracos profundos apresentando-se o que ficava mais próximo da
cabeça rasgado na direcção desta. No lado contrário do dorso
eram seis os buracos que se viam, estando os três mais próximos da cabeça
também rasgados na direcção desta. Sherlockão terminava o relatório referindo aqueles
em quem recaíam as suas suspeitas. Eram eles: o leão, o mabeco e a águia. Chamado a depor o leão
disse: – Não fui eu o autor desse
rapto. No dia em que isso aconteceu andava eu caçando em lugares muito
distantes, como pode testemunhar ali o elefante, presidente desta assembleia,
com quem me cruzei algumas vezes. O presidente balançou a
tromba várias vezes em sinal de assentimento. Por sua vez, o mabeco
afirmou: – De facto, vi nesse dia a
vítima andar passeando na orla da floresta e confesso que me apeteceu
caçá-la. Como me encontrava sozinho, não o tentei, mas fui em busca dos meus
irmãos e quando voltamos já não a vi. Foi depois chamada a águia
para fazer o seu depoimento. Aproximou-se coxeando aparatosamente e declarou: – Eu nunca podia ter levado
a efeito esse rapto. Precisamente no dia que isso aconteceu fui alvejada por um
humano que me atingiu, inutilizando-me a perna direita. Sherlockão aproximou-se e verificou que efectivamente a águia tinha um ferimento bastante grande
na pata referida, que lhe cortara os tendões, não podendo por isso movimentar
os dedos. No vulgar linguajar dos
humanos teria sido dito que a águia fora atingida por uma bala. Seguiram-se depois as
deliberações e chegou-se a uma conclusão. Mas essa, eu não vou revelar. Deixo
para os meus amigos a tarefa de tentarem desvendar este mistério. Quero apenas acrescentar
que muitas das palavras aqui usadas são a tradução daquilo que ouvi ou li, já
que certamente os meus amigos não iriam entender a linguagem original. |
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© DANIEL FALCÃO |
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