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22 de Março de 1957. É
publicado, na revista “Flama”, o 1º número da Secção “O Gosto do Mistério…”,
orientada por Jartur – curiosamente, por lapso
tipográfico, identificado como “Mr. Dartur”. Domingos Cabral, com 15 anos completados
recentemente, responde ao problema naquela inserido
– “O Táxi Misterioso”, transformando, assim, em “casamento” o “namoro” que à
modalidade vinha fazendo há algum tempo, através do contacto com a Secção do
“Mundo de Aventuras”, de que era leitor há alguns anos. Sabendo, por isso, que era habitual o uso de
pseudónimo, e perante a dificuldade que sentiu na escolha, rápida, de um,
acabou, por associação, por perfilhar o “Inspector
Aranha”. É que, naquele problema, o investigador (Marcos Dias), concebido
pelo Autor (Jartur), após resolver o caso, dirige–se para o “Clube do Aranhiço”. Escolha pouco feliz,
de facto, já que ninguém inicia a construção de um edifício pelo telhado e o
principiante começava, nada modestamente, por se designar “Inspector”… De qualquer forma, iniciou–se,
assim, um longo caminho… In Mundo dos
Passatempos, 1 de Setembro de 2007 Correio Policial, 20 de Agosto de 2021 |
PRIMÓRDIOS DA PROBLEMÍSTICA
POLICIÁRIA PORTUGUESA por DOMINGOS CABRAL (do livro com o mesmo título, a
editar) 50 2º PARTE – CICLO L. FIGUEIREDO SECÇÃO “O LEITOR É
SHERLOCK HOLMES?” 5º PROBLEMA: AS
JOIAS DA BARONEZA O número do “Diário de Notícias” de 5.ª feira, 8
de Agosto, publicou as primeiras notícias de um importante roubo de joias, no
palacete da Baroneza da Alameda, nos Olivais. Havia 4 anos, desde que enviuvara, que a Baroneza se retirara da sociedade. Na madrugada deste dia
foi encontrada, sólida mas delicadamente amordaçada e amarrada no leito,
tendo assistido assim ao roubo das suas joias avaliadas em 250 contos, que
estavam guardadas no cofre embutido na parede no escritório da parte de traz
do edifício, contíguo ao quarto de cama e que ligava ao 2.º andar da sua
residência. O gatuno, aproveitara-se da ausência
acidental da dama de companhia da Baroneza que
dormia no quarto ao lado. O cofre foi violado com “pé-de-cabra” à vista da
sua proprietária e rapidamente esvaziado, por um homem alto, largo de ombros
e de maneiras distintas que a polícia facilmente identificou como sendo o
tristemente célebre “Morgado da Havaneza” (o Arséne Lupin português), gatuno
de cofres que contava já tantos anos de prisão quantos anos frequentara na
Universidade um curso superior. A polícia inclinava-se, porém, a acreditar que o
gatuno devia ter sido informado, se não auxiliado, por alguém da casa. Em
oposição a esta hipótese estava a Baroneza, que
afiançava a honestidade do pessoal, não querendo admitir que velhos servos
fossem cúmplices no roubo. Nos interrogatórios a que os submeteram, todos
protestaram a sua inocência e desconhecimento do caso. No dia seguinte apresentou-se à polícia um caixeiro
de praça que residia em Sacavém para prestar as seguintes declarações: “Pouco depois da meia-noite, passei pela estrada
que confina o palacete da Baroneza, levando a
bicicleta à mão, por se ter avariado. Entre o arvoredo fronteiro vi um
luxuoso automóvel Fiat sem ninguém que me deu a impressão de ter sido ali
cuidadosamente escondido. Vinte metros adiante, pareceu-se divisar um vulto
que saltava o muro da propriedade. Ignorava então quem fosse o dono do
palacete. Encostei a bicicleta à valeta e trepei
rapidamente a uma árvore. O luar permitiu-me ver que um homem caminhava
furtivamente de um massiço de verdura para outro na
direcção da casa. Era alto e vi distintamente que
levava na mão um objecto que se ma afigurou ser um
“casse-téte”. Enquanto estava oculto por um caramanchão brilhou
no telhado do prédio a luz de uma lanterna eléctrica
descrevendo um movimento semicircular, logo seguido por dois idênticos. O
nosso homem atravessou então o pateo com passo
firme, contornando a seguir a casa por um dos lados. Não pensei que se
tratasse de crime e admiti a hipótese de ser entrevista amorosa, rapto ou
coisa parecida, confirmando a minha suposição a nitidez dos sinais que vira. Agora que li o relato do “Diário de Notícias”
acompanhado pela gravura do palacete, lamento não ter prestado mais atenção
ao assunto e recolher tão depressa a casa”.
Chegou, porém, à polícia uma vaga denúncia
anónima de que o criado Macário, tinha relações com
o “Morgado da Havaneza”. Nesta ocasião, chamados a intervir na diligência,
conseguimos namoriscar uma das criadas, sem que suspeitasse a nossa qualidade
de “detective” e por ela soubemos que o “Macário”
na 3.ª feira anterior ao roubo enviara para Lisboa uma carta pelo “chauffeur”, aproveitando a sua ida habitual à cidade. Interrogado o “chauffeur”
confirmou que fôra portador da carta mas que ela
não tinha a ver com o roubo, porque sabia que era um anúncio para o “Diário
de Notícias” e o dinheiro para o pagar que vinha fechado num subscrito e que
o entregara num “guichet” da administração do diário. E acrescentou que o
Macário lhe pedira para o entregar imediatamente, porque se tratava de
incumbência de um amigo e que se esquecera de satisfazer há dias. Afirmava
que a letra do envelope não era parecida com a do Macário e admitia a
possibilidade de estarem todos doidos, por pensarem que houvesse relação
entre o roubo e a remessa da carta. Não se cansava de repetir que fossem ver
ao “Diário de Notícias” se não era verdade o que afirmava. Levámos efectivamente o
“chauffeur” à administração do jornal, mas os
empregados nada adiantaram às nossas suposições por ser enorme o movimento de
anúncios e não saberem qual fôra entregue por ele. Não desanimámos, porém.
Procurámos nas colunas do jornal do dia do roubo e encontrámos 6 anúncios que
pela sua redacção achámos suspeitos de ocultarem
qualquer mistério. O leitor que examine e deduza para ver se
consegue responder às seguintes perguntas: 1ª – Foi ou não o criado Macário cúmplice do
“Morgado da Havaneza"? 2ª – Como teríamos nós "detectives"
conseguido resolver o problema proposto? * * * SOLUÇÃO DO
PROBLEMA: 1º – O criado Macário foi cúmplice do “Morgado da
Havaneza” no roubo das joias. 2º – Dos anúncios que publicámos e que tinham
sido publicados no “Diário de Notícias”, concluímos que a comunicação do
criado estava incluída no que tinha por título “Trespasse”. Aproveitando as palavras que figuram neste
anúncio em 1°, 7°, 13°, 19°, 25°, 31°, 37°, 43° lugares, isto é, de seis em
seis, encontramos o texto do aviso em cifra. Ligadas aquelas palavras via-se
claramente que continham indicações suficientes para o roubo: “Escritório trazeiras
segundo norte negócio ocasião quarta 12”. “Escritório trazeiras”
designava evidentemente que o cofre onde se encontravam as joias cuja
existência o gatuno conhecia estava nesta divisão da casa e na parede das
traseiras do prédio. “Segundo” significava o andar onde era aquela
divisão e "norte" a orientação a fachada correspondente. “Negócio ocasião” mostrava que era a altura de
praticar o assalto, devido à ausência acidental da dama de companhia. “Quarta” o dia da semana em que o roubo se devia
levar a efeito e “12” a hora propícia. O Macário foi interrogado para explicar a sua
participação no crime e o motivo porque transmitiu
ao cúmplice pelo anúncio as indicações citadas. Disse então que não tencionava ajudar de qualquer
forma na prática do roubo o “Morgado da Havaneza”,
mas que este, tendo conhecimento da existência das joias, tomou sobre si o
encargo do “trabalhinho” impondo-lhe, porém, que o avisasse da ocasião
oportuna e o introduzisse no palacete da Baroneza
depois de lhe fazer os sinais com a lanterna significando que tinha o campo efectivamente livre. O “Morgado de Havaneza”
possuía grande ascendente sobre o Macário que, até travar relações com ele,
no ano anterior, se comportara sempre exemplarmente. O processo de
transmissão pelo anúncio foi empregado para evitar que qualquer
correspondência enviada directamente ao “Morgado da
Havaneza” os pudesse descobrir. * * * Nota: Como já anteriormente tivemos oportunidade de referir, as soluções
oficiais dos problemas de L. Figueiredo, pecam, por vezes, por insuficiente
fundamentação, causando ao leitor/decifrador dificuldades e alguma (justa)
frustração. São disso exemplo os problemas publicados na semana passada e o
de hoje. Vejamos uma situação reportada a este: Se nem do desenho que o problema anexa como
indiciário para a obtenção da resposta pedida, nem o texto daquele enunciam a
composição do anúncio publicado no “Diário de Notícias”, como poderia o
solucionista partir da interpretação de determinadas palavras do mesmo para
chegar à conclusão que o autor nos apresenta na sua solução? Enfim, referimos a situação apenas para os que
não, ou menos, conhecedores da problemística
policiária não considerem que estas “deslealdades” constituem prática comum. D.C.
Fontes: Secção Correio
Policial, 20 de Agosto de 2021 | Domingos Cabral Blogue Repórter de
Ocasião, 31 de Dezembro de 2025 | Luís Rodrigues |
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