Autor

Onaírda

 

Data

22 de Junho de 2008

 

Secção

Policiário [883]

 

Competição

Campeonato Nacional e Taça de Portugal – 2007/2008

Prova nº 7

 

Publicação

Público

 

 

O ENIGMA DAS PORTAS FECHADAS

Rip Kirby

 

21h15 de um dia 30 de Agosto. Francisco, chefe dos empregados dos Castro, um homem rondando os 2 metros, chega à moradia reparando nas luzes acesas nos aposentos do seu patrão. No dia seguinte seria o seu último dia de férias mas, como era costume há muitos anos, regressava mais cedo. O patrão, Albano de Castro, e os seus dois netos regressariam no dia 1, não era costume fazerem-no antes dessa data. Por isso estranhou as luzes acesas. Guardou o seu Clio na garagem onde encontrou o carro de Albano. Pensou: Que se teria passado para o patrão voltar antes da data prevista? Encaminhou-se para a porta das traseiras que abriu com uma chave que tirou do bolso e entrou.

Dirigiu-se ao gabinete do patrão e bateu na porta. Não obteve resposta, voltou a bater rodando a maçaneta, mas a porta não se abriu. Como estava fechada à chave, tornou a bater chamando pelo nome do patrão. Preocupado, foi à cozinha, saiu para o exterior, foi a uma arrecadação buscar uma escada e, dando a volta ao edifício, encostou-a junto de uma das janelas iluminadas. Subiu e espreitou para o interior vendo o patrão sentado à secretária numa posição estranha. Bateu no vidro, mas Albano de Castro não escutou. Com preocupação redobrada, voltou para dentro e telefonou para a polícia. Esta chegou 20 minutos mais tarde, pois a moradia distava 6 quilómetros da vila. Francisco expôs a sua preocupação aos agentes. Estes, depois de algumas tentativas para abrirem a porta, resolveram usar a escada que ainda estava encostada junto da janela. Um dos agentes subiu mas logo desceu; pediu para usar o telefone e falou alguns momentos.

Poucos minutos depois chegava a brigada criminal comandada pelo inspector Eduardo Trindade, que se dirigiu imediatamente para a escada subindo-a mas logo desceu dando uma ordem a um dos seus subordinados. Este subiu, partiu o vidro da janela, abriu-a e entrou no aposento indo abrir a porta que dava para o resto da casa e que tinha a chave na fechadura. Verificou que, pela posição da chave, não era possível usar outra pelo lado de fora. Eduardo entrou acompanhado pelo seu ajudante Silveira. A sala era ampla, talvez uns 15 metros de comprimento por 6 de largura.

Na parede em frente da porta por onde entraram, e que era a única de acesso à sala, havia duas janelas, uma das quais era a que tinha sido aberta por ordem de Trindade. Perto desta janela havia uma secretária por detrás da qual, numa poltrona, se encontrava sentado o corpo do dono da casa tombado sobre o seu lado direito. Havia sido atingido com um tiro na têmpora do lado oposto.

Num dos topos da sala havia uma porta que se encontrava fechada e que, segundo o mordomo informou, dava para uma capela. Tentaram abri-la, mas estava fechada à chave, o que causou estranheza a Francisco, já que era usual estar aberta e com a chave na fechadura. Ao centro da sala havia uma mesa baixa e junto desta, no chão no lado contrário à capela, encontrava-se, em cacos, uma jarra de porcelana. Um pouco mais além um naperom de crochê.

No outro topo da sala existia outra porta que dava para o quarto de dormir do dono da casa, onde não foi encontrado nada de estranho. Não havia nenhuma outra porta e todas as janelas estavam fechadas. Junto desta porta, no lado de fora do quarto, sobre um móvel, estava uma escultura. Era bastante pesada, representando dois campinos a cavalo mas dos quais apenas um empunhava o pampilho. O pampilho do outro cavaleiro havia caído ou sido retirado, dando o aspecto de uma moca furada à mão do cavaleiro. O pampilho em falta estava junto à base da estatueta e também aqui foi encontrada uma chave que Francisco identificou como sendo a da capela.

Aberta a porta da capela, foi encontrado a poucos metros o corpo de um rapaz de pouco mais de 20 anos que o mordomo identificou como sendo Artur de Castro, o neto mais jovem do dono da casa. O jovem aparentava estar inanimado, pelo que o inspector chamou o médico que viera com ele, mas quando este chegou já o jovem se encontrava sentado e contava o que havia acontecido.

Tinham chegado da vila, onde tinham jantado, havia poucos minutos – encontrava-se na sala conversando com o avô, não havia mais ninguém na casa, já que o seu primo Américo Castro havia ficado na vila onde dormiria no hotel – quando dois homens muito altos e mascarados entraram e, enquanto um o subjugava, o outro mantinha o avô sob a mira de uma pistola. O tipo que o segurava, muito forte por sinal, arrastou-o para a capela para onde o atirou depois de lhe ter dado uma forte pancada na cabeça. Não se lembrava de mais nada. O médico apalpou-lhe a cabeça, onde encontrou uma leve protuberância um pouco acima da testa.

O inspector ordenou que lhe trouxessem Américo de Castro. Este, advogado conceituado, era um homem alguns centímetros mais alto do que o mordomo e mais forte do que este. Rondaria os 30 anos. Quando interrogado, disse que nada sabia, pois viera com o avô, mas ficara na vila, onde todos haviam jantado por a casa não estar em condições de os receber e ele gostava de comodidade. Depois o avô e o primo vieram para casa e ele ainda ficou alguns minutos num café, indo depois para o hotel, de onde não voltou a sair. Dando uma volta pela capela, o sargento Silveira reparou que não havia janelas, apenas alguns respiradouros a bastante altura; perto da porta encontrou um taco de basebol no qual não foram encontradas impressões digitais. Deteve-se junto do altar onde uma imagem de Santa Teresinha, pela forma estranha como estava colocada, lhe chamou a atenção. Silveira levantou um pouco a imagem para a colocar na posição que lhe parecia certa quando, do seu interior oco, caiu um rolo de fio do que é usado na cozinha. Verificou-se mais tarde que tinha cerca de 65 metros.

A arma do crime foi encontrada numa caixa de sapatos sobre o guarda-roupa do quarto de Américo. Não tinha impressões digitais mas exalava o cheiro característico de arma recentemente disparada. Segundo a opinião do médico, a morte, que havia sido instantânea, teria ocorrido entre as 20h30 e as 21h30.

No hotel garantiram que Américo havia chegado cerca das 20h45 e que não voltara a sair. Francisco não tinha álibi; viera directamente para casa no seu Clio, que ainda estava quente, mas garantia que não havia sido ele quem fizera aquele trabalho.

Interrogados sobre os motivos porque haviam regressado antes da data prevista, Américo disse que não sabia ao certo. Por uma conversa do avô pensara que tivesse sido devido a pressão do Artur, mas durante a viagem convenceu-se que estava enganado, pois o primo levara todo o tempo a reclamar pelo facto das férias terem terminado antes do tempo. Artur, estudante de medicina, afirmou que fora o avô que lhe dera na veneta vir-se embora mais cedo.

Não foram encontrados sinais de arrombamento em nenhuma porta ou janela da casa. Também não foram encontradas impressões digitais para além das pertencentes aos ocupantes habituais da casa. Apenas na maçaneta da porta da sala, pelo lado de fora, se via uma amálgama de impressões que não foi possível identificar e na do lado de dentro, apenas muito ao de leve, os sinais de dois dedos do agente que abrira a porta. Na imagem de Santa Teresinha que estava impecavelmente limpa apenas foram encontradas as impressões do sargento Silveira. Um dos agentes, da equipe do inspector, necessitando de ir ao quarto de banho, encontrou ali um par de luvas de enfermagem. Garantiu que as luvas não se encontravam ali quando revistara anteriormente aquele compartimento da casa.

Será que com estes elementos os meus amigos são capazes de dar uma luzinha ao inspector Trindade que o ajude a deslindar este mistério?...

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO