Autor Data 25 de Outubro de 1979 Secção Mistério... Policiário [240] Competição Torneio
“Novos" e “Iniciados” 79 Problema nº 10 Publicação Mundo de Aventuras [316] |
UMA QUESTÃO DE COR… Yensid Tlaw «Passar
urna vida a combater o crime, para, no fim… ser assassinado!!!»
– pensava Pierre Toujour, enquanto se dirigia a
casa do seu amigo José Rocha, morto havia poucas horas. Pierre
Toujour nascera em França. Filho de emigrantes, viera residir para Portugal após a morte dos pais, onde
se casara e em seguida se naturalizara, tendo, desde então vivido na pátria
que os seus progenitores haviam deixado, em busca de melhores dias. Desde
que vivia em Portugal fizera muitas amizades, bem como alguns inimigos, como
é natural, na sua profissão de inspector da Polícia
Judiciária. Uma dessas amizades fora José Rocha, como ele, inspector da referida Polícia. Soubera da sua morte pelo
sargento Ferreira que lhe telefonara informando-o do sucedido. Eram
14 horas quando Pierre chegou ao N.o 3
da Rua Sal e Mar, em Algés. A
porta estava aberta. Entrou e, como já conhecia a casa, dirigiu-se à sala de
estar, onde fora encontrado o corpo, já sem vida, do seu amigo e companheiro
de trabalho. A
primeira pessoa que viu, ao entrar na sala, foi o sargento que lhe tinha dado
a notícia, que, sentado a uma mesa, escrevia algo num bloco-notas. Levantou
os olhos da escrita e, ao ver o inspector,
cumprimentou: –
Boas tardes, inspector! –
Boas tardes! – devolveu Pierre. – Onde se encontra o
corpo? –
Ali… – apontava um sofá – …por detrás daquele sofá. Dirigiu-se
ao local indicado. Sentiu
um arrepio percorrer-lhe a espinha, ao ver o cadáver. Não porque fosse seu
hábito assim suceder, mas sim porque o morto era alguém por quem ele tinha
grande estima. O
corpo repousava estendido, de bruços, sobre a carpete da sala. A nuca, quase
desfeita, causa, sem dúvida, das inúmeras pancadas que recebera, desferidas
pelo criminoso, com o enorme pesa-papéis de vidro que jazia caído junto ao
corpo, exibia um espectáculo repugnante. Analisou o
pesa-papéis: uma massa de cabelos e sangue, cobria-o
parcialmente. Da ferida, um fio de sangue, já coagulado, ia até uma enorme
poça do lado direito da cabeça do morto. Como movido pela curiosidade, Pierre
quis ver-lhe a cara: uma expressão calma e despreocupada o fitou, quando o
fez. Recolocou o corpo na mesma posição. Na mão direita, o inspector Rocha, segurava ainda o «Mundo de Aventuras» N.o 245 que, naturalmente, tinha sido
surpreendido a ler, quando fora atacado, e que ostentava sobre a capa uma
mancha de sangue que tudo levava a crer ter sido ali posta pelo seu dedo.
Pierre olhou à sua volta: não havia quaisquer sinais de luta. –
Há suspeitos? – perguntou, finalmente, quebrando o
silêncio, e voltando-se para o sargento. – Já prestaram declarações? –
Sim, há três: o vizinho, que encontrou o corpo, e dois sobrinhos do inspector, de quem, aliás, já recolhi os depoimentos – volveu,
estendendo o bloco notas em que estava escrevendo,
quando Pierre entrou. – Está tudo aí, juntamente com o relatório do
médico-legista. Pegando
no bloco-notas, Pierre leu: «Hoje,
10 de Outubro de 1978, cerca das 13 horas, recebi um telefonema dando-me
conhecimento da morte do meu superior, inspector
José Rocha. Imediatamente me dirigi ao local de onde fora enviado o referido
telefonema. Quando lá cheguei, deparei com o seguinte quadro…». Como
o que estava escrito a seguir não acrescentava nada ao que já tivera
oportunidade de observar, passou imediatamente aos testemunhos do médico-legista,
dos dois sobrinhos e do vizinho: «Médico-legista
– A morte ocorreu entre as 12 e as 13 horas. O inspector
morreu em consequência de fractura no crânio,
provocada por objecto contundente, possivelmente o
pesa-papéis encontrado junto ao seu corpo (o que se confirmou, depois de
analisados os cabelos e o sangue que o revestiam). Quando recebeu a segunda e
as restantes pancadas, já estava morto». «Joaquim
Lisboa (o vizinho) – Moro aqui há pouco tempo (dois meses) e só conhecia o
senhor José Rocha de vista. Seriam aí umas 12 horas e 50 minutos, estava eu a
almoçar com a minha família, quando, ao levantar a cabeça para a janela da
casa de jantar, vi alguém, que não consegui identificar, porque a sombra das
árvores, defronte à porta, mo impediu, sair correndo, pela porta da entrada desta
casa, sem ter o cuidado de a fechar. A princípio não estranhei aquele
procedimento, mas, como ninguém viesse fechá-la, resolvi investigar o que se passava.
Eis o que encontrei… Chamei-vos, e, enquanto esperava, não deixei que ninguém
cá entrasse. Não toquei em nada». «Nuno
Coelho (um sobrinho) – A essa hora estava eu jogando xadrez, com um amigo,
numa colectividade do meu bairro. Toda a gente que
lá estava o pode confirmar, pois sou por lá bastante conhecido. Não gostava
muito dele, porque, quando das partilhas da herança de um dos nossos
familiares, que era suficientemente vasta para ser repartida por ele, por mim
e pelo meu primo, quem ficou com ela na totalidade foi ele. Não julguem,
porém, que isso seria suficiente para me levar a matá-lo!». «José
Diniz (outro sobrinho, primo do anterior) – Como meu primo, também eu não
simpatizava muito com o velho, o que não quer dizer que o tivesse
assassinado. Das 12 às 13 horas e 30 minutos estive sempre na companhia do
meu amigo Abdul Mohamed, comerciante marroquino que, sempre que vem a
Portugal, me visita. É um grande amigo!.. Mas há uma coisa que me desagrada
nele: mete demasiadamente a religião na sua vida; tudo o que faz tem de ser
de acordo com a doutrina de Alá e de Maomé. Mas como ia dizendo, encontrei-me
com ele em frente à Embaixada do Egipto, onde ele fora tratar de uns
negócios, de onde fomos até à Amadora, ao restaurante «O Chafariz», onde
almoçamos. Lembro-me até perfeitamente do que comemos: eu escolhi carneiro estufado,
e ele pediu uma costeleta de porco. Quando me avisaram da morte do meu tio,
vim imediatamente. O meu primo Nuno Coelho («Lampion Rouge», como toda a família lhe chama) já
referiu que, tanto eu como ele, tivemos uns desentendimentos com o velho por
causa de um testamento, não foi?». 1
– Quem lhe parece ter sido o criminoso? 2
– Porque o afirma? |
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© DANIEL FALCÃO |
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