Publicação: “Público” Data: 6 de Maio de 2018 Campeonato Nacional 2018 Taça de Portugal 2018 Provas
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CAMPEONATO
NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL 2018 PROVA Nº 4 (PARTE I) O PRECIOSO CAMAFEU NAPOLITANO Autor: Verbatim A festa
chegara ao fim. Só restavam os donos da casa, Isolina e Joaquim de Freitas,
dois casais visitantes, os Mendes e os Garcia, e
duas empregadas, Carla Gomes e Cátia Silva. Os Garcia,
prontos para sair, fizeram questão de dar mais uma olhadela pela rica
colecção de camafeus que os Freitas possuíam e que eles já há muito
conheciam. Debruçaram-se sobre a vitrina e, voltando-se para os donos da casa
que os aguardavam junto à porta do escritório, elogiaram de novo a beleza de
o Amor Eterno, um precioso camafeu napolitano que Joachim Murat terá
encomendado para a sua consorte Carolina Bonaparte. Já no corredor, o casal
Mendes esperava pelos quatro. Poucos
segundos depois estavam todos a despedir-se à saída do espaçoso apartamento.
Acorreu Carla para entregar à Sra. Professora Balbina um saco com a taça onde
viera o pudim. Sentia-se frio na escada. Adérito Mendes lembrou-se de que
deixara o cachecol lá dentro. Isolina foi de pronto buscá-lo ao escritório,
onde o encontrou bem dobrado no braço do sofá. Adérito comprimiu-o um pouco
mais, meteu-o no bolso largo do sobretudo e dirigiu-se com os outros para o
elevador. Três
dias depois, os casais Mendes e Garcia, assim como Carla Gomes e Cátia Silva,
estavam a depor, em separado, perante o Inspector Jerónimo Portela. – Não
sei de nada Sr. Inspector – declarou Joana Mendes. – Antes de chegar aqui,
não sabia sequer que os meus amigos Freitas se haviam queixado de um roubo
ocorrido no dia da festa. Ficaria admiradíssima se alguma das visitas
estivesse envolvida em tal coisa. Nem as empregadas! A Cátia já lá trabalha
há uns anos e a Carla foi recomendada pela Professora Balbina Garcia para
ajudar naquele dia. A seguir
depôs Carla Gomes: –
Estávamos na cozinha, a acabar as arrumações, com a Sra. Dra. Isolina, quando
o Sr. Conselheiro entrou a dizer que o Amor Eterno não estava no seu sítio.
Era uma pregadeira bem linda, com um fecho de ouro. Fui logo direita à
vitrina, pois nem queria acreditar que a tivessem roubado. Sim, é verdade,
para se verem os camafeus era preciso chegar perto da vitrina. Claro que fui
algumas vezes ao escritório, até porque os agasalhos foram lá guardados, mas
pronto, no lufa-lufa da festa o que eu queria era fazer o serviço como deve
ser. Só lá trabalhei naquele dia. Foi muito aborrecido termos de ser
revistadas no hall de entrada, antes de sair. Os
patrões disseram-nos que não podiam fazer de outro modo. Fiquei um bocado
chocada. Entreguei, sim senhor, à Sra. Professora Balbina, um saco com a
taça, já lavadinha, onde tinha vindo o pudim. Adérito
Mendes, Balbina e Gonçalo Garcia, tal como Joana Mendes, disseram
desconhecer, até àquele momento, a ocorrência de qualquer furto em casa dos
Freitas no dia da festa. O
Inspector informou Adérito Mendes de que dera nas vistas o facto de ele ter
metido o cachecol no bolso em vez de o enrolar á volta do pescoço. – Sr.
Inspector, eu julgava que ninguém tinha dado por isso. Como sujara o cachecol
evitei desdobrá-lo ali à frente das pessoas… Gonçalo
Garcia também foi convidado a falar do cachecol. –
Estranhei aquilo, mas esqueci. O Eng. Adérito Mendes é às vezes um bocado
distraído. Contudo, tendo havido um roubo, até parece que ele terá querido esconder
algum objecto, como uma jóia ou coisa parecida. Mas tal é impossível, a
probidade do Eng. Adérito Mendes está acima de qualquer suspeita. Ele, praticar um roubo? É algo sem pés nem cabeça. Cátia
Silva confirmou o anúncio da falta de o Amor Eterno no seu sítio, feito na
cozinha pelo Conselheiro Joaquim de Freitas, bem como a revista a que tanto
ela como Carla foram sujeitas. Respondendo a mais algumas perguntas declarou: – O Sr.
Conselheiro explicou-nos que a revista servia, até, para nos livrar de suspeitas.
No princípio, nem percebi o que estaria fora do seu sítio e fui atrás dos
três, para o escritório, porque os vi ir. A vitrina da colecção de camafeus
era fácil de abrir, a chave estava sempre na fechadura. Trabalho em casa da
Sra. Dra. Isolina e do Sr. Conselheiro há três anos, agora duas manhãs e três
tardes por semana. Não têm mais ninguém lá a servir. É uma casa muito boa e
de boas contas. Sei que possuem coisas de muito valor mas não as conheço bem.
Há, por exemplo, um quadro da sala com o qual tenho de ter o máximo cuidado e
há as jóias da senhora, guardadas no cofre, onde está um diadema que deve
valer uma fortuna. O casal
Freitas tinha seguros separados, cobrindo o risco de roubo, para as suas
peças mais valiosas, entre as quais se incluía o Amor Eterno. A entrada do
apartamento, num sexto piso de um prédio sem escadas externas de salvação,
estava equipada com um sistema anti-roubo. O
Inspector Jerónimo Portela, depois de analisar os dados atrás referidos,
concluiu dispor de indícios suficientes para determinar, com elevada
probabilidade, o modo como terá desaparecido o precioso camafeu napolitano
denominado Amor Eterno. Caro
leitor, diga de sua justiça. |
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©
DANIEL FALCÃO |
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