Autor Data 19 de Setembro de 1960 Secção Na Pista do Culpado [60] Competição Problema nº 7 Publicação Ordem Nova |
O CASO FRAGON Lília Sol Em casa dos Saint-Angel um brilhante “Réveillon” assinalava aquela noite de
S. Silvestre. Apesar da enorme animação que reinava, o Inspector
Somesnil sentia-se aborrecido. Viera apenas para
acompanhar a esposa, muito íntima da dona da casa que não lhe perdoaria a
ausência. Afastado do bulício o Inspector
comentava, para si, a frivolidade e o snobismo que sempre presidem as tais
divertimentos. Não! Decididamente, não era naquele ambiente falso que o seu espírito
encontraria satisfação. – Boa noite, Inspector! Parece divertir-se imenso com a festa. – A voz
irónica soara nas suas costas. Reprimindo um gesto de
enfado, Somesnil voltou-se. Na sua frente um rapaz
alto e simpático sorria-lhe abertamente. A expressão aborrecida do Inspector deu lugar a um sorriso de satisfação. – Que prazer em vê-lo, meu
caro Verlaines! Quem me diria que o vinha
encontrar, eu que tanto desejava felicitá-lo pelo seu último sucesso no foro
do qual, nos jornais, ainda se não extinguiram os ecos. Aliás isso não me
surpreende, pois sempre lhe tenho augurado os maiores triunfos. – Obrigado, Inspector. Creia que me sinto elogiado com as suas
palavras. – A propósito, disseram-me
há dias ser você o testamenteiro de Sofia de Fragon
e que o testamento é mais uma daquelas originalidades que a tornaram
conhecida em França, com a milionária excêntrica. – É verdade! Para amostra
só lhe direi que os sobrinhos em primeiro grau são contemplados com umas
pequenas lembranças, ninharias, e um segundo sobrinho, que mal conhecia, pois
vive na Austrália desde miúdo, recebe quase a totalidade da sua imensa
fortuna. – É uma atitude bem dela
que que todos os anos mudava de criados, pois, dizia, aqueles não terem o
devido respeito aos amos quando envelhecem na casa. Só fez uma excepção: o mordomo. – Conheço o caso. Foi até
muito comentada essa sua excentricidade, tanto mais tratando-se de um antigo
presidiário. Há cinco anos que o tinha ao seu serviço e o sobrinho terá de
dar-lhe, anualmente, uma pensão. Parece que o homem lhe prestou durante a
guerra alguns favores e daí a sua atitude para com ele. O anúncio de que a ceia
estava servida veio cortar a amena cavaqueira, afastando-os temporariamente. O dr.
Roberto Verlains fora r3cebido no magnífico
palacete do parque Monceau pelo mordomo que o
conduziu até ao salão onde Miguel de Lussac, o
herdeiro, o aguardava. Este era um homem novo, de boa presença, que
amavelmente se dirigiu ao encontro do jovem advogado. Depois dos usuais
cumprimentos o sr. De Lussac
convidou com um gesto Roberto Verlaines a sentar-se
junto do fogão, enquanto dizia numa voz ligeiramente enrouquecida pela
constipação e em que o advogado notava uma pronúncia defeituosa dos «ss»: – É sempre agradável quando
se vem do frio sentarmo-nos confortavelmente instalados junto de um bom lume.
Na véspera da minha partida para França fazia um tal frio em Melburne que,
depois de terminados os assuntos relacionados com a partida, estive o resto
do dia no hotel. – Parece que tem razão em
queixar-se do frio – chalaceou Verlaines. – Ele
levou-o a travar relações com a “senhora gripe”, relações essas nada
agradáveis. – Foi já depois de chegar a
França que essa “senhora” me veio importunar – tornou De Lussac
no mesmo tom, enquanto o seu olhar se fixava numa fotografia que ornava o
salão. Verlaines que lhe seguira a direcção
do olhar, comentou: – Sua tia foi uma linda
mulher! – Muito bela, sim! – E,
mudando de tom: - Pobre tia. Apesar de mal a ter conhecido estimei-a sempre,
pois meus pais ensinaram-me a fazê-lo. Ao ter conhecimento de que fora
instituído seu herdeiro universal abençoei com veneração a sua memória, até
porque de momento encontrava-me em precária situação. Ah!... mas estou para aqui a devanear fazendo o meu amigo perder
um tempo que lhe deve ser precioso. – Neste momento o meu tempo
destina-se a este assunto. Mas vamos lá, então. Dizendo isto Verlaines abriu uma pasta e dela extraiu alguns
documentos, mas ao conferi-los, fez um gesto de contrariedade. – Dá-me licença que
telefone para o meu escritório? De Lussac
acompanhou-o até uma salinha e indicou-lhe o telefone. Verlaines
marcou um número. – É você, Samesnil? Recorda-se do caso Fragon? – ??? – Procure na minha
secretária um documento que lhe diz respeito e lá deixei esquecido, e venha
ao palacete onde o aguardo. Não se demore pois necessito de si. É urgente! Sem aguardar que quem o
atendia se refizesse da surpresa, desligou. Havia quase um mês que
abordara o assunto a Somesnil, mas sabia que o
inteligente Inspector compreenderia que algo de
anormal se passava em que era necessária a sua intervenção e não faltaria. Ainda não tinham decorrido
vinte minutos quando um criado introduziu o Inspector
no salão. Logo que este se afastou, Verlaines, apontando De Lussac,
ordenou: – Somesnil, prenda este homem! É um impostor! Aquele saltou e pretendeu
esgueirar-se em direcção à porta, mas o Inspector foi mais rápido e um “clic”
especial ouviu-se. – O homem estava algemado. – Agora enquanto eu olho por este vá o Inspector prender o mordomo. Obviamente, ele é o
verdadeiro culpado; este é apenas cúmplice. Momentos depois, o mordomo,
custodiado por por Somesnil,
entrava no salão. Então o Inspector voltou-se
interrogativamente para o advogado. Este explicou… PERGUNTA-SE: – Com que explicação
denunciou Verlaines o falso De Lussac?
Exponha o seu raciocínio. |
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© DANIEL FALCÃO |
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