Publicação: “O Gosto do Mistério”

Data: 20 de Fevereiro de 1959

 

 

III Torneio Nacional

de Problemística Policiária

 

 

Eliminatória nº 1

 

 Problema nº 1

 

 Problema nº 2

 

Eliminatória nº 2

 

 Problema nº 1

 

 Problema nº 2

 

Fase Final

 

Problema nº 1

 

Problema nº 2

 

Problema nº 3

 

Problema nº 4

 

Problema nº 5

 

Problema nº 6

 

 

 

III TORNEIO NACIONAL DE PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA

 

1ª ELIMINATÓRIA – PROBLEMA Nº 2

 

O MOCHO NÃO PIA MAIS

Autor: Elima

 

Cá fora as folhas bailavam ao sabor da leve brisa, os passarinhos chilreavam saltando de ramo em ramo e os automóveis passavam ruidosamente, anunciando mais um dia de trabalho que há pouco tivera início. Tudo estava alheio a mais um crime, a mais uma vida roubada.

Naquela casa onde tantas vezes o retinir do telefone fora o começo do desvendar dum crime, ali, alguém olhava ironicamente a sua vítima, traduzindo numa frase tudo o que lhe passava pela alma, cheia de maldade, cobardia e ódio.

– O mocho já não pia mais…

Então, com um sorriso sarcástico a dançar-lhe à flor dos lábios, dirigiu-se a uma pequena mesa, junto à janela, e tirando uma folha dum bloco de correspondência, pegou numa esferográfica e começou a escrever:

 

Chefe

Já cumpri o que me mandou.

Ele já nada poderá fazer nem adiantar sobre o nosso plano.

Sempre ao dispor

 

Após ter assinado, meteu o papel no envelope e guardou-o na carteira. Cá fora continuava a eterna melodia dos passarinhos, e ao longe ouvia-se uma canção que se dissipava no céu azul…

Pela última vez olhou para o corpo inerte e frio do inspector Franco: foi um olhar longo mas cheio de ódio, feliz mas com maldade. E saiu…

Pouco a pouco foi se apagando no espaço o barulho do motor de um carro que saíra debaixo de uma árvore, onde os pardais continuavam a cantar menos alegremente… E nesse carro ia um criminoso.

Com duas lágrimas rebeldes a correrem-lhe pelas faces, o inspector Vítor Santos entrou no quarto do seu ex-colega, que durante tantos anos compartilhara consigo os dissabores da profissão, e tantas vezes trabalhara dia e noite a seu lado.

Agora estava deitado para sempre num «maple», com a navalha enterrada nas costas, à altura do coração.

Nunca mais ressoarão as suas canções alegres; nunca mais se sentará à sua pequena mas elegante secretária; não mais fará experiência naquela mesinha de tampo de lousa encerada, junto à janela, e o cachimbo, agora abandonado no casaco, nunca mais voltará a ser cheio de tabaco.

As recordações felizes e infelizes corriam céleres na memória de Vítor Santos e, passados minutos, um agente trouxe-lhe dois suspeitos, Mário Guedes e Carlos Albuquerque, dois homens cujas prisões já eram sobejamente conhecidas, pois as suas vidas bailavam entre o roubo e o contrabando.

À pergunta: – «Que fizeram nestas últimas horas», o primeiro, com um sorriso sarcástico respondeu:

– Estive até às três horas da manhã a fazer experiências na calcite, tais como fusibilidade, densidade, clivagem, etc. Após dar o trabalho por terminado, fui-me deitar e só me levantei há duas horas… Dirigia-me ao café quando me detiveram…

O segundo, que era um pouco cheio e vestia impecavelmente, disse que: «Chegara no dia anterior duma viagem pela Ilha da Madeira, onde fora ver um irmão e tratar da compra de um hotel». Ia em direcção à praia, quando o detiveram para averiguações.

Após ouvir as declarações e fazer uma rápida investigação, o inspector foi vagarosamente até à janela, e depois duns segundos de meditação, virando-se para o céu exclamou baixinho:

– Obrigado meu Deus, já sei quem matou Franco!

Entretanto os passarinhos voltavam a cantar e a saltitar de ramo para ramo, e o ar a ser interceptado por canções alegres que saiam dos rádios.

A vida continuava…

 

PERGUNTA-SE:

- Concorda com o inspector?

- Porquê? (Exponha o seu raciocínio)

 

© DANIEL FALCÃO