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DE JULHO | Ma(r)ta Hari UM DESEJO
IRRESISTÍVEL SOB O SOL DE AGOSTO | Inspetor Boavida (…) BORDA
D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2018 BORDA
D'ÁGUA DO CONTO CURTO - 2019 |
UM DESEJO IRRESISTÍVEL SOB O SOL DE
AGOSTO Inspetor Boavida Tó-Zé já está
um homenzinho. Está na idade da imortalidade e de todos os disparates, em que
não há impossíveis nem limites para os sonhos. Mas, felizmente, não é de
muitos excessos. A não ser nas suas relações com as miúdas. Este ano já lhe
contaram mais de dez namoradas, todas elas giras. E no início deste verão
soube-se que chegou a andar com três ao mesmo tempo, o maroto. Mas mal agosto
nasceu tudo acabou. Como sempre acontece, assim que chegou a data de partir
para férias, rompeu com todas. Nessa altura, quer ser livre como os
passarinhos que vê ao acordar através da janela do seu quarto, cantando só
para ele. Este ano, porém, um dos seus mais irresistíveis desejos levaram-no
a cometer um grande disparate. Ela deixava-o
louco. Há semanas que aparecia dengosa, invariavelmente à mesma hora, após o
almoço, sempre que ele se sentava naquele banco do jardim a gozar as delícias
do verão que há muito nascera. O sol, lá no alto, brilhava em quase todo o
seu esplendor. E ela lá vinha, sorrateiramente, insinuante, levemente,
esvoaçante. Aproximava-se do banco fronteiro e por lá ficava enquanto ele lia
tranquilamente um livro. Aos poucos, ele foi ficando cada vez mais
impaciente, com o desejo de se aproximar dela, sentar-se a seu lado e olhá-la
de perto, admirar a sua frágil figura, inalar o seu cheiro... Qual seria o
seu odor, o perfume do seu pequeno corpo?… Que calor ela irradiava, que
sensações seria capaz de transmitir?… O desejo de a
conhecer melhor era muito, mas o medo de a perder para sempre também. Aos
poucos foi ganhando coragem e um dia lá se levantou, discretamente, deixando
o livro no seu assento à espera de qualquer reação dela. Da primeira vez que
o fez, mal esboçou deslocar-se em sua direção, ela pressentiu a intenção de
se sentar a seu lado e partiu. Ele fez nos dias seguintes várias tentativas e
o resultado foi sempre o mesmo: A fuga! Adotou depois nova estratégia e manteve-se
sempre no seu lugar, de olhos postos nela, com o livro esquecido a seu lado
para que ela percebesse que já nada mais o interessava, se não ela mesmo. Mas
ela, nada! Era como se ele ali não estivesse, não existisse, não fizesse
parte do seu mundo. Ele não
convivia bem com aquela sua reação. Mas a verdade é que ela nunca deixou de
aparecer no jardim. Sempre à mesma hora, bela, ligeira, atrevida,
acomodando-se sempre no banco em frente ao seu, cerca de cinco metros mais
além. Quando ela se distraiu, ele pegou na arma e… disparou. Em cheio. Desta
vez ela não fugiu. Ali ficou, morta, caída sobre o banco de jardim, onde ele
nunca se chegou a sentar apesar da vontade quase indomável de o fazer, só
para estar um pouco junto dela. Poisou a espingarda de pressão de ar que o
acompanhava sempre que passava as férias grandes, ali na terra dos seus avós,
e apressou-se a pegar nela. Ela que o trazia há muito preso ao desejo de um
arrozinho malandrinho de… pomba branca! Fontes: Blogue Repórter de
Ocasião, 27 de Julho de 2025 Borda
D’Água do Conto Curto, Edições Fora da Lei, Ano de 2020 |
© DANIEL FALCÃO |
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