Data: 12 de Março de 2007 Torneio Sete de Espadas
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TORNEIO SETE DE ESPADAS PROVA Nº 4 TEMPICOS E OS IRMÃOS SHERIF Autor: A. Raposo & Lena Os irmãos Sherif eram
gémeos monozigóticos, iguais como fotocópias, filhos de mãe alemã e de pai
paquistanês. Eram ainda crianças
quando os pais se separaram e se desfez o casamento. Um ficou com o pai e o
outro com a mãe. Cresceram, assim,
em ambientes completamente diferentes de crenças e hábitos. Um foi educado à
maneira europeia e o outro, no Paquistão, à maneira muçulmana. Hermann veio
com a mãe para a Alemanha e Malik ficou com o pai. Quando voltaram a
encontrar-se, já adultos, verificaram que tinham um certo pendor para a
“golpada”, não obstante terem sido educados separadamente. A culpa talvez
fosse dos genes. Pensaram e formaram
uma associação criminosa. Como eram iguais, decidiram ter a mesma identidade,
isto é, serem o mesmo Sherif, Hermann ou Malik, conforme a conveniência do
momento, ou serem duas pessoas diferentes, como de facto eram. Mas tudo
sempre baralhado. Ambos pediram segundas vias dos respectivos passaportes
(alegando extravio ou roubo) que depois trocaram entre si. Cada um passou a
ter duas identidades e dois passaportes com nomes diferentes. Uma espécie de
homens duplicados! Podiam portanto coexistir em termos de identificação
documental os seguintes pares: Hermann/Malik, Malik/Malik, Malik/Hermann e
Hermann/Hermann Deste jeito, era
fácil a um fazer um roubo e ao outro fornecer um álibi! A sociedade,
formada no dealbar do século XXI, foi medrando e ganhando muito dinheiro. As
polícias sabiam que havia ali marosca mas oficialmente nada podiam fazer.
Faltavam as provas. Eles actuavam separados, comunicando-se por telemóvel.
Por vezes, enquanto um actuava, o outro fazia-se deter por um qualquer delito
menor. Passados uns dias o preso pagava a fiança e saía alegremente. Nos assaltos “à
Sherif” notava-se que o ladrão usava luvas e tinha o cuidado de não deixar
qualquer resíduo orgânico, pois nunca se encontrara a mais pequena dedada,
cabelo ou escama de pele que pudesse ser atribuída a um Sherif, salvo dois
casos insólitos que refiro a seguir. Durante a operação do roubo, presume-se
que o mano assaltante se vestia como se estivesse numa sala de operações
cirúrgicas. Estranhamente, apanhou-se de uma vez um alicate e de outra uma
chave de parafusos, as quais, por incrível que pareça, tinham exclusivamente
as impressões digitais do mano encarcerado. Não há muito tempo
– estava eu de serviço na P.J. em Lisboa – calhou-me ir visitar (por mera
curiosidade, pois aquele caso não me pertencia) a cela da Judiciária onde
Malik Sherif se encontrava detido. Tinha ficado preso no dia anterior por uma
questão pouco importante e fora identificado pelo passaporte. E aconteceu o que
alguns adivinhavam, o Malik fez-se prender para o seu mano actuar,
fornecendo-lhe um álibi, pois, naquela mesma noite, uma ourivesaria em
Frankfurt fora assaltada “à Sherif”e aliviada de imensas jóias, conforme
informação posterior da polícia alemã. Um golpe de mestre. Lembro-me bem do
que vi. O preso vestia e
tinha o aspecto de um autêntico paquistanês, com uma belíssima barba a
condizer. No momento em que entrei estava em plena oração, ajoelhado num
tapete de sua propriedade. A cela era pequena,
mas arejada. Naquele fim de tarde, o sol entrava pela janela de grades.
Pensei que a expressão – o sol aos quadradinhos – se adequava muito bem à
cena, pois Sherif, ao elevar-se da prece, e antes de se voltar para mim,
ficou com a quadrícula das grades desenhada na cara. Ele falava
correctamente várias línguas e saudou-me afavelmente: – Alá é grande e
Maomé o seu profeta. Tinha dinheiro e
notei que o guarda lhe facilitara a vida. Naquela tarde de
Agosto o calor forte fizera com que o carcereiro (a troca de algum) lhe
arranjasse uma sandes mista e uma Sagres. Sabiam melhor que o rancho do
refeitório da polícia. Um livro que devia ser o Corão também lhe fazia
companhia. À saída troquei com
o guarda breves impressões sobre o comportamento do preso. Disse-me que era
muito educado e cumpridor escrupuloso dos preceitos da sua religião. – Um verdadeiro
crente – acrescentei eu antes de me despedir. Saí a pensar que um
dos irmãos estivera a trabalhar e o outro a “construir” o respectivo álibi na
prisão, para ser mais convincente. Porém, já estava certo sobre qual dos dois
tinha pernoitado na PJ. E por exclusão, quem fizera o roubo na Alemanha. Julgo que os meus amigos
também irão descobrir quem fez uma coisa e a outra e por que razões os dois
manos actuavam como indiquei atrás. |
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©
DANIEL FALCÃO |
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