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UM CRIME NA NOITE DE NATAL Paulo Está um homem
totalmente repousado, pensando que no dia de Natal não acontece nada, quando,
logo pela manhã, lhe atiram com um crime para os braços. Reconheço que estava
de serviço, mas sempre pensei que sucedesse o mesmo que acontece quase todos
os anos, e refiro-me a todos aqueles em que fiz serviço no dia de Natal: nada.
Só que, desta vez, fui mesmo atirado para o centro de um crime. Demorei cerca
de quarenta minutos a chegar à casa onde ocorrera a morte. Ficava afastada do
centro da cidade, já em pleno meio rural. Normalmente, demoraria entre quinze
a vinte minutos para fazer o percurso, mas o piso da estrada não estava a
pedir velocidades elevadas nem a permitir uma condução nos limites do perigo.
Havia neve, muita neve, embora o negro do asfalto ficasse disponível na zona
onde passavam as rodas dos veículos automóveis. Para ser sincero, também não
tinha muita pressa para chegar ao destino. Dispensava bem um crime naquele
dia. Estacionei na
rua e dirigi-me para um portão que estava com uma das duas metades aberta,
mantendo-se a outra fechada. Da rua até à entrada da casa, já não seria
possível caminhar sem me furtar à neve que cobria os cerca de dez metros que
mediria o carreiro até à porta. Para evitar contaminar, com os meus resíduos,
o ambiente que cercava o crime, coloquei os pés sobre uma das séries de
pegadas ali existentes, que saiam de outro carro estacionado na estrada,
junto do meu, e que eram, quase de certeza, pertencentes a algum dos
elementos que já estava dentro da casa a fazer as perícias técnicas. A porta estava
fechada e eu tive que bater, com a esperança que alguém me ouvisse e viesse
abri-la. Tinha-me esquecido de premir o botão da campainha, que estava junto
do portão que dava acesso à rua, e só me restava a expectativa de que agora
me escutassem. Ouviram! A
porta foi aberta por uma mulher vestida com um fato-macaco branco, luvas e
óculos de proteção. O facto de já nos conhecermos evitou que eu tivesse que
mostrar a minha identificação. Olhei para o
relógio que tinha no pulso. Eram dez horas e cinquenta minutos, e, só após
esta verificação horária, os meus passos avançaram para o interior da casa,
deixando que os olhos começassem a verificar o cenário onde ocorrera o crime
que me estragara o dia de Natal. As paredes que
eu observava tinham todas a mesma cor, que eu não conseguia definir, estando
pintadas com um branco mais escuro do que o verdadeiro branco que cobria o
teto. Eram visíveis dois pequenos quadros: um, com uma paisagem de um casebre
junto a um rio, numa pintura de cores muito luminosas, e o outro, com uma
composição abstrata, em tons de azul, branco e amarelo. Transpus o
pequeno átrio e deparei-me com uma sala, onde, junto de uma lareira apagada,
se acumulavam alguns presentes, que obviamente ninguém abrira, e uma árvore
de Natal. Mais para o centro do aposento, existia uma mesa com uma toalha com
desenhos de árvores e sinos, sobre a qual estavam alguns recipientes com
doces, daqueles que normalmente associamos ao Natal, e ainda alguns frutos
secos. Claro que também havia um morto no chão do compartimento. Via dois
técnicos a espalharem pó pela sala, em busca de possíveis impressões digitais
que explicassem alguma coisa, o que não me parecia muito provável, e um
médico, o Renato Rebocho, com quem eu já me cruzara inúmeras vezes em
trabalho, que me informou, numa primeira análise, pouco fiável, conforme me
avisou, de que a vítima morrera entre a uma hora e as duas da manhã com uma
violenta pancada na cabeça. Claro que esse embate nem precisava de ser
descrito, pois era perfeitamente visível, no corpo caído, uma massa
ensanguentada que só poderia vir de um ferimento na zona parietal direita. – E o que lhe
terá provocado o ferimento? – Deve ter
sido este ferro, – apontou uma barra preta que estava caída no chão junto da
lareira – que serve para mexer nas brasas e nas cavacas. Após estas
palavras, o Renato fixou a olhar em mim. – E não me
vais perguntar quem é o assassino? – Claro que
não! Essa descoberta é o meu trabalho. O teu é mais simples. Fiz uma pausa,
e o Rebocho logo acrescentou. – Dá para
perceber, por ter usado uma arma improvisada, que o assassínio não estava
planeado. Se ele queria
guerra, iria tê-la. Mas,
entretanto, eu desviei os olhos para um técnico que se aproximava do atiçador
com um saco plástico numa das mãos. – Estão aqui
uns cabelos colados. – Disse, enquanto os metia no saco. A vítima
parecia ter sido apanhada de surpresa, uma vez que não havia sinais de luta
no cenário. Um combate entre duas pessoas, naquele local, levaria a que os
embrulhos com os presentes tivessem alguma desarrumação. O rumo dos
pensamentos desviou-se. – E tu,
Natália? Que me contas? – Perguntei para a pessoa que me abrira a porta.
Deparar com alguém com aquele nome, naquele dia e naquele local, só
contribuía para eu ficar mais incomodado. Bastava-me ter que falar com ela,
para sentir uma pequena irritação. – Há mais três
pessoas cá em casa. Fernanda, a mulher de Casimiro, a vítima, e os seus dois
filhos com sete e oito anos: dois rapazes. – Mais três,
não. Se calhar são mais quatro. O assassino? A Natália
franziu as sobrancelhas. – É por ser
Natal? Estás mal disposto? Achei melhor
não ligar àquela provocação e pedi-lhe mais informações. – Ainda não
falei com os filhos, mas devem ter passado a noite a dormir. A esposa diz que
ela e o marido se deitaram pouco depois da meia-noite, e ele ficou de,
passado algum tempo, vir colocar os presentes para os filhos os encontrarem
de manhã. Deve ter vindo, mas ela estava a dormir e não deu por nada. Hoje,
de manhã, quando acordou e não o viu, pensou que ele já se teria levantado,
antes dela, pelo que quando chegou à sala teve uma grande surpresa ao ver o
marido morto. – Veremos se
foi assim uma surpresa tão grande. Fiz uma pausa
para olhar em redor. Continuava a azáfama da recolha de vestígios. – E lá fora? É
melhor vermos bem o exterior antes de chegar a ambulância que transportará o
corpo, e que vai estragar todos os vestígios que lá possam estar. Dirigi-me para
a porta. Era uma sorte estar neve. Se tivesse existido um assassino a fugir
da casa, a neve, que parara de cair por volta das nove da noite, teria
deixado a memória da sua passagem. Entre a porta
da casa e a rua viam-se várias séries de pegadas que deveriam pertencer aos
elementos da polícia. Perto da porta, numa zona sem arbustos, à direita,
havia marcas no chão. Dois riscos paralelos, como se duas tábuas ali tivessem
estado pousadas, e umas estranhas pegadas: oito. Pareciam meias luas, lado a
lado, simetricamente, como imagem e objeto num espelho. – Vacas?
Cavalos? – Perguntou-me a Natália. Não me
apeteceu responder, embora estivesse a perceber o que se passara. Fiquei a
observar umas pegadas de bota que se dirigiam para parede, como se alguém
fosse por lá subir, e depois a virem no sentido oposto. – Natália, vai
saber junto da viúva a que horas é que a lareira ficou apagada, e se ela já
verificou se alguém mexeu nos presentes. Começava a
formar-se uma ideia na minha mente. Um filme do que se passara. Apenas
precisava das confirmações. Casimiro, a testemunha imprevista, estivera no
local errado, na hora incorreta, e isso custara-lhe a vida. Voltei para
dentro, onde a Natália já me aguardava. – Diz que a
lareira se apagou um pouco antes da meia-noite, e, – parou um instante, como
se esperasse que eu dissesse algo – parece que adivinhas: há dois embrulhos
que ela não conhecia; mas admite que tenham sido comprados pelo falecido. Não mostrei a
Natália o que eu estava a cogitar. Então a viúva achava que houvera presentes
ocultos. Que pensasse o que lhe aprouvesse, porque eu já não tinha dúvidas. – Vou-me
embora! Já resolvi este caso, mas agora vou tratar de arranjar quem pegue na
minha resolução. – E não vais
ouvir a viúva? Deixei-a sem
resposta e nem me despedi de mais ninguém. Tinha tempo de ouvir quem
quisesse. Depois! Agora tinha que, na sede, fazer um telefonema urgente.
Queria continuar a ter o meu dia de Natal. Tinha que resolver aquele assunto. – Estou, sim…
Obrigado! É do Ministério dos Negócios Estrangeiros?... Daqui, é da Polícia
Judiciária! Inspetor Felisberto Salmoura…. Sim, é verdade. Podem devolver a
chamada para a Polícia Judiciária e verificarem que sou eu mesmo.… Estou com
um problema, que julgo que também é vosso…. Sim, não estou enganado, também é
vosso. Sim… nós descobrimos crimes, e é por isso que vos estou a ligar….
Mataram um homem! O que é que têm a ver com isso? … Têm muito!... Deixem-me
falar, que eu já explico. Eu sei que é Natal, mas é Natal para todos. Para
mim, para si, para o criminoso, e só não é para a vítima, porque já morreu.
Por isso, se está aí de serviço, faça como eu: trabalhe, ou seja, ouça-me. O problema não
é o crime, é o criminoso!… Sim,… é convosco. Não, não foi ninguém do
ministério que foi o criminoso, nem o senhor ministro foi assassinado, nem o
senhor secretário de estado, nem ninguém daí. Por que é que eu vos estou a
ligar?... Deixe-me terminar. Eu sei quem é o criminoso, mas ele não é
português. Foi apanhado a colocar dois presentes e não gostou. Devo contactar
a embaixada do país do assassino? Claro que eu poderia fazê-lo, se pudesse,
…mas eu faria isso, se fosse fácil. O caso é complicado. Ultrapassa o que eu
posso fazer!... Finlândia, Noruega, Suécia e Rússia. Escolham! Para onde se
deve enviar o pedido de extradição? O assassino é o Pai Natal. Vem da
Lapónia”. Fontes: Blogue Local do Crime, 20 de Agosto de 2024 Secção O Desafio dos Enigmas [191-192], 10 de Dezembro e 20 de
Dezembro de 2024 |
© DANIEL FALCÃO |
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