Autor Data 5 de Novembro de 2020 Secção Policiário [44] Competição Torneio Sábado Policiário 2020 Prova nº 10 – Parte I Publicação Sábado [862] |
O INSPETOR FIDALGO E O CRIME EM DIRETO Inspetor Fidalgo Jorge
Figger é um dos rostos mais conhecidos nos mundos
complexos da Finança e do chamado jet
set. Rico
até mais não, acumula a particularidade de ter
passado por um processo educacional de excelência, nos melhores colégios ao
nível mundial, sendo apontado como um dos maiores exemplos de cumprimento das
regras da boa educação e dos protocolos, mesmo os mais rigorosos. De uma
simpatia a toda a prova, não lhe é conhecido um único deslize, quer no
relacionamento com outros vultos da chamada aristocracia, quer nas relações
com empregados ou com o mais comum dos mortais. Por
outro lado, a sua assumida paixão pela asa-delta, de que é exímio praticante,
fá-lo acumular uma enorme quantidade de aparelhos e equipamentos, que agora
estão em exposição pública num armazém da cidade do Porto, o que aumenta a
sua popularidade junto da malta mais radical. Jorge partiu para os Açores. Resolveu sair
pela primeira vez após um acidente relativamente grave, sofrido no dia da
inauguração da exposição e que o retirou da circulação durante cerca de um
mês, tempo em que não saiu da sua mansão, algures para Cascais. Foi ao
encontro da sua namorada, uma açoriana da Horta a quem ia fazer uma surpresa.
Mandou a tripulação preparar o seu jato particular, acabado de regressar de
uma rigorosa inspeção. Infelizmente
para Jorge, uma violenta tempestade nos céus desviou o voo para a ilha do
Pico, sendo todo o tráfego proibido, logo a seguir… Na
cidade da Horta, a escassos quilómetros dali, sem nada saber da tentativa de
surpresa, Maria da Graça estava em casa, sentada ao computador, em cavaqueira
informática com amigos. Passava
um pouco das 20 horas e o Inspetor Fidalgo estava sentado num banco corrido,
olhando para o monitor de um computador portátil que emitia imagens obtidas
por uma câmara Web, numa gravação iniciada às 10h15. Via-se uma moça bonita,
sentada em frente de um computador, que dedilhava com destreza. De vez em
quando erguia o rosto que ficava no enfiamento da câmara, revelando toda a
sua beleza. Subitamente,
ergueu-se e saiu do campo de visão, regressando pouco depois, enquanto um
vulto alto, cerca de 1 metro e 90, envergando uma espécie de fato-macaco de
cor avermelhada, apareceu na imagem, de costas, rumando ao fundo da sala,
onde era visível uma porta que, uma vez aberta, revelou ser uma casa de
banho. O vulto levantou a tampa da sanita e, sempre de costas para a porta,
demorou algum tempo a urinar. Depois, vê-se a acionar o autoclismo e a
virar-se para o seu lado direito, debruçando-se ligeiramente sobre um
lavatório onde lavou as mãos, esfregando-as de seguida contra o fato, para as
enxugar, antes de avançar em direção à moça que continuou a dedilhar o
teclado até se abater sobre ela um objeto parecido com um pé de cabra e ela
desaparecer do ecrã. Uma segunda arremetida do objeto, desta feita sobre o
computador, fez terminar a transmissão. –
De onde apareceu isto? –
Foi aquele moço, ali ao fundo. Estava a comunicar com a rapariga, que estava
nos Açores, na Horta, quando gravou estas imagens… Até a rádio já fala disso,
parece que mete um tipo da “alta”, tudo se encaixa como uma luva! –
Foi o senhor que registou estas imagens, não é verdade? –
Sim, senhor. –
Porque não veio logo? –
Senhor inspetor, só há pouco vi as imagens. Estava a comunicar com a Graça,
mas tive de me ausentar, fui à casa de banho e depois aproveitei para ir
comer alguma coisa. Quando cheguei, já não havia imagem, julguei que ela se
tivesse ido embora e não pensei mais nisso. Ao ouvir nas notícias da rádio
que se tratava da namorada de um conhecido multimilionário, percebi que era
ela e fui ao computador recuperar a gravação que costumo fazer sempre que me
afasto do computador. E vi isto. –
Deixe ver se percebi. O senhor grava as imagens quando tem que se afastar,
mas não grava quando está lá, é isso? –
Sim, senhor inspetor. –
E som, não tem? –
Não, só texto e imagem. –
E não teve curiosidade em ir ver se ela tinha mesmo ido embora da
comunicação? –
Não, senhor inspetor, é usual que as comunicações
vão abaixo quando há temporais lá. E a Graça referiu que havia forte
temporal. Não estranhei nada. –
Conheceu-a onde? –
Foi minha colega na faculdade e, quando regressou a casa, ficámos amigos e
vemo-nos na Net. A
meia-noite aproximava-se… –
Fui no meu avião aos Açores e tivemos que aterrar no Pico, com muito mau
tempo. Ainda no aeroporto tentei ligar à Graça, mas ninguém me atendeu. Ela
não deixa o telemóvel gravar mensagens. Depois, consegui alugar lá um carro e
fui dar uma volta, passar o tempo, ver se melhoravam as condições para o voo.
Antes, telefonei a um amigo da Horta, o Vasco, com quem tinha combinado fazer
esta surpresa à Graça e ele atendeu-me. Mostrou-se muito dececionado e
pareceu-me nervoso, mas ouviam-se os trovões em fundo e a tempestade estava
terrível. Talvez fosse por isso… Depois, a tempestade abrandou bastante mas
só me deixaram rumar a Lisboa. Não consegui nenhum contacto com a Graça e só soube
da notícia pela rádio. Estou arrasado! –
Esse seu amigo… –
O Vasco! É o meu melhor amigo. Foi através dele que conheci a Graça, que era
sua vizinha. É um amante da asa-delta, tal como eu e esteve muitas vezes
comigo em competições e eventos. A última vez que o vi foi na inauguração da
exposição de todos os meus aparelhos, no Porto, quando tive o acidente. –
Já viu as imagens que temos? –
Sim, estou profundamente chocado… –
Vimos fotos suas, em competição, e estava com aquele fato. Exatamente aquele! –
Aquele é o meu fato? Não pode ser, esse está na exposição do Porto, ou pelo
menos devia estar! –
E dos Açores chegou-nos a informação de que uma das suas asas-deltas foi
encontrada escondida a cerca de 100 metros da casa da sua namorada… –
Não é possível! Peço-lhe imensa desculpa, mas isso é impossível! Todo o
material está exposto! –
Pois o seu capacete e o fato estão lá, na Horta, também! –
… –
O seu amigo Vasco tem uma compleição igual à sua e está desaparecido. Não
sabemos dele, ninguém o viu desde ontem à noite. Sabemos também que a
asa-delta, o fato e o capacete desapareceram da exposição logo no seu início,
mas nada foi participado à polícia… – Senhor Inspetor, temos as confirmações: o controlo aéreo do Pico dá a
hora de aterragem às 9h13 e de levantamento rumo a Lisboa, às 11h50. O espaço
aéreo esteve sempre encerrado, entre essas horas, por causa do mau tempo. Foi
o último a pousar e o primeiro a levantar. O aluguer da viatura foi às 9h35 e
a devolução às 11h18. Não conseguimos ainda confirmar a chamada telefónica
que o Jorge diz ter feito para o Vasco, por erro informático do operador… |
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© DANIEL FALCÃO |
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