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22 de Março de 1957. É
publicado, na revista “Flama”, o 1º número da Secção “O Gosto do Mistério…”,
orientada por Jartur – curiosamente, por lapso
tipográfico, identificado como “Mr. Dartur”. Domingos Cabral, com 15 anos completados
recentemente, responde ao problema naquela inserido
– “O Táxi Misterioso”, transformando, assim, em “casamento” o “namoro” que à
modalidade vinha fazendo há algum tempo, através do contacto com a Secção do
“Mundo de Aventuras”, de que era leitor há alguns anos. Sabendo, por isso, que era habitual o uso de
pseudónimo, e perante a dificuldade que sentiu na escolha, rápida, de um,
acabou, por associação, por perfilhar o “Inspector
Aranha”. É que, naquele problema, o investigador (Marcos Dias), concebido
pelo Autor (Jartur), após resolver o caso,
dirige-se para o “Clube do Aranhiço”. Escolha pouco feliz, de facto, já que
ninguém inicia a construção de um edifício pelo telhado e o principiante
começava, nada modestamente, por se designar “Inspector”…
De qualquer forma, iniciou-se, assim, um longo caminho… In Mundo dos
Passatempos, 1 de Setembro de 2007 Correio Policial, 9 de Outubro de 2020 |
PRIMÓRDIOS DA PROBLEMÍSTICA
POLICIÁRIA PORTUGUESA por DOMINGOS CABRAL (do livro com o mesmo título, a
editar) 4 CICLO “REINALDO
FERREIRA – REPÓRTER X” CONCURSO DOS CONTOS
MISTERIOSOS Em
1927, com a publicação, no jornal “Primeiro de Janeiro”, dos denominados
“Contos Misteriosos” da autoria de Reinaldo Ferreira (“Repórter X”),
iniciou-se a que hoje é conhecida como “problemística
policiária” – contos (50) que integrarão o livro “Primórdios da Problemística Policiária Portuguesa”, a editar
brevemente, e que decidimos também nesta “Página” reproduzir num ciclo
dedicado àquele tão versátil jornalista/escritor/cineasta, que à época
disfrutou de uma enormíssima popularidade. Tendo
na pretérita semana inserido o primeiro desses Contos, damos hoje sequência à
série reproduzindo o que “O Janeiro” divulgou no dia 02-02-1927: *** “Teve ontem um belo êxito o conto policial do
nosso concurso. “O Primeiro de Janeiro” pode orgulhar-se de que foi o assunto
monopolizador do espírito de todos leitores. “As rãs adestradas de Lidia Tadini” foi lida e
relida; e à volta do seu enigma levantou-se uma verdadeira celeuma. Quem
seria o matador das três rãs adestradas? Uns, os mais atentos à leitura, não
tiveram dúvidas em indicar o autor da proeza. Outros hesitaram, enganados por
falsas pistas. E contudo não é difícil… O autor da façanha está no conto; êle atravessa o episódio; é o único que tem verdadeiro
interesse em terminar com o número sensacional do Teatro Apolo… (…) Não
acusem nenhum dos personagens do conto sem vêr se
esse personagem teria verdadeiro interesse em matar as rãs do music-hall…” *** “Hoje
publicamos o segundo conto do Concurso – “Os três capitães” – emocionante
aventura d’espionagem, durante a nossa intervenção na grande guerra. Para o
decifrar façam como no anterior; leiam com especial atenção as frases
sublinhadas.” *** Nº 2 “OS TRÊS CAPITÃES” O
capitão A…, que coleciona sobre o peito da farda as suas gloriosas
condecorações da Grande Guerra – emprestou um livro de capa berrante e título
sugestivo: “Os Mistérios da Espionagem”. –
Leia que é interessante – disse-me. Tem só uma falsidade: é o capítulo que se
refere ao fuzilamento dum oficial portuguez. Se
outra glória não nos trouxesse Flandres – ninguém nos pode regatear esta: a de não termos sofrido a vergonha de um
traidor. Só uma vez adensou no meu espírito uma grave suspeita – e era
falsa. Quer ouvir? E o capitão A… contou-nos o seguinte
episódio: –
Eramos três oficiais que nem de vista nos conhecíamos e que em França nos
juntávamos sob o mesmo telhado, nos dias de repouso: o capitão José T…, o
capitão Raul T… e eu. Alugámos uma casita a dois quilómetros da aldeia, na
margem duma estrada longa e triste. O meu impedido Manuel, e Mariana – uma
holandesa de olhos de gato, que nos servia de cozinheira e por quem José
estava enamorado – completavam a improvisada família. “Nos primeiros
tempos fomos desagradavelmente surpreendidos com as visitas frequentes de um
misterioso ladrão que, aproveitando o nosso sono, se introduzia em casa e nos
fazia enormes estragos na dispensa. As portas fechavam mal e as janelas não
eram de confiança. Mas uns cadeados bastaram para nos libertar do gatuno –
fruto natural da miséria que reinava na aldeia. “Os
nossos serões eram animados, ao princípio, pela cantoria dum gramofone. Mas a
pobreza dos discos cansou-nos rapidamente – e a máquina falante foi
arrecadada nas águas furtadas. O capitão Raul, muito lido em teosofia, propôs
para nos entretermos, pôr em prática algumas experiências de espiritismo; e
apesar dos protestos do capitão José, que era muito impressionável, começamos
a passar as noites no meu quarto, à volta de uma mesa de pé de galo, sem
resultados positivos. Duas semanas antes do 9 de Abril, o automóvel do
coronel inglêz Donnald
veio buscar-me. Chefiava eu então os serviços do correio secreto. Ao
quartel-general entregaram algumas ordens escritas para eu cumprir no dia
seguinte. “De
regresso a casa, guardei as cartas num pequeno armário. Os meus dois
camaradas aguardavam-me com impaciência. O capitão Raul ia experimentar um
novo sistema… de telefonia extra terrestre. Sentamo-nos os três no meu
quarto, diminuímos a luz e espalmando as mãos sobre a mesa, iniciamos a
sessão… “Segundos
depois ouvimos uma voz efeminada, uma voz que se assemelhava a um estertor,
uma voz quasi não humana… Um frio horrível nos
gelou os dorsos… Seria possível que as almas dos mortos chegassem a comunicar
connosco? E Raul, muito calmo e sorridente quis dirigir uma pergunta ao
espírito. Mas o espírito explicava-se bem: –
Um crime se cometeu nesta casa e ficou impune! Esta casa é maldita! Foi nesta
casa que me assassinaram há trinta anos! Se querem ter a prova vão à cozinha,
tirem os tijolos e encontrarão um esqueleto… Raul
pedia mais detalhes… Pedia nomes… E o espírito, indiferente, repetia a mesma
lenga lenga. O impedido e Maria entraram,
assustados, no compartimento, atraídos pela voz do outro mundo.
Suplicamos-lhes silêncio. Durante cinco minutos a mesma voz insistiu nas
mesmas acusações. Depois calou-se… Não houve forma de a fazer falar de novo. José
estava ansioso para sair dali. Parecia asfixiado. – Vamos à cozinha… Vamos… Encolhi
os ombros, incrédulo. Mas Raul fez coro com o tenente – e lá fomos todos à
busca do esqueleto. Não era trabalho fácil… Foi necessário quebrar os
tijolos… José saiu para ir às águas-furtadas buscar um velho machado: Mariana
foi ao quintal procurar uma pá para tirarmos a terra que servia de leito aos
tijolos. Raul e o impedido encarregaram-se de reunir na cozinha todos os
candeeiros da casa. Eu fiquei sósinho, durante
alguns minutos. Depois recomeçamos todos juntos o trabalho. Mas foi inútil. O
esqueleto não aparecia. –
O espírito estava a mangar connosco – e eu tenho que levantar-me cedo –
disse, ao voltarmos ao meu quarto. Por
uma sucessão de ideias olhei para o armário onde guardava as cartas do
coronel inglez… Calcule V. Como fiquei ao vê-lo
arrombado. Soltei um grito de pânico. –
Fomos burlados! – disse. E
compreendi logo que o espírito fôra apenas um
pretexto para me afastar do quarto. Eu fôra vítima
de uma proeza de espionagem. Passei revista aos feixos
e cadeados que asseguram as portas e janelas. Estavam
todos intactos. Portanto o espia encontrava-se dentro da casa. Passei uma
minuciosa revista a todos os compartimentos. Ninguém… Mas espere… Essa
revista não foi totalmente vã: atraz de um biombo
encontrei o gramofone – o nosso antigo divertimento, há muito abandonado numa
mansarda. Quem o trouxera para ali? E como visse que tinha um disco colocado,
fi-lo funcionar. E o disco repetiu o que horas antes nos dissera o espírito –
“Um crime se cometeu nesta casa! Esta casa é maldita, etc”… “Estava
provado, pois, que a alma do outro mundo era o gramofone; que o gramofone me
fizera sair do meu quarto à busca dum esqueleto; que o ladrão do documento
não saíra da casa… “No
dia seguinte fui comunicar aquela catástrofe ao coronel inglez
que não lhe deu grande importância nem me incomodou… Mas a minha desconfiança
tornara-se tão pesada no fundo de todos os meus pensamentos que quarenta e
oito horas depois abandonava a casa e a companhia dos meus camaradas – e ia
instalar-me, sósinho, numa hospedaria da aldeia. *** Calou-se
o capitão A… – e eu inquiri, curioso: –
E chegou a saber quem tinha sido o ladrão das cartas? –
Sim… mas mais tarde, já nas vésperas do regresso a Portugal. E ninguém mo
denunciou. Uma noite entretive-me a relembrar, em todos os detalhes, aquele
episódio, raciocinei, conduzido pela recordação da voz que impressionára o disco do gramofone – e cheguei ao
convencimento que o ladrão das cartas era… De quem era
aquela voz que impressionára o disco do gramofone? Quem
podia praticar a espionagem em casa do capitão A? Quem
foi o ladrão das cartas? *** Raciocinem;
procurem o espia entre os personagens do conto; releiam o que está em
itálico. *** NOTAS: 1
– Já transmitimos esta informação, mas será conveniente voltar a fazê-lo: Nos
“Contos Misteriosos” que estamos a reproduzir é respeitada a ortografia em
vigor à data de sua publicação original – 1927. 2
– O “Janeiro” recebia e classificava as respostas dos leitores concorrentes
aos “Contos”, mas não publicava as soluções dos mesmos. Assim, para não
frustrar a curiosidade dos que nos acompanham, elaborámo-las nós – embora de
uma forma muito abreviada. Assim, aqui fica a respeitante ao enigma divulgado
na passada semana: “As rãs adestradas de Lidia Tadini”: Quem
matou as rãs foi Morano, o empresário do vizinho Novelty – o
único dos suspeitos que de tal ato beneficiava. Lidia,
o seu marido, o seu empresário e o proprietário do teatro rival – O Apolo – todos perdiam nitidamente
com o seu desaparecimento. Repare-se
nos seus desabafos – apresentados no texto em itálico: “Ele só ganha dinheiro quando eu quero” e “o meu vizinho tem a mania
de me prejudicar”. E
como o fez? Obviamente, através do “pateo do seu teatro
(...) que abre uma janela para o palco dele”…
Fontes: Secção
Correio Policial, 9 de Outubro de 2020 | Domingos Cabral Blogue Repórter de Ocasião, 31 de
Janeiro de 2024 | Luís Rodrigues |
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© DANIEL FALCÃO |
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