Autor Data Setembro de 1978 Secção Enigma Policiário [30] Publicação Passatempo [52] |
CONFORME A SEMENTEIRA Constantino Fechou, com
uma só pancada, a porta do Ford. Consultou o
relógio: 18 horas. Dirigiu-se em
largos passos para a entrada do hotel junto do qual estacionara. Corrigiu o nó
da gravata no espelho vertical da entrada, sorriu satisfeito à figura alta,
de elegante fato castanho, reflectida. Sem se dignar
olhar o atarefado homenzinho da recepção, meteu-se
no elevador que o levou ao 5º andar. Sem paragem percorreu o largo corredor
deserto, bateu discretamente com os nós dos dedos no nº 669, quase ao fundo
do corredor. A porta abriu-se lentamente à pressão dos dedos… Sem tempo para
identificar algo caído no meio do quarto, foi derrubado… Quando acordou
do breve delíquio, um polícia fardado solicitado pelo gerente encarregava-se
de lhe fazer recuperar a razão com pequenas palmadas no rosto. A figura alta,
de elegante fato castanho, que estava a seu lado, com o dedo apontado como
letal arma acusava-o sem rebuço: – Este
indivíduo tem-me seguido desde que cheguei à cidade. Ontem saí por momentos
para pedir uma lâmina no nº 271, deixei a porta encostada e quando voltei
tinha-me sido levada a pasta onde usualmente transporto as jóias para visitar os clientes… Felizmente que continha
apenas estojos vazios! Hoje olhava distraidamente a rua, quando o reconheci
no carro parado à esquina. Desci e saí ostensivamente do hotel de modo a ser
visto por ele, fui entrar pela porta das traseiras e esperá-lo aqui. Não tive
dúvidas que era o ladrão e só aguardava a oportunidade de voltar… O homem caído
quase saltou: – Mentira,
mentira, nunca o vi mais gordo, eu… este… quarto é meu… – Alto!
Deixem-me pensar! Interrompeu decididamente a autoridade. Encetou um
ligeiro passeio entre a janela e a porta, relutante em pedir auxílio
superior. Era a oportunidade de mostrar valor. Aquele era o seu «caso»… não podia errar, já que o destino lho trouxera em
ventos brandos… Num golpe de
inspiração pediu ao gerente o registo de hóspedes. No quarto nº 669 «Senhor
Silva». Por palpite consultou o nº 666; e lá estava «Senhor Silva». Deixou
cair o queixo, incrédulo. Inconscientemente, meio apático, chegou-se à janela
e espreitou a rua. Um casal de jovens dirigia-se à porta do hotel. «Noivos» –
pensou. A máquina
cerebral movia-se-lhe em acelerado. Voltou-se repentinamente e ordenou: – Vamos
ver os vossos Bilhetes de Identidade! – «Ernesto
Silva»! – «António
Silva»! Estarrecido
olhava os pequenos rectângulos. Ainda estava
na mesma posição quando o recepcionista, que
mandara chamar, se apresentou. Interrogado
qual o «Senhor Silva» do 669, qual o do 666, o homem mostrou-se desalentado,
olhando incredível: não sabia dar resposta! O polícia ia
perdendo o fulgor inicial. Um grande desânimo estava pronto a apoderar-se-lhe
do espírito. Extractos do «Manual» salpicavam-lhe a
memória: – «Para uma boa investigação é indispensável
seguir uma adequada observação» – «Não ceder a inspiração momentânea ou
relance casual» – «Observar e perceber pessoas, lugares,
coisas e incidentes como realidades que são» – «É importante saber distinguir entre
declarações deliberadamente falseadas e o erro ou equívoco sem intenção» – «Quando o delinquente começa a falar é
provável que diga o que antecipadamente prepara ou tente justificar-se,
acabando por trair-se» Como atacar o
problema? Encolheu os
ombros, puxou da caneta e iniciou o relatório. Subitamente estacou. Olhou sorridente
para cada um dos homens e atirou maviosamente: – Neste mundo
recolhe-se aquilo que se semeia… Um de vocês vai comigo; tem muito que
explicar! PERGUNTA-SE: 1º – Qual, no seu entender, aquele que o polícia
levou? Porquê? 2º – Resuma, com as necessárias justificações, o
caso! |
|
© DANIEL FALCÃO |
||
|
|