Autor Data 13 de Maio de 2021 Secção Policiário [71] Competição Torneio do Centenário do Sete
de Espadas Prova nº 4 – B Publicação Sábado [889] |
O EXPRESSO DAS 22 HORAS Sete Vidas O
comboio partia às 22 horas e todos os passageiros corriam desordenadamente no
cais, bagagens suspensas nas mãos, numa azáfama barulhenta, procurando a sua
carruagem. Finalmente,
o chefe da estação deu o sinal de partida e todas aquelas carruagens
enfileiradas puseram-se em movimento, lentamente. Numa
das carruagens de luxo, abertas apenas a passageiros importantes, pois a
fechadura parecia abrir-se apenas com notas gordas, respirava-se um ambiente
snobe, muito bem, como é fácil imaginar. Num
dos compartimentos, a menina Liginha, transportando
ao pescoço delicado alguns milhares em joias, pavoneava-se, tentando
ressaltar a sua fortuna, que o pai, em frente, também ostentava, sob a forma
de um luxuoso fato. Fortuna falida, ao que constava, porque tudo fora
comprado em outros tempos, de vacas gordas, que há muito terminara. Mas, enfim,
a hipocrisia obrigava ao fingimento e agora fazia de cicerone a duas
horrendas criaturas, gordas, tão gordas como as suas contas bancárias. Ao
lado da menina Liginha, sentou-se um jovem
bem-parecido, falando baixinho ao seu ouvido, entre sorrisos. Subitamente,
no meio da noite escura, as luzes apagaram-se, semeando o pânico entre aquela
gente iluminada. Ouviram-se gritos histéricos, duraram toda aquela “noite” e
só acalmaram com o regresso da luz, para logo serem retomados ao verificarem
que o colar havia desaparecido, bem como o jovem bem-parecido! No
meio dos gritos, desmaios, correrias, ninguém reparou no regresso do jovem,
vindo da frente da carruagem, das casas de banho, onde afirmou ter ido, por
necessidade… A
algazarra só abrandou mesmo com a entrada em cena de um inspetor reformado,
que viajava de pé, no corredor, com bilhete de segunda, fugindo ao cobrador… Numa
investigação rápida, apurou: –
Às senhoras gordas, nada desapareceu e não viram nada; –
A Liginha sentiu umas mãos apertadas contra o
pescoço e depois uma dor, que mais tarde percebeu ter sido quando puxaram o
colar; –
O pai não deu por nada; –
O jovem afirmou que tinha ido à casa de banho assim que faltou a luz, por
necessidade inadiável, e que aproveitou para tentar inteirar-se da razão da
falta de luz; –
Todas as joias estavam seguras; –
O revisor disse que vinha do lado da frente da carruagem, pelo corredor,
sossegando as pessoas, avançando muito lentamente por causa de já estarem
perto da estação e as pessoas terem o corredor cheio de malas e objetos para
saírem, o que dificultou a sua chegada ao local onde ocorreu o suposto roubo.
Mesmo com a sua lanterna de bolso, tropeçou e quase caiu várias vezes… –
Numa revista rápida aos presentes, não se encontraram as joias. O
inspetor reformado já estava pronto para adicionar mais um insucesso à sua
longa carreira, quando o pai da Liginha interrompeu
os seus raciocínios: –
Espere, agora me lembro que vi um vulto quando o comboio passou por uma
lanterna qualquer lá de fora… e era desse jovem! Não tenho dúvidas! –
Como pode ter tanta certeza se ainda há minutos revelou que não viu nada? –
Estava excitado, não me lembrei, mas sim, vi-o debruçado sobre a minha filha!
Mas olhe, também pouco me importa, com o valor do seguro até podemos comprar mais
modernas! O
inspetor reformado refletiu um pouco, tentando mostrar competência, olhou
sucessivamente para o jovem todo janota, impecavelmente vestido; para a
menina Liginha, de rosto rosado, certamente do
desgosto pela perda; para as duas figuras bem volumosas das quase certas
financiadoras daquele estranho grupo, que pareciam estar a leste de tudo;
para o pai da moça, despreocupado ou fingindo… O
inspetor reformado sentiu-se quase um Poirot no Expresso do Oriente, com aqueles pares
de olhos postos em si, expectantes! Ia ter o seu momento… –
Minhas senhoras, meus senhores, não vale a pena continuar com este
fingimento. As coisas podem ficar resolvidas aqui mesmo e nem ser preciso ir
parar à polícia e aos tribunais, basta que as joias apareçam já, porque
facilmente sabemos quem foi, não é verdade? Vou esperar 30 segundos pela
confissão… Quem
se levantou e confessou? A
– As duas senhoras gordas; B
– O jovem; C
– A Liginha; D
– O pai. |
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© DANIEL FALCÃO |
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