Autor Data Setembro de 1948 Secção Competição Problema nº 3 Publicação Altura – nº 16 |
TRÊS ARMAS DISPARARAM… Sete de Espadas Dois vultos
recostavam-se no alpendre da característica «TAVERNA NEGRA», agora fortemente
iluminado. Ela, esplêndida de beleza e juventude, cabelos louros soltos ao
vento, sorria maliciosamente. Ele, de porte correcto, olhava-a num misto de
carinho e admiração. Diziam as más
línguas, que Divonne, a linda esposa do Embaixador da Sinésia, mantinha um
romance de amor com o jovem escritor Phillip Carr – cujos romances eram
disputados por multidões. Para lá do
alpendre, na fita negra da estrada, fortemente batida pelo vento e pelos
aguaceiros daquela extemporânea trovoada dos fins de Agosto, esperava-os o
potente e bem delineado «torpedo» do escritor. * *
* * * Minutos antes,
lançado como um bólide pela estrada que sai de Bordeaux e passa junto à «TAVERNA NEGRA»,
indiferente à intempérie, seguia um potente carro negro e nele, de sobrecenho
carregado, maxilas cerradas e mãos enclavinhadas no volante, o conhecido e
distinto capitão-tenente Gilbert Rouhen, a quem o país devia o estranho
invento do «submarino aquático-terrestre…». E Gilbert, pensava naquele
estranho telefonema… E diziam também as más línguas, que Gilbert, odiava, com
um ódio de morte, o romancista Phillip Carr… As altas esferas, por sua vez,
temiam o evidente contacto que existia entre Rouhen e essa sereia estonteante
e perturbadora, que era a esposa do Embaixador estrangeiro… * *
* * * Quando a noite
já há muito tinha caído e com ela a enervante tempestade de Verão, um carro
escuro seguia a pouca velocidade, pelo desvio da estrada que a poucas
centenas de metros cruza com a estrada de Bordeaux, para além da «TAVERNA
NEGRA»… Ao volante desse carro, preocupado com estranhos pensamentos, o
Embaixador de uma potência estrangeira – que é, às vezes, um espião
autorizado… * *
* * * A poucos
quilómetros da «TAVERNA NEGRA» e a caminho de Bordeaux, numa curva caprichosa
da estrada, Phillip nota com assombro que à sua frente está parado um carro,
ligeiramente atravessado na estrada, a meio da curva, e com os farolins
apagados. Solícito, Phillip pára o seu carro, sai e avança pela estrada para
prestar auxílio… De repente,
numa sucessão estranha e terrível, os relâmpagos aliam-se a fortes trovões;
os raios descem para a terra em zigue-zagues estonteantes, como se tudo
aquilo estivesse possuído de terrível magia e fosse uma horripilante visão do
inferno… Depois
silêncio… um silêncio que fazia calafrios, no intervalo duma tempestade de
verão – presságio de morte, cortado violentamente pelo escape aberto dum
carro que se afasta a toda a velocidade, a caminho de Bordeaux, farolins
apagados… Na fita negra
da estrada – agora iluminada pelos faróis de dois carros… - estendido de
bruços, o corpo do romancista Phillip Carr… * *
* * * À volta deste
complicado caso, todos os «repórteres do crime» especularam aos seus jornais,
com títulos a toda a largura das páginas. Um dizia: «Uma
bala perdida no interior dum carro?», referindo-se ao carro de Phillip, que
no lado direito do pára-brisas tinha um furo de bala, a 38cm da porta, cujo
vidro estava descido. Por mais que se procurasse no interior do carro, não
foram encontrados vestígios de penetração ou impacto. Um outro, em
três edições sucessivas, dizia: «Três armas, cujas linhas de fogo
interceptavam o mesmo alvo…»; «Fogo cruzado… numa curva!»; «Três conhecidas
personagens, fazem fogo «sincronizado» com a tempestade…!» Transcrevia as
declarações de todos eles, onde cada um afirmava que disparara a sua arma,
nada mais acrescentando quanto à direcção do tiro. Um terceiro,
talvez humorista, dizia: «Um carro com dois orifícios feitos por balas… mas
só uma aparece». Este repórter, seguindo a pista do carro fugitivo, veio a
fornecer valiosos elementos para o processo, porquanto, foi ele que descobriu
o carro de Rouhen e verificou um furo de bala no vidro da porta do lado
esquerdo, junto ao volante e no banco de trás, a penetração de uma bala,
junto ao suporte do braço do lado esquerdo, a qual se foi alojar do lado
oposto, junto à extremidade do outro suporte.
O quarto,
fazia a seguinte pergunta: «De onde partiu o tiro que vitimou Phillip Carr?»
Depois espraiava-se em comentários acompanhados por um grande «croquis» de
curva, com três carros, o corpo do romancista e as possíveis trajectórias das
balas – uma das quais também tinha atravessado o pára-brisas do carro do
Embaixador – assegurando com toda a convicção que sabia, como e para quem
tinham atirado cada um dos suspeitos – deixando antever nas entrelinhas, a
posição da arma assassina. * *
* * * Do relatório
de um perito, constava o seguinte: - A vítima foi
atingida por duas balas, uma das quais provocou morte imediata,
atravessando-lhe o cérebro e a outra raspou transversalmente o braço
esquerdo, passando entre este e o corpo a 5cm acima do cotovelo, fazendo dois
furos no casaco e um esgaçamento no tecido da camisa. * *
* * * Por mim,
resta-me dizer-lhes meus caros Colegas, que o nosso conhecido «detective
particular» Alexis Smith, de passagem por França, escrevia numa das suas
cartas: - «Com os dados que te envio – eu juro que os transcrevi todos –
poderás fazer uma solução absolutamente correcta e responderes com segurança
às seguintes perguntas» - que eu também transcrevo na íntegra: 1.ª –
RECONSTITUE A CENA DO CRIME. 2.ª –
INDICA-ME A TRAJECTÓRIA DAS BALAS E QUAL O OBJECTIVO DE CADA UM DOS QUE
DISPAROU. 3.ª –
FINALMENTE, INDICA-ME O CRIMINOSO. |
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© DANIEL FALCÃO |
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