Autor Data 21 de Outubro de 2018 Secção Competição Prova nº 4 Publicação Audiência GP Grande Porto |
CONTAS DESAJUSTADAS Verbatim Afonso Sena enquadrou o
caso: “Sr. Inspetor, o Carlos Guimarota, o João
Liberto e eu planeámos esta viagem a Nova Iorque com todo o cuidado. Combinámos
as coisas de modo a que o grosso dos gastos acabasse distribuído de maneira
igual pelos três a fim de pouparmos algum dinheiro. Estivemos cinco dias
exatos em Nova Iorque. No entanto, pouco antes da
partida, confrontei-me com uma dificuldade financeira e pedi, ao João e ao
Carlos, um adiamento da minha contribuição para as despesas comuns. Eles
concordaram logo. Quando regressámos, uma vez feitas as contas em euros,
verificámos que o bolo dos gastos comuns atingira 6000 euros, para os quais o
João dera 3600 e o Carlos 2400. É como se cada dia em Nova Iorque nos tivesse
custado 1200 euros, tendo o João pago 3 dias e o Carlos 2 dias. Uma semana depois do
regresso, apressei-me a ressarcir o João e o Carlos do dinheiro adiantado. As
contas eram bem simples. Cabia-me entregar, aos meus amigos, um terço dos
6000 euros gastos, ou seja 2000 euros. Havia só que dividir 2000 por 5 partes
para dar 3 partes ao João e 2 ao Carlos, a fim de saldar as contas de acordo
com as contribuições de cada um deles para o bolo comum. Depois de lhes falar
no assunto, transferi 1200 euros para o João Liberto e 800 para o Carlos Guimarota. Corria tudo bem até que, há
uma semana, apareceu o João no ginásio a dizer que o Carlos só tinha que
receber 400 euros, enquanto ele tinha direito a 1600. Achámos que estava a
brincar. Ele, porém, insistiu, com ar sério. O Carlos, visto estarem ali
pessoas conhecidas, limitou-se a dizer-lhe para ir dar uma volta. Eu, pelo
meu lado, pedi também ao João para não se armar em tolo. Ele, porém, não
desarmou, acabando o Carlos encostado ao João aos gritos, a dizer que não
admitia que se pensasse que ele pudesse querer ficar com o dinheiro de
alguém, acrescentando que se havia ali um gatuno só poderia ser ele João. Foi
quando este escorregou e caiu estatelado no pavimento de mosaicos. Sei que
está com um traumatismo craniano mas, felizmente, sem correr perigo de vida.
Quando puder falar connosco talvez consiga explicar por que motivo nos quis
irritar. Há umas outras contas, relativas a namoradas, que eles jamais
acertaram, Terá sido por causa disso que o Liberto veio com esta provocação
sem pés nem cabeça? Não sei.” Carlos Guimarota
confirmou o depoimento de Afonso Sena, listando ainda visitas feitas em Nova
Iorque e até em Washington, onde foram no terceiro dia. Mostrou comprovativos
das diversas despesas. Anotou que em Washington avistaram uma antiga namorada
dos dois, inserida num grupo brasileiro. Confessou que “De facto, perdi a
cabeça com a estúpida brincadeira do João, mas não o empurrei. Estava
disposto a dar-lhe uma cabeçada, mas nada mais do que isso. Não lhe desejo
mal algum, mas exijo que retire as insinuações de que quis ficar
indevidamente com o dinheiro dele”. O Inspetor estagiário
Timóteo Silva obteve as declarações anteriores na sequência de uma queixa,
apresentada pela família de João Liberto, contra Carlos Guimarota,
acusando este de ter agredido e difamado aquele seu familiar. Entretanto, João Liberto
recuperou, não desmentiu os depoimentos dos amigos, afirmou ter-se sentido
ameaçado, para além de difamado, mas não propriamente agredido. Explicou
também as contas que fez. A partir do que ouviu, o
Inspetor estagiário concluiu que este caso talvez pudesse ser resolvido
através de uma conciliação. Falou com o chefe, o velho Flávio Alves, que
concordou com a proposta do seu subordinado. Timóteo Silva saiu-se muito
bem da sua incumbência conciliatória. Flávio Alves comentou o feliz
acontecimento com o seguinte comentário: “Eles não voltarão a ser amigos como
dantes mas, pelo menos, não farão guerra entre si”. |
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© DANIEL FALCÃO |
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