Publicação: “O Gosto do Mistério” Data: 6 de Março de 1959 III Torneio Nacional de Problemística Policiária
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TORNEIO NACIONAL DE PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA 2ª ELIMINATÓRIA – PROBLEMA Nº 1 O FAZENDEIRO DETECTIVE Autor: Lemmy Caution Na tarde
serena, o Sol estava prestes a esconder-se por detrás das montanhas
distantes. O «cow-boy» interrompeu os versos da bela romanza e,
desencostando-se da vedação que demarcava a fazenda, alongou a vista
protegendo os olhos com uma das mãos. Na
imensa pradaria, semeada aqui e ali de cactos e
pequenos arbustos, via-se nitidamente, na direcção
do rio, um vulto caminhando com evidente esforço, quase se arrastando. O
vaqueiro sobressaltado correu para a entrada do rancho, gritando: –
Patrão! Patrão! Vem aí Lopez, o mexicano! Mas Bill
não vem com ele… algo de grave deve ter acontecido… Em breve
os dois chegaram à beira do indivíduo que, sujo de suor e poeira, caiu quase
no mesmo instante, a seus pés. O
fazendeiro reanimou-o com alguns goles de rum e ajudou-o a sentar-se numa
pequena saliência do terreno. – Que
aconteceu?… Que é feito do Bill?... E o gado?... Vamos, conta… depressa!... O
interpelado pareceu acordar de um mau sonho, passando as costas das mãos
pelos olhos e depois pela cara, limpando o suor. Tomando fôlego, começou. – Uma
tragédia, patrão! Tínhamos saído há dois dias de Sheridan-City
e a marcha fazia-se normalmente, embora com as devidas precauções por causa
dos «sioux». A certa altura, porém, sofremos uma emboscada. Eram mais de
quinze e o ataque foi tão pronto, e dado em local tão descoberto que nada
pudemos fazer. Os nossos cavalos tombaram, e nem sei como saímos com vida da
contenda. Percebi logo que a intenção deles era apoderarem-se do gado, mas
compreendi de igual modo que não nos perdoariam por termos violado os seus
territórios de caça. Foi então que o chefe «Olho de Lince» ditou uma ordem,
citando Manitú e não sei quantos espíritos.
Imediatamente Bill foi subjugado por dois «sioux» que lhe prenderam os
braços, expondo-o indefeso, à fúria do comandante. Já este agarrava os
cabelos do infeliz, e se preparava para afundar a sua faca aguçada no crânio
do meu companheiro, para o escalpelar, quando desabou tremendo tiroteio. Uma
caravana de colonos atacava os «sioux», dando-nos a fuga. Aproveitando o
espanto e a desorientação que grassou no grupo, saltámos para cima de um
cavalo e refugiámo-nos num desfiladeiro que surgiu mais além. Era
tempo, pois quase a seguir apareceu novo bando de peles-vermelhas que vieram
em auxílio de seus irmãos de raça, e que em breve decidiram o pleito a seu
favor. Errámos
pelos contrafortes da montanha, esgotados, sedentos e esfomeados, abandonando
à sua sorte o cavalo cujas condições não eram menos desagradáveis. Ao cair da
noite atravessámos um terreno lamacento, que nos trouxe desde logo a
esperança de encontrar qualquer lugar onde matar a sede. Fomos felizes, pois
até uma lebre conseguimos capturar. E como ali existia uma gruta, fizemos lá
uma fogueira para confeccionar uma refeição,
preparando-nos pouco depois para passar a noite. O
mexicano respirou fundo e prosseguiu, não sem antes haver bebido novo gole de
rum: –
Temendo qualquer ataque dos peles-vermelhas ou mesmo das feras que infestam a
região, decidimos descansar, dormindo um, enquanto o outro fazia um período
de sentinela à entrada da gruta. A Bill coube fazer o segundo turno de
vigilância. Acomodei-me o melhor possível no chão duro do antro, e em breve
adormeci, não podendo resistir ao cansaço. – E depois?... – interrompeu o
fazendeiro já enervado por tão extensa narrativa. – Nascia
a manhã, quando de repente ouvi dois tiros. De Bill, nem rastos. Aflito,
procurei-o por toda a parte, e por fim, já desanimado fui encontrá-lo longe
dali, morto, com duas balas no peito. Como um louco atravessei o rio e corri
para aqui, receando a todo o instante ver-me alcançado pelos índios ou por
qualquer alma penada. O
fazendeiro fez uma careta de desespero, mas, recobrando a calma, ordenou ao «cow-boy»: – Traz
cavalos e homens! Vamos buscar o corpo de Bill e saber quem o atacou! Quinhentos
metros além da fazenda, existia um rio que os
cavalos atravessaram sem dificuldade, seguindo o percurso indicado por Lopez. Em breve depararam com o corpo de Bill. Por cima
já esvoaçavam gigantescos abutres, atraídos pelo cheiro do cadáver. O corpo
do vaqueiro estava caído de bruços, no cimo de uma pequena subida, tendo a
mão direita agarrada a um «colt» de seis tiros. A
vítima devia ser uma pessoa de porte distinto, pois embora num meio rude como
aquele, desde o lenço multicor que usava à volta do pescoço até às botas de
salto alto, impecáveis, demonstrava o cuidado que lhe merecia o seu trajar. O
«colt» não tinha balas, e perto do cadáver podia
ver-se um chapéu de abas largas, coçado e amarrotado, bem como pequenos
pingos de sangue, que iam deste até ao corpo. Em seu redor nada mais que
constituísse indício do que se tivesse passado, pois o terreno era árido e
cheio de pequenas pedras que deslizavam sob as patas dos cavalos. A um
sinal do fazendeiro, dois «cow-boys» pegaram no
corpo do infeliz capataz e depuseram-no na garupa do cavalo de um deles,
prosseguindo o pequeno grupo nas suas investigações. Era já
noite, uma noite calma e sem aragem, quando chegaram à gruta, onde, segundo o
relato de Lopez, os dois vaqueiros haviam
pernoitado. O
fazendeiro pegou numa lanterna e entrou no covil. Era uma gruta banal, e ao
primeiro relance nada viu. Baixando-se para procurar melhor qualquer rasto,
pousou a lanterna no chão, mas quase simultaneamente os companheiros viram-no
cambalear, enquanto a luz se apagava como se a tivessem mergulhado em água! Os
vaqueiros, mal refeitos do estranho acontecimento, trouxeram-no para fora e
reanimaram-no. – Então,
senhor Carson? Sente-se indisposto?...
Que lhe aconteceu? – perguntaram os dedicados «cow-boys». – Oh!
Obrigado! Não foi nada… deixem-me, estou cá a pensar numa coisa… Olhando
à sua volta, fitou dum modo especial a entrada da gruta… O caso
estava resolvido, não tinha dúvidas… PERGUNTA-SE: Que
conclusões tira do relatório do mexicano? Ele
falou verdade? |
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©
DANIEL FALCÃO |
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