Autor

Jotelmar

 

Data

Julho de 1979

 

Secção

Enigma Policiário [40]

 

Competição

Torneio “Ubro Hmet"

1º Problema

 

Publicação

Passatempo [62]

 

 

UM CRIME NO AÇOUGUE

Jotelmar

 

Ocorreu pelos anos 20-21, num açougue clandestino, nas vésperas dos festejos ao Santo Percursor, no Porto.

Num velho barracão, transformado em açougue, a mulher de limpeza, que acumulava com outras três colegas a função de «magarefe», ao entrar no minúsculo escritório, deparou com seu patrão, o Sr. João Grainza, caído de borco sobre a minúscula mesa em que estava sentado, com uma profunda brecha no lado esquerdo das costas, mesmo sobre o coração, donde o sangue jorrava em borbotões. Aflitíssima, correu ao telefone, avisando para a Esquadra da área da triste ocorrência.

O Sub-Chefe, por sinal um detective de certa fama e renome, ali compareceu imediatamente. Auscultando a vítima, verificou que já nada havia a fazer: a punhalada, ou facada, fora fatal; Grainza teve morte instantânea!

Procedendo a um formal interrogatório, a serviçal, a «Ti» Ana do Rou informou que, tendo saído à rua, no que demorou uns dez a quinze minutos, a uma tasca defronte a «matar o bicho», alguém ali entrou, e, decerto à falsa fé, o apunhalou, porquanto o seu patrão, de costas como sempre estava para a entrada do escritório, não podia ver quem entrava, para tomar as suas precauções. Ela, como sempre fazia, por ordem da vítima, fechava a porta do barracão pelo lado de fora, quando saía à rua, mas nessa manhã, por fatalidade, deixara-a apenas encostada, porque se esquecera da chave em casa, pois que só ela e o patrão é que tinham chave. Perguntada se algum dos colegas era conhecedor já do crime, ela informou não ser possível tal, em virtude de o falecido ter proibido a entrada no escritório fosse a quem fosse, excepto ela, e de, devido à escuridão do corredor, não ser possível ver da parte de fora o que se passava no escritório.

Findo o interrogatório, a serviçal, debruçando-se sobre o recanto da mesa do lado direito, agarrou a vassoura e um balde, e, dirigindo-se ao outro lado do barracão, do lado direito, encheu-o de água e iniciou a limpeza, na rectaguarda do morto, porquanto, atendendo ao acanhadíssimo espaço do recinto, só poderia completar a limpeza retirando a mesa, o que não podia fazer, devido a estar ocupada pela vítima.

O detective lançava um minucioso olhar a toda a sua volta, não lhe escapando o mais pequeno pormenor; mentalmente calculou o comprimento do estreitíssimo corredor – uns 6 a 7 metros; bem como a largura, que nem um metro tinha de uma parede à outra; tão estreito, pois, que não era possível passarem duas pessoas a par, o mesmo fazendo do outro corredor do lado direito, defronte, de idêntico comprimento e largura, que dava para a WC., tão acanhado, que apenas cabia um único recipiente; depois olhou fixamente o rosto da servente. No seu varre-que-varre, os dois olhares cruzaram-se várias vezes, mas, em nenhuma delas, nem um músculo do rosto se contraiu, nem um pequeno rubor lhe acudiu às faces, nem o mais leve indício de culpabilidade ele lhe notou. Será mais um caso bicudo? – pensou o detective; – Vamos a ver! E solicitando à serviçal que telefonasse para a Esquadra, requisitando dois polícias e um carro para a remoção do cadáver para a Morgue, dirigiu-se para o local do «abate» lá em baixo ao fundo do barracão.

Dizendo a um dos magarefes que vinha escolher um anho «p’ró S. João», baixou-se várias vezes, simulando escolher a rês, mas lançando o seu «olhar de lince» «quer para todos os recantos do recinto do açougue, quer para os «matadores» que, ocupados na matança, nem para ele olharam. 10 minutos bastaram para a descoberta que intentara fazer.

Dizendo-lhes que pusessem de parte a rês que indicou que de tarde a mandaria buscar, abalou barracão fora. A um dos guardas que momentos antes tinham chegado, segredou-lhe: – Vá ao local do «abate» e convide o mais anafado dos três a acompanhá-lo. Creio ter descoberto o assassino!

 

PERGUNTA-SE: Em que se terá baseado o detective para descobrir o assassino? Relate todo o seu processo dedutivo.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO