Autor

Búfalos Associados

 

Data

9 de Setembro de 2021

 

Secção

Policiário [88]

 

Competição

Torneio do Centenário do Sete de Espadas

Prova nº 6 – B

 

Publicação

Sábado [906]

 

 

HISTÓRIAS DO DIA DE REIS

Búfalos Associados

 

Era uma vez um pequeno circo de província chamado circo de Los Reyes. Era prática corrente, durante o século XX, agrupamentos de artistas de circo percorrerem as terras do nosso país levando a nobre arte circense, quer aos públicos mais exigentes, quer às populações mais humildes.

A história que vamos contar teve por palco um desses circos ambulantes, fundado em Espanha pela família Reyes e que, na época, pertencia a um casal de trapezistas, Los Reyes, nessa altura os únicos herdeiros dos fundadores.

Quis a sorte que o casal Reyes viesse a ser presenteado com o nascimento de um par de gémeos do sexo masculino e que, por uma feliz coincidência, nasceram em pleno Dia de Reis, a 6 de janeiro de 1968. O facto foi amplamente festejado, e o Circo de Los Reyes viu assim aumentado o seu elenco com o aparecimento de mais dois Reyes, continuadores da companhia.

Em honra dos Reis Magos, as duas crianças foram batizadas com os nomes de Gaspar e Baltazar, com muita pena de não serem três para poder dar ao terceiro o nome de Melchior. Claro que o casal continuou a tentar o terceiro rebento, e dois anos depois nasceu uma menina que foi batizada de Paloma, nome de uma das avós que fora bailaria na Zarzuela.

Os anos foram passando, os pais faleceram, a empresa continuou e os dois gémeos, que eram fisicamente iguais como duas gotas de água, vieram a formar um número de dois mágicos orientais abrilhantado pela irmã e tendo, como convinha, o nome de Los Reyes Magos y su danzarina frívola. Eles apareciam rigorosamente vestidos como os Reis Magos do presépio e ela dançava sedutoramente vestida (mas pouco…) de Sherazade. Com o decorrer do tempo, aquele número de prestidigitação e dança tomou-se no êxito maior da companhia. Os números de magia eram insuperáveis, mas o único que podia falar em público era o Gaspar, porque o outro irmão era muito gago. Paloma, claro, era a coqueluche do público masculino.

A companhia chegou a ser muito popular em Portugal e as receitas de bilheteira iam sempre crescendo. Quem estava na bilheteira a vender os bilhetes era o senhor Cruz, que tinha sido o mágico destronado pelos gémeos Reyes, quando usava o nome de cartaz de Zurk. As exibições eram sempre aos fins de semana e, no fim de cada espetáculo, Zurk entregava sempre a receita da bilheteira a um dos gémeos, o qual por sua vez ia depositar o dinheiro nas mãos da Paloma que o guardava logo num cofre de que só os três irmãos tinham a chave e o segredo. Estava assente que aos sábados quem recolhia o dinheiro era o Baltazar, e nos domingos o Gaspar. Mas às vezes trocavam, ou então um juntava os dois dias.

O que é certo é que não há bem que sempre dure. O êxito às vezes transforma as pessoas. Aos poucos, as relações entre os irmãos foram azedando e a certa altura todos tinham desconfianças uns dos outros. Até os gémeos, que normalmente são muito unidos para toda a vida, já se davam mal e cada um só pensava em si próprio. Quanto a Paloma, andava a juntar dinheiro para ir estudar teatro para Londres. E Zurk nunca mais perdoou o facto de ter ficado a ganhar muito menos ao ser substituído enquanto artista.

Num ano em que o Dia de Reis calhou num domingo e os dois gémeos festejavam os 40 anos, houve festa rija no final do espetáculo, comeu-se e bebeu-se ainda melhor e, a certa altura, já ninguém sabia muito bem o que fazia. Seriam umas 5h da manhã quando, sob os efeitos do álcool ingerido e no meio da vozearia geral, porque deu a todos para falar alto e com fartura, Paloma lembrou-se de que ninguém ainda lhe tinha entregado as receitas desse fim de semana. Os gémeos, a cair de bêbados, um dizia que lhe parecia que tinha entregado a Paloma o dinheiro dos dois dias, e o outro achava que tinha sido ele mesmo a fazer essa entrega. Mas mostravam-se ambos muito baralhados. Os três irmãos foram confirmar no cofre, e o dinheiro do fim de semana, uma verba de largos milhares de euros, não estava lá. Zurk afirmava ter entregado a massa das duas receitas, já a festa ia rija, mas não conseguia dizer a qual dos gémeos, pois já tinha bebido uns bons copos e não podia afirmar a qual dos dois tinha sido, de tal modo eles eram iguais.

A verdade é que ninguém sabia do dinheiro e, como ainda era uma verba importante, de manhã foi decidido chamar a polícia para investigar o caso. Um inspetor falou com os quatro envolvidos. Zurk declarou estar certo de que tinha entregado o dinheiro dos dois dias, mas sem saber a qual dos gémeos. Perguntado sobre como teria sido a conversa, disse que não tinham falado, lembrava-se bem de que nem sequer tinham trocado uma palavra. Os gémeos afirmaram cada um estar convencido de ter recebido o dinheiro e tê-lo entregado a Paloma mas, como na altura estavam muito bêbados, não podiam garantir se não estariam a confundir com o fim de semana anterior. Paloma jurou que ninguém lhe tinha entregado nada e, na verdade, o dinheiro não estava no cofre.

O inspetor preparava-se para mandar revistar os camarins, mas já tinha uma suspeita de quem podia ter sido o ladrão. E nós, sabendo o que sabemos, podemos desconfiar de…?

 

A) – Baltazar

B) – Gaspar

C) – Paloma

D) – Zurk

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO