Autor Data 1 de Março de 2008 Secção Competição Problema nº 7 Publicação O Almeirinense |
O MISTÉRIO DO RELÓGIO DE CUCO Rip Kirby O
professor Ludgero Silveira era um milionário e filantropo que havia dedicado
a sua vida e fortuna ao ensino especial, tendo, para isso, fundado um colégio
onde crianças e jovens, portadores de variadas insuficiências, recebiam a
instrução adequada. Além disso, outras organizações lhe deviam a origem ou o
apoio. Por tudo isso, eram numerosas as comendas e condecorações que, ao
longo da sua vida, lhe foram atribuídas. Era
também um conceituado charadista, cruzadista, xadrezista e damista, tendo em todas estas modalidades recebido
numerosos troféus, que enfeitavam uma estante na sua casa. Tudo
isto foi anunciado nas estações de rádio e televisão no dia em que ocorrera o
seu falecimento, aos 95 anos de idade. Todas estas qualidades eram já do meu
conhecimento. Afinal, o falecido era meu conterrâneo e tio do Sargento
Silveira. Contudo,
o professor, apesar da toda a sua inteligência, tinha uma fraqueza
supersticiosa pelo número 3 e pelo triângulo. Dizia ele que o triângulo era
um símbolo de força e poder. Por isso, ele, apesar de se afirmar um ateu
endémico, não tinha pejo em afirmar que a força do Cristianismo estava na
Santíssima Trindade. Por esse motivo, ele tinha também um carinho especial
pelo Eduardo. Costumava dizer-lhe que o apelido que ela carregava consigo
haveria de o levar longe na profissão que escolhesse. Alguns
dias após a morte do professor, o Silveira convidou-me para assistir à
abertura e leitura do testamento do tio. Contrariado, aceitei e é por isso
que, agora, estou aqui sentado entre o sargento e o inspector
Trindade (que também foi convidado), no meio de uma multidão desconhecida
para mim, nesta sala da casa que foi a moradia do professor. A
biblioteca fora o local escolhido para se proceder à leitura do testamento e,
enquanto isso não tinha o seu início, entretive-me a estudá-la. Na
parede de um dos topos, aquela que se encontrava na minha frente, por cima da
mesa de trabalho, encontrava-se um retrato do professor, pintado por um
artista seu conterrâneo. A ladeá-lo, emoldurados, viam-se os numerosos
diplomas dos cursos frequentados, em Portugal e no estrangeiro, pelo
professor. Num dos cantos da sala, estava uma vitrina onde se viam os troféus
ganhos nas modalidades já referidas. No canto oposto, outra vitrina continha
as condecorações com que o professor havia sido agraciado. Na
parede do lado direito, havia várias janelas que davam para uma varanda, para
lá da qual se via o jardim. Nos espaços entre as janelas, havia estantes
repletas de livros. Na
parede do lado esquerdo, entre duas portas que davam acesso a outras
dependências da moradia, havia mais estantes com livros e obras de arte. Na
parede que ficava nas minhas costas, havia uma fotografia aérea da cidade
natal do professor e um grande relógio de cuco, artisticamente trabalhado.
Este relógio era obra de um irmão do professor, também já falecido,
apaixonado por mecânica e relojoaria. Era dotado de dois pesos, de tamanho
proporcional ao relógio – um que accionava o
mecanismo que fazia girar os ponteiros e o outro destinado a accionar o carrilhão. Finalmente,
o Dr. Peres Monteiro, advogado do professor, tomou lugar na secretária,
retirou de uma pasta, que transportava consigo, um envelope de formato A4,
que mostrou para todos verem que os três selos de lacre se encontravam
intactos. De dentro deste envelope, retirou outros cinco mais pequenos, que
observou, rapidamente. Pegou num deles que também mostrou, para que víssemos
que se encontrava lacrado e dirigido à sua pessoa, com a referência de
confidencial. Abriu-o
e leu em silêncio a folha que retirou de dentro. Acabada a leitura, disse: “Nesta
carta, que me foi endereçada, sou informado de que o testamento se encontra
escondido, algures, nesta moradia.” “Tenho
aqui quatro envelopes, dirigidos a cada um dos sobrinhos do meu cliente, nos
quais é fornecida a pista para a descoberta do testamento. Devem verificar
que se encontram lacrados. Analisem o seu conteúdo, sem tecerem, entre vós,
qualquer comentário a seu respeito.” Chamou, de seguida, os quatro
presumíveis herdeiros, entre os quais o Sargento Silveira. O
Sargento levantou-se quando foi chamado, recebeu o envelope que lhe
correspondia e voltou, sentando-se, agora, entre mim e o Eduardo. Abriu o
envelope que continha uma folha de papel, datada de dois anos atrás, onde
estava desenhada a tabela reproduzida abaixo. Nota:
Estes pequenos círculos eram pintados de negro,
o que lhes dava um pequeno relevo. Por
alguns momentos, olhámos o desenho; depois, sem soltarmos palavra, retirámos
dos bolsos as nossas agendas e canetas e começámos a escrever. Durante
largos minutos ou horas, o silêncio reinou na sala e só foi quebrado quando,
no relógio de cuco, soaram três badaladas. “Só três horas!” Exclamou alguém. “O
relógio está atrasado duas horas”, esclareceu Maria Isabel, que vivera com o
professor até à morte deste. “Há mais de dois anos que ele se atrasa quase
três horas em cada 24, mas o tio nunca autorizou que se mandasse reparar a
avaria”. Escutando
esta informação, o sargento Silveira, que já tinha parado de escrever e que
tinha a mesma paixão que o pai pela relojoaria, levantou-se e foi até junto
do relógio, que analisou detidamente. De repente, exclamou: “Cá
está!” E ergueu, na mão direita, um relativamente fino rolo de papel, atado
com uma fita e lacrado, que entregou ao advogado. O
advogado quebrou o lacre, desenrolou o rolo, que observou durante um minuto e
disse: “Portanto,
já temos na nossa mão o testamento do meu insigne amigo e cliente Professor
Doutor Ludgero Silveira.” Passou a ler… …Não
vamos ficar escutando a leitura do testamento, o que é sempre maçador para
aqueles que não são beneficiados por ele; e nós, certamente, não seremos. Apenas
queremos que nos digam o significado desta tabela. Queremos também que nos
digam, pormenorizadamente, onde o sargento encontrou o testamento. E, para
completar a informação, agradecemos também que nos digam o que levou o
sargento a concluir que o testamento estaria exactamente
onde o encontrou. Nota:
Os pequenos círculos eram pintados de negro, o que lhes dava um pequeno
relevo. |
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© DANIEL FALCÃO |
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