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 HÁ MUITO TEMPO | Zé

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BORDA D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2018

BORDA D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2019

 

 

HÁ MUITO TEMPO

Inspirando-me em José Cid, recordo que há muito, muito tempo, se juntavam, praticamente todas as noites, em rede, uns amigos. Nenhum de nós era já uma criança, mas certamente todos tínhamos brincado num baloiço e ao pião…

Nessa noitada, assinaram o ponto o Tempicos (amigo do peito do A. Raposo), o diácono Novena (um alter-ego malandreco do Nove), o grande Dic Roland e o Zé de Viseu que marcou presença e saiu de cena…

O tema era quase sempre o mesmo – as graças e desgraças da Nelinha, a deliciosamente estouvada “amiga” do Tempicos, mas que dava umas voltas com quem lhe apetecia e um tiro em quem a chateava demasiado. A brincadeira em rede prolongou-se por anos, com esta e outra heroína (a Nelinha foi, mais tarde, torpe e injustamente assassinada no Museu do Teatro e aí “nasceu” a Katinha, a filha da mãe Nelinha). O núcleo inicial e outros amigos que aderiram se encarregavam das aventuras mais loucas e divertidas….

Naquela noite, a Nelinha não se mostrava.

O Dic garantiu que ela já não andava pelos Alentejos.

O Novena estava furioso porque tinha marcado uma catequese de ambos antes de jantar e ela nem uma justificação para a ausência, o que lhe valeria uma dupla penitência na próxima confissão.

Tempicos jurava que não tivera novas nem mandados dela. E utilizou a jura mais forte e fiável que lhe conhecíamos – O Benfica não seja campeão se eu sei onde está a Nelinha!!!

Aí …. O pessoal ficou mesmo preocupado! O Dic concentrou-se, franziu o sobrolho e falou – ela e o Zé não dão sinais … há que investigar!

Tempicos accionou os seus contactos na P. J. Triangulações de telefones para aqui; triangulações para acolá e, passado pouco, a verdade surgiu – estavam juntos e um pouco longe do lugar onde os outros se encontravam – em casa do Tempicos, numa jantarada que trouxera Dic à capital.

Metem-se no carro e eles aí vão, a voar baixinho, até onde as informações os levavam – uma cabana, junto à praia, algures…

Aproximam-se muito cuidadosamente; ouvem falar lá dentro e (grande sorte) a porta não está fechada à chave…

Entram, sem barulho, para uma sala vazia mas há luz na outra divisão, de onde sai uma sonora gargalhada: – já ta papei; e tu estás no papo!

– É o Zé, diz Tempicos!

– Entremos antes que seja tarde, exige Novena…

Entram. E que vêem? O Zé e a Nelinha na cama … a jogar, calmamente, xadrez, no momento em que o Zé come a rainha da adversária e prepara o xeque-mate.

Estava no papo, pois …. Mas só para quem não conhecia a Nelinha! A pistola de que ela puxou imediatamente e colocou, devagar e olhos nos olhos do adversário, ao lado do tabuleiro, se calhar, ia mudar o destino do jogo…

E para acabar como comecei, plagiando José Cid, resta-me dizer que “o tempo que passou não volta, não” … “mas para nós ficou esta saudade” e esta singela (mas tão sofrida) Homenagem….

 

Fontes:

Blogue Repórter de Ocasião, 13 de Julho de 2025

Borda D’Água do Conto Curto, Edições Fora da Lei, Ano de 2020

 

© DANIEL FALCÃO