Publicação: “Público” Data: 3 de Junho de 2018 Campeonato Nacional 2018 Taça de Portugal 2018 Provas
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CAMPEONATO
NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL 2018 PROVA Nº 5 (PARTE I) NO MELHOR PANO CAI A NÓDOA? Autor: Ferdinand Search Há
muitos anos que o Américo fazia o seu trabalho com muita dedicação, mas
também com alguma sobranceria, de muitos episódios alegres e tristes que
presenciou e outros que ele mesmo causou. Passava
a vida a gabar-se, junto dos colegas, que a sua memória visual era de tal
forma desenvolvida que nada lhe escapava. Olhava para um tipo e tomava-lhe
logo a pinta, não o deixando mais em paz. O
Américo fazia o que gostava de fazer. O seu posto de trabalho era no
aeroporto, olhando com muita atenção todos os passageiros que iam
desembarcando, comparando-os com os “ficheiros” que o seu cérebro armazenara
durante décadas. – 100% de eficácia! – gostava de exibir,
sobretudo quando falava para os seus colegas mais novos, que achavam o máximo
que ele conseguisse, com certeira acuidade, tirar das filas um e dois ou três
passageiros e confrontá-los com anteriores entradas no país, onde fizeram das
suas, ao ponto de serem declarados indesejáveis, na melhor das hipóteses. Esta
característica revelava-se muito útil e o Américo era respeitado, sendo as
suas sugestões sempre aceites por todos, até porque davam sempre certo! Naquela
tarde, no entanto, as suas capacidades não pareciam estar em alta, quando
mandou sair de uma das filas um homem baixo mas forte, de tez morena, com
fortes traços de ser indiano. Américo reconheceu-o de imediato, por uns anos
antes ter causado desacatos numa recepção de
pessoas importantes, ali mesmo, em pleno aeroporto. Na
altura, recordava-se, o cidadão indiano foi mesmo detido e expulso do país,
com proibição de regresso. Mas agora ali estava, de regresso, contrariando a
sentença proferida… –
Mister, já sabe que não pode entrar em Portugal, não é verdade? – Como
diz? Não posso, porquê? Se tenho tudo em ordem… A
resposta em bom português não surpreendeu Américo, que já estava à espera
disso. – Sabe
bem porquê. Há uns anos foi detido aqui mesmo por ter confrontado um líder
político sobre um caso qualquer passado na Índia e foi proibido de regressar! – Ora
essa, não é verdade! É a primeira vez que venho a Portugal, nunca aqui
estive! Sou natural da Índia, mas estou há muitos anos em Moçambique, na
cidade da Beira, onde moro e venho pela primeira vez. Falo bem português
porque em Moçambique é o que se fala, sabia? Tenho passaporte, estou legal e
não percebo nada do que diz sobre eu ter já estado aqui, não é verdade! – Pois,
pois, faça o favor de vir para esta sala, para esclarecermos tudo… Mais de
uma hora depois, o imbróglio mantinha-se. O Américo reforçava que conhecia o
indivíduo e este reafirmava que não era verdade. Nomes para cá, nomes para
lá, passaporte para um lado, passaporte para outro e nada! Cada qual não saía
da sua, até que o chefe de Américo teve de intervir e depois de fazer os
testes possíveis, interrogatório mais aprofundado e busca nas bases de dados
informáticas, confirmação de reservas e outras coisas, acabou por pedir
desculpa ao passageiro, permitindo-lhe a entrada. Para
Américo, foi uma espécie de murro no estômago, ele que ostentava uma auréola
de infalível, foi ali mesmo desautorizado, para mais na presença de um grupo
de “maçaricos”, que olhavam para ele como olhariam um dinossauro! – Mas,
chefe, ele é mesmo… – Chega,
Américo! Temos de ser rigorosos, não podemos atropelar os direitos de quem
chega para nos visitar. Não há provas, temos de aceitar! – Mas… – Não há
mais mas nem meio mas, ficamos por aqui. Toca a trabalhar, meus senhores… O
Américo não ficou nada satisfeito, no fundo acabou por ser derrotado pela sua
intuição que nunca o abandonara, até então. Nem quis ficar a assistir à
entrada do cidadão indiano morador em Moçambique, que percorreu todo o
caminho em amena conversa com o chefe, que procurava assegurar-se que não
apresentaria qualquer queixa, pedindo-lhe desculpas pelo ocorrido. No parque
das viaturas de aluguer assistiu à assinatura dos papéis da viatura que
reservara a partir de Moçambique e logo depois à sua partida, rápida e
expedita, rumo a Sintra, onde se situava o hotel. – Uff! Ainda bem que não vai haver queixa… O Américo ia
arranjando uma boa trapalhada… Será que
o desabafo do chefe tem razão de ser? O Américo estava mesmo enganado?
Justifique todas as suas afirmações. |
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DANIEL FALCÃO |
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