Publicação: “Flama”

Data: 31 de Janeiro de 1958

 

 

II Torneio Nacional

de Problemística Policiária

 

Clube Literatura Policial

 

 

 

 

II TORNEIO NACIONAL DE PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA

 

PROBLEMA Nº 2

 

UM CASO SIMPLES

Autor: Sherlock Amador

 

Chamado à pressa por via telefónica para investigar certo caso, o representante da autoridade saiu para a rua. Embuçado no seu coçado sobretudo, gola levantada, mãos nos bolsos, com o chapéu descaído para a frente – a fim de se resguardar da aragem fria da manhã o Inspector Arsil penetrou – em passo estugado – na área que dava acesso à Vivenda Florbela, situada na Avenida do Aeroporto. Sem se dignar sequer a olhar para o que o rodeava, o apressado Inspector premiu o botão da campainha da porta onde – como qualquer ermitão – vivia o professor Idalécio.

Aberta a porta e conduzido ao gabinete do locatário, pelo indivíduo que lhe franqueou a entrada, o Inspector constatou, após exame superficial, que o professor falecera devido a um ferimento produzido por uma bala de pistola que o atingira, à queima-roupa, em pleno coração. A confirmá-lo, lá estavam, na camisa, os resíduos negros provocados pela deflagração da arma.

A vítima, que se encontrava ajoelhada e debruçada sobre uma pequena mesa, colocada debaixo de uma espécie de oratório, apresentava-se sob um aspecto verdadeiramente trágico. Pela aparência, Arsil atribuiu ao morto, uma idade entre os 65 e os 70 anos. De figura franzina, não devia possuir mais corpo que uma criança de catorze a quinze anos.

Do vestuário que envergava com óptima apresentação, sobressaía o lustro esmerado dos sapatos, quebrado apenas por algumas manchas de sangue. A camisa, que estava completamente à vista, continha, no local por onde penetrara a bala, uma mancha negra rodeada por um halo vermelho que, por sua vez, tingia o tampo da pequena mesa. Sobre esta, uma automática Browning, calibre 6,35, jazia sob a espalmada e inerte mão direita do morto.

Terminado todo este exame, Arsil inspeccionou detalhadamente as restantes dependências. Apenas no quarto de dormir a sua atenção foi despertada por umas manchas um tanto viscosas, existentes sobre o tapete, mas, que ao fim, pouco interesse ligou.

Como nada mais encontrasse que lhe chamasse a atenção, fez algumas perguntas ao sujeito que, desde o início das investigações, lhe fazia companhia.

Soube, assim, que o indivíduo em questão era um amigo íntimo do falecido, o qual ia ali várias vezes, para lhe atenuar o isolamento a que se devotara ultimamente o professor Idalécio. Por isso, naquela manhã, ao renovar essas visitas, deparou com aquela triste cena.

A princípio pensou chamar o médico, mas como verificasse que o seu amigo já estava morto, achou melhor telefonar para a polícia.

Interrogado em referência à arma, confirmou pertencer à vítima, pois que, mais de uma vez, vira o professor limpá-la e carregar o tambor com seis balas de aço. Segundo a sua opinião, a ideia do suicídio devia ter sido provocada pela nostalgia que o professor sentia, desde que ficara viúvo, havia alguns meses.

Aconchegando melhor o sobretudo, o Inspector Arsil caminhou para uma das janelas, e quedou-se contemplando o exterior.

Atrás de si, a voz grave do seu companheiro, interpelou-o:

– Parece-me que o senhor Inspector está demasiado obcecado com um caso tão simples…

Arsil virou-se lentamente e retorquiu:

– Ah… sim! Um caso simples! Demasiado simples para ser verdadeiro!

Porquê esta afirmação do Inspector?

 

© DANIEL FALCÃO