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Autor Autor não identificado Data Maio de 1981 Secção XYZ-Policiário [8] Competição I Campeonato Nacional de
Problemas Policiários Problema nº 5 Etapa de Faro Publicação XYZ-Magazine [12] |
…E O ALENTEJO FICOU MAIS POBRE Autor não identificado O
sol, há pouco sobressaído no horizonte, começava já a absorver o sombreado do
casario. Na torre da remota vila alentejana, o velho mas certeiro relógio
badalava as 9 horas de um prazenteiro dia primaveril. O
inspector Mafú estacionou
o carro junto ao portão do muro que cerca a ampla vivenda da família Castro.
Fora há pouco solicitado telefonicamente para averiguar mais um caso, desta
vez o assassínio do sr. Joaquim Castro, homem de
grande prestígio e rico fazendeiro do sítio. Agora
defronte do portão, o inspector prestes a entrar,
olhava em frente, a soberba e requintada fachada principal do edifício, ou ao
redor, o majestoso e verdejante jardim. Jardim cujo emaranhado arvoredo, de
múltiplas variedades e mil tons verdes, recaía como um tecto
cerrado, filtro da escassa luminosidade que se derramava pelo solo. Não
havia dúvida; era esta a morada… No entanto, mal o inspector
pisou o xadrez variegado da calçada, alguém vindo de casa se lhe dirige: –
Desculpe, é você o inspector… Mafú?
– perguntou a criatura ao aproximar-se. –
Exacto, senhor… –
Castro Miranda, filho do sr. Joaquim. –
Então o que há sr. Miranda? – indagou
secamente o inspector depois dos cumprimentos. –
Bem… acontece que meu pai morreu, tudo aponta o assassínio! Mas… –
Não se preocupe, tudo acabará por resolver – animou-o o inspector,
deitando fora o filtro fumegante de um vicioso cigarro. E
retomando a marcha os dois homens entraram em casa. Conduzido
ao local onde ocorrera a tragédia, o jovem agente da Bayer & Bayer Investigations, achava-se perante um quadro «vivo» e macabro. O
aposento, onde parecia pulular ainda uma névoa mortífera, não muito faustuoso
decorativamente, elevava-se a um mais ou menos alto 1º andar. O seu singelo interior
reflectia bem a humilde personalidade de Joaquim
Castro, que esta noite acabara de perder. Quem
com fulgurantes olhos de inspector prescrutasse um a um todos os objectos
do apartamento, poderia precisar inequivocamente que o corpo do temerário lavrador
jazia carecido de orgânica, e não estava revigorizando-se num profundo sono,
como leviana análise poderia fazer crer. E quem se afoitasse numa análise
mais próxima, não só verificaria o anterior, como indubitavelmente
confirmaria ter sido uma reles faca de cozinha que arrebatara aquela vida e
lhe deixara descentrada no peito uma irregular ferida, de cujos bordos
carnosos emergiam pequenos fios de já coalhado sangue. Fora
mais um asqueroso crime! O
porquê dele talvez se relacionasse com um monárquico cofre, que outrora
cobiçado, estava agora aberto de par em par revelando um conteúdo «abstracto» e
pressagiando furtiva violação. Dos vultuosos maços de notas ninguém sabia o
paradeiro, assim como de certos objectos e
documentos valiosos para a família. Somente uma velha pistola, habitualmente
ali guardada, pousava agora em cima do cofre, o qual parecia não ter sido
forçado ao abrirem-no. Quanto
ao como do crime também havia algo
de elucidativo. Ladeando
o leito da vítima estava uma sobranceira porta-janela, que dando para as
traseiras, tinha um buraco de palmo e meio numa das médias vidraças, pelo que
o quarto há muito mergulhara na fina brisa matinal. Muito
embora o partir do vidro não tivesse sido detectado
pelos residentes na mansão, fora por aí que a morte fizera a sua entrada
sinistra no quarto. Isto
era o cenário e a lógica dos acontecimentos que ressaltavam aos olhos do inspector, que achou conveniente recolher depoimentos das
pessoas que conviviam com o sr. Joaquim. As
declarações dos possíveis autores do crime prestaram-se logo de seguida,
porque a manhã galopava amena ao encontro da tarde e o inspector
costumava dizer que «quando o ferro
está incandescente é que se malha»: –
CASTRO MIRANDA – O filho do morto era homem dos seus 30 anos, alto e forte,
pouco falador e hoje mais calado ainda: – Eu… eu estava em minha casa, que é
aqui perto, quando chegou a maldita notícia. Não podia fazer nada! Isto é,
vim logo que pude. As relações entre nós? Eram as mesmas de sempre… Apenas
existia um desacordo entre nós relacionado com um projecto luxuoso de irrigação, com que meu pai sonhava e
agora tentava pôr em prática. Mas isso era o menos… –
SANTOS MIRANDA – Enteado da vítima, ainda novo e apesar do ar consternado de
hoje, deixando transparecer uma simpatia que se coaduna no esbelto físico de
homem irrequieto: – Bem, eu vivo em Lisboa. Há dias passara por cá para
tratar de uns negócios com meu falecido pai, relacionados com a aquisição de
maquinaria agrícola, e ontem, já noite, quando me deitava, acabou por me
telefonar confirmando o fecho do negócio; foi pois com surpresa que esta
manhã recebi o telefonema de meu irmão. Cheguei agora, pouco depois das 9
horas, não estou ainda ao corrente dos factos mas um homem de iniciativas em prol
da região não merecia tal! –
JOÃO e FLÁVIO – respectivamente, neto da vítima e
filho da ama, são dois rapazes mergulhados numa juventude de 17 e 19 anos,
que mostraram interesse em dizer: – Estava passando uns dias na casa de meu avó mas ontem à noite fui a uma festa, demorei
bastante para que quando chegasse já tudo tivesse acontecido. Embora
às vezes discutíssemos, o vê-lho Joaquim não era má pessoa, apenas demasiado
«economista» e não compreendendo os
preconceitos da juventude de hoje… –
Exacto. Eu andava deambulando pelas ruas da vila
quando encontrei o João que me convidou para a tal paródia. Como prometia ser
excitante, aceitei. Aquilo começara já tarde e mais tarde acabou, por isso só
pela manhã, já «tocados» é que
regressámos a casa. Já tudo tinha acontecido ao pobre velhote… –
JOANA BRITES – Empregada de sempre na casa, fora ama da já falecida patroa, e
era-o agora do sr. Joaquim: – Fui eu que dei com o
patrão mono! E se não estivesse tão «ferrada»
teria sabido quem era o criminoso, pois estou encarregada de velar pelo
senhor. Infelizmente
tenho o sono pesado e foi a Miquelina que me bradou para ir ver o senhor.
Quando cheguei e vi aquilo, fiquei transtornada; corri à janela a tempo de
ver ainda um vulto galgar o portão, donde soou uma zunida
de motorizada. Corri
logo a chamar o sr. Castro, que assim que cá chegou
lhe telefonou a si para Évora, e a todos os outros familiares. –
MIQUELINA MARIA – Empregada muito mais nova que a ama, e também há pouco
desempenhando os serviços de «Dona de Casa»: – Como calcula estava a dormir,
mas uma sucessão de leves barulhos abafados foi o suficiente para me acordar.
Os sons pareciam vir do quarto do patrão, e assemelhavam-se ao resmalhar de
papéis e surdos correr de gavetas. Chamei logo a srª
Joana que dormia profundamente aqui no quarto ao lado, comigo. Como insisti
ela foi ver o que se poderia passar. Daí a pouco comecei a ouvir os gritos,
corri para o quarto e fui encontrar a srª Joana na
varanda da janela, a gritar: a-ssa-ssi-nos, a-ssa-ssinos, de tal maneira que me assustei. Ainda
agora me parece mentira! Se não fossem os factos diria que o senhor morrera
por natureza: de facto, ontem à noite, contrariamente ao habitual, não comeu.
Tinham-lhe dado os remédios há pouco, e à hora de jantar estava na cama, bocejando
e dizendo-se muito cansado. Apesar
de o conhecer mal não o acho merecedor de tal crime. Não se mata um homem
para obter dinheiro ou qualquer satisfação!!! Tudo
começava a clarear na mente do inspector. Saiu para
o jardim onde as ideias correram até se tornarem límpidas; dirigiu-se aqui e
acolá; parou junto à janela partida, e no chão encontrou indícios
indubitáveis de que alguém trepara pela parede até à varanda da janela… Divagou
ainda mais algum tempo pela frescura do arvoredo, até que o médico legista,
debruçando-se da janela o chamou. Mafú, a passo,
caminhava para a mansão, certo já da sua teoria e providências a tomar…
Resolvera mais um caso. SEGUINDO
OU NÃO O RACIOCÍNIO DO INSPECTOR, DIGA: 1
– Quem praticou o crime e porque afirma ser essa pessoa. 2
– Acha que houve cumplicidade? Em caso afirmativo, diga quem. Qualquer que
seja a resposta explique convenientemente a sua opinião. |
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© DANIEL FALCÃO |
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